• A situação extravasou os limites, e, por isso, não passa de platitudes Brasília oferecer soldados da Força Nacional e liberar algum dinheiro para presídios
O massacre ocorrrido no Complexo Penitenciário Anísio Jobim, em Manaus, no primeiro dia do ano, cometido num choque entre facções que há tempos atuam no sistema carcerário, extrapola a questão do número de chacinados. Desta vez, foram 56 — barbárie noticiada com o devido destaque pela imprensa mundial —, só menor que os 111 mortos de Carandiru, na cidade de São Paulo.
Com a diferença de que, na cadeia paulista, em 1992, os prisioneiros foram mortos na ação da Polícia Militar para conter a rebelião e retomar o presídio; em Manaus, trata-se do resultado de um componente da seriíssima crise de segurança pública por que passa o país: com a perda de controle do sistema penitenciário pelo Estado, cadeias passaram ao domínio de organizações, e às vezes se convertem em campo de batalhas sanguinárias entre bandos.
A torcida é para que, afinal, o Planalto, governadores e prefeitos de grandes cidades entendam que a criminalidade se organizou de tal forma que sua atuação não se circunscreve só a capitais. Ramificou-se no interior e exterior.
A prova disso é que, segundo os especialistas, o que acontece em Manaus tem ligações com o assassinato, em estilo hollywoodiano, de um traficante brasileiro, Jorge Raffaat Toumani, em Pedro Juan Caballero, Paraguai, na fronteira com Ponta Porã, Mato Grosso do Sul. O crime teria marcado o rompimento de uma aliança entre o Primeiro Comando da Capital (PCC), hegemônico em presídios paulistas e há anos em expansão por cadeias pelo país afora, e o fluminense Comando Vermelho (CV), surgido na década de 80 do convívio entre presos políticos e marginais comuns, na Ilha Grande.
O massacre foi cometido pelo grupo Família do Norte (FDN) contra presos ligados ao PCC. Por trás, estaria a organização do Rio de Janeiro. Num quadro desses, e que se consolida há bem mais de década, soam como platitudes as promessas costumeiras de Brasília de mobilizar soldados da Força Nacional e liberar algum dinheiro para a construção e reforma de presídios. Como sempre, o assunto sai do noticiário até voltar na próxima explosão de violência atrás das grades — previsível, a julgar pela guerra entre quadrilhas.
Enquanto isso, o Estado brasileiro continua em berço esplêndido e sem entender que os fronts do combate ao crime se multiplicaram, e ele só terá chances neste enfrentamento, em defesa da sociedade, se atuar de maneira coordenada nos diversos tipos de lutas: na montagem de um serviço de inteligência que colete e compartilhe informações dentro da Federação, com apoio das Forças Armadas; em ações de campo também integradas; na revisão de leis e códigos para que vá para a prisão só quem de fato cometeu crime grave, e entre eles não está o de porte de pequenas quantidades de drogas. Isso, para começar. Existe, enfim, um enorme trabalho a ser feito e que, por ter sido negligenciado, ganhou dimensões de emergência nacional.
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