O fim de 2016 indicava uma ruptura profunda em relação ao establishment político que predominara nas últimas décadas, caracterizado por um desenvolvimento integrado globalmente. Este modelo pareceu subitamente fadado ao infortúnio, diante da onda nacionalista que avançou pelo mundo, tendo como sinais mais conspícuos a opção dos britânicos pelo Brexit e a vitória do ultraconservador populista Donald Trump nas eleições americanas, mas também expressa no crescimento de forças políticas populistas em todo o mundo.
Na UE, as dificuldades econômicas, resquícios da crise financeira global de 2008, e os desafios políticos, agravados pelo fluxo intenso de refugiados em fuga do Oriente Médio e do Norte da África, deram voz a um descontentamento generalizado, que serviu de oxigênio à retórica nacionalista de grupos de extrema-direita. Estes defendem o fim da União Europeia, em nome de uma volta à grandeza da nação, ameaçada pela globalização.
Esse quadro mostra que, hoje, a grande disputa ideológica no campo político se dá menos entre esquerda e direita, e mais entre defensores de uma cooperação global, mediante regras comuns, e grupos em prol de um nacionalismo populista, por meio de isolamento e protecionismo. A defesa da globalização pelo presidente comunista chinês, Xi Jinping, no Fórum Econômico Mundial, é um eloquente exemplo desta nova realidade.
A série de atentados terroristas em território europeu, mediante ações espetaculares, e os efeitos da crise econômica, sobretudo no mercado de trabalho, deram combustível à desconfiança contra grupos étnicos muçulmanos e estrangeiros em geral, vistos como usurpadores de empregos dos europeus. O discurso contra imigrantes por líderes como a francesa Marine Le Pen, da Frente Nacional, ou a alemã Frauke Petry, da Alternativa para a Alemanha, estimularam um tipo de animosidade xenófoba que, não raro, culminou em agressões contra estrangeiros.
Mas, se por um lado, os eurocéticos ganharam espaço, por outro, o que parecia ser uma tendência incontornável começou a dar sinais de inversão, a favor da globalização. Exemplo disso são os recentes testes eleitorais em Holanda e Alemanha, e nas pesquisas em relação ao pleito francês, em que o candidato pró-UE Emmanuel Macron aparece bem posicionado para vencer.
A Europa vive um avanço econômico bem mais robusto do que se previa no fim de 2016. O crescimento é o maior em seis anos, o desemprego está no menor patamar em nove anos, graças a um forte avanço da demanda interna e o aumento real da renda, inclusive em países recém-saídos de crise, como Espanha, Portugal e Irlanda. Até mesmo a Grécia está prestes a fechar um acordo histórico com credores em troca de reformas.
Mas a guinada talvez tenha mais a ver com o choque de realidade sobre o cidadão comum da UE, produzido pelos exemplos do Brexit e da vitória de Trump, que empurraram britânicos e americanos para um futuro incerto.
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