- O Globo
Aconteceu o que se previa, muitos temiam e outros desejavam: a lista de Fachin misturou alhos com bugalhos e colocou todos os relacionados no mesmo patamar. Que país sairá dessa crise que, no seu ápice, envolve oito ministros do governo Temer, 24 senadores e 37 deputados federais, 12 governadores e cinco ex-presidentes do Brasil, José Sarney (PMDB), Fernando Collor (PTC), Fernando Henrique Cardoso (PSDB), Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e Dilma Rousseff (PT)? O próprio presidente estaria na lista, não fosse protegido pela imunidade temporária que o cargo lhe confere.
A avalanche de pedidos de inquéritos pela Procuradoria-Geral da República só demonstra que nossos esquemas partidários e eleitorais estão falidos, e precisam ser revisados sem que os responsáveis por essa tarefa sejam políticos eleitos pelo esquema que ora se desconstrói em praça pública.
A tese da Constituinte para rever todos os nossos parâmetros institucionais ganhará força necessariamente diante da constatação de que o esquema vigente levou ao descrédito a classe política, sem a qual não haverá democracia digna desse nome.
Pelas delações premiadas dos executivos da Odebrecht, corroborando outras denúncias que já foram feitas ao longo desses três anos da Operação Lava-Jato, há muitos anos nosso sistema políticoeleitoral sofre de uma disfunção que foi sendo progressivamente disseminada pelo organismo institucional, até se transformar em uma doença letal.
O ponto mais baixo dessa história se passou sem dúvida durante a era petista, em que a corrupção eleitoral transformou-se em uma política de Estado. A coincidência de a lista de Fachin ter sido divulgada quase ao mesmo tempo em que o depoimento do expresidente da Odebrecht foi prestado ao juiz Sérgio Moro realça a tese de que o PT não apenas adotou os métodos em vigor na política brasileira quando Lula chegou ao poder em 2003, como os aprofundou para dar a seu partido uma capacidade financeira que lhe permitisse ficar no poder por pelo menos 20 anos, como era o plano inicial de seu principal pensador, o ex-ministro José Dirceu — preso em decorrência dos dois grandes escândalos que foram desvendados nos últimos dez anos, o mensalão e o petrolão, um decorrente do outro.
Foi a mesma tática adotada para a criação do Bolsa Família, seu principal programa social. O PT pegou todos os programas sociais que vinham sendo implantados no país já anos antes, como a Bolsa Escola do então governador de Brasília Cristovam Buarque, e juntou todos em um só, como aliás já era proposto por diversos economistas dedicados ao assunto, como José Márcio Camargo, que foi o verdadeiro idealizador do conceito do programa Bolsa Família.
O problema imediato é saber como o Congresso vai reagir a esse tsunami, justamente na hora em que é preciso aprovar a ajuda aos estados e, sobretudo, a reforma da Previdência. Em seguida, é preciso observar as movimentações políticas para a eleição de 2018.
Provavelmente todos os parlamentares, governadores e prefeitos denunciados poderão se candidatar a algum cargo, no objetivo de manter o foro privilegiado. Os processos no Supremo Tribunal Federal (STF) são demorados e não terminarão a tempo de impedi-los que se candidatem. Talvez um ou outro político que já seja considerado réu possa ser julgado a tempo de ser impedido de se candidatar, mas serão poucos os atingidos.
Os processos da primeira instância, para aqueles que como Lula não têm foro privilegiado, andam mais rápido, e talvez pelo caminho apanhem um ou outro que já seja considerado réu, como o expresidente da Câmara Eduardo Cunha ou o próprio ex-presidente da República.
O fato é que será difícil a um denunciado pela Procuradoria-Geral da República pleitear uma eleição majoritária, principalmente governador ou presidente da República. Muita gente vai ter que refazer seus projetos de futuro, e o país terá que reencontrar um novo caminho político.
A ruptura institucional que se vê pode não trazer convulsões sociais, mas certamente exige decisões corajosas para encontrar o novo que vai surgir do velho que está morrendo em praça pública.
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