- O Estado de S. Paulo
Caberá ao Judiciário, o menos atingido dos Poderes, a missão de tentar debelar a infecção
A delação da Odebrecht atinge, ainda que com diferentes graus de letalidade, a cúpula do Executivo e do Judiciário, os principais partidos governistas e de oposição, governadores de vários Estados, alguns dos nomes mais cotados para disputar a Presidência da República em 2018, e todos os últimos presidentes vivos desde a redemocratização.
Tal quadro de septicemia, com todo o organismo político-institucional brasileiro corrompido, exige que o País seja colocado na UTI. Caberá ao Judiciário, o menos atingido dos Poderes, a missão de tentar debelar a infecção.
Diante da divulgação dos inquéritos que serão abertos no STF e em outras instâncias da Justiça, urge que os presidentes dos tribunais superiores anunciem um planejamento minucioso para se debruçar sobre as acusações que pesam sobre os políticos, sob pena de paralisia do governo e do Congresso e prejuízo incalculável ao processo de equilíbrio fiscal e retomada do crescimento econômico.
Só no primeiro dia da disparada do petardo da lista de inquéritos determinados pelo ministro Edson Fachin, já subiu no telhado a votação da renegociação da dívida dos Estados. Os relatores das duas principais reformas — da Previdência e trabalhista — estão na lista. O mesmo vale para os presidentes da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), e do Senado, Eunício Oliveira (PMDB-CE). Como seguir com o baile como se nada tivesse acontecido?
A ministra Cármen Lúcia, que falou sobre a Lava Jato em Washington no início da semana, precisa falar sobre a gravidade da missão que a Corte que preside terá pela frente.
Não dá para imaginar que 76 novos inquéritos só no Supremo vão ser julgados no ritmo em que a Lava Jato vem tramitando no tribunal. Não se pode chegar a uma eleição fundamental para o País, após o trauma do segundo impeachment em 24 anos, com alguns dos principais postulantes com inquéritos abertos sem que se saiba ao certo se serão ou não condenados.
A presidente deve se pautar pela celeridade e o senso de dever que vem demonstrando o relator desde que foi designado para a inglória missão de substituir Teori Zavascki. Fachin tem se desincumbido de suas tarefas de maneira firme, discreta e sem tergiversação. Que sua conduta seja o farol para os demais ministros.
O mesmo dever vale para o governo. O critério anunciado há pouco mais de um mês por Michel Temer para definir quem fica e quem sai parece vencido diante do rombo que a lista de Fachin abre na Esplanada. O titular da Casa Civil, Eliseu Padilha, é acusado de traficar propina para o PMDB, em parceria com o outro braço direito do presidente, Moreira Franco. Como os dois principais auxiliares palacianos terão autoridade para negociar as reformas implicados de forma tão contundente no maior escândalo de corrupção da história do País?
Até que sejam denunciados, no ritmo atual, o governo Temer terá acabado. A tentativa de Temer de blindar amigos não resistirá ao impacto devastador que a lista vai provocar numa sociedade que assiste às revelações entre atônita e revoltada.
A legitimidade deste governo e deste Congresso para realizar reformas que são absolutamente urgentes e necessárias fica comprometida.
Temer – que só não será ele próprio indiciado por prerrogativa constitucional, como fica claro no despacho de Fachin – tem de afastar imediatamente todos os investigados e nomear para seu lugar pessoas que não estejam na Lava Jato.
Quanto ao Congresso, a limpeza será mais difícil, pelo grau da infecção. E é também por isso que o STF tem de acelerar o passo: para remover da vida pública políticos que, deixados aos próprios desígnios, daqui para a frente só vão legislar para salvar a própria pele.
Nenhum comentário:
Postar um comentário