- O Estado de S. Paulo
Analistas emitem sinais de que vale tudo, menos populismo econômico
Mercados não votam. Mas têm voz ativa nas campanhas. Não dá para esquecer de 2002, ano em que eles tremeram diante do apocalipse-Lula, a ponto de empurrar o candidato para a edição da Carta aos Brasileiros, com compromissos de não ruptura, para dobrar as resistências dos setores empresariais e financeiros e, por tabela, do eleitorado tradicionalmente não afinado com o PT.
A um ano das eleições, ainda reina uma certa calmaria, mas as dúvidas com o desfecho da atual administração começam a se misturar e até a ceder lugar às indagações sobre o que será do Planalto depois de 2018. Os juros futuros chegaram a ensaiar uma alta no começo deste mês, refletindo os sinais de que o governo Temer havia abandonado a reforma da Previdência, mas logo em seguida retomaram a trajetória anterior.
Nesse sentido, a ampla oferta de candidatos, mais ou menos como ocorreu na disputa presidencial de 1989, está levando instituições financeiras, consultorias e agências de risco aos primeiros pitacos sobre o que virá no pós-Temer, com cada um deles: só para começar a conversa, Lula e Ciro, nem pensar; Bolsonaro, quem sabe?; Alckmin, sem sustos; Huck, a conferir; e Meirelles, sonho de consumo. Por enquanto, são só pitacos, mas com potencial de se transformar em “material de campanha” logo adiante – e de dar impulso a uma montanha-russa nas cotações, caso os resultados das pesquisas eleitorais não combinem com as escolhas dos investidores. Aqui, pelo visto, não vale o tal descolamento entre a economia e a política, ao qual se recorre quando se buscam explicações internas sobre a resistência dos mercados aos trancos da Lava Jato.
É fato que, no momento, observa-se uma certa convergência nos cenários projetados para a economia em 2018. Pelo menos em termos dos grandes indicadores: crescimento do PIB pouco acima de 2,5%, alívio no desemprego, inflação próxima de 4%, juro básico estacionado em 7% e contas públicas sob controle precário, dependendo do destino das medidas de ajuste fiscal encaminhadas ao Congresso. Nada parecido com o paraíso que pinta a propaganda do governo, mas também nenhum desastre. Há, porém, ao mesmo tempo, grandes dúvidas em relação à possibilidade de aprovação ainda em 2018 da reforma enxuta da Previdência – ou enxutíssima, vá lá que seja –, e à agenda econômica que irá prevalecer de 2019 em diante. Duas coisas que, de uma forma ou de outra, andam juntas e ocupam o centro das preocupações dos mercados.
Está aberta a temporada de especulações sobre os candidatos a presidente, seus gurus na economia e seus programas de governo. Especialmente porque a cada semana entram em cena novos personagens, cujas ideias e equipes ainda são uma incógnita, e alguns deles com pontuação não desprezível nas pesquisas eleitorais – descontando-se as distorções inerentes à antecipação do calendário. Os comentários públicos e “em off” a respeito da candidatura do deputado Jair Bolsonaro – estrela da direita, com cerca de 15% das preferências nas pesquisas recentes –, dão a medida de como as eleições serão utilizadas para influenciar o vaivém dos mercados. O pesquisador do Ipea Adolfo Sachsida, apontado como o conselheiro de Bolsonaro, tem a missão de desfazer a imagem de intervencionista do deputado e moldar a do liberal, fiel à economia de mercado e a todos os seus preceitos, como a independência do Banco Central e o controle das finanças públicas.
Enquanto o centro não se acomoda em torno de uma candidatura “viável”, analistas do mercado financeiro exibem sua face ultrapragmática, ao admitir que os investidores podem até “engolir” Bolsonaro, desde que ele não se alinhe ao chamado populismo econômico. Não bastasse a incerteza sobre a conversão real de Bolsonaro ao liberalismo, restam outras questões, que pelo visto não estão no radar dos mercados, para definir sua posição em relação às candidaturas. Não há sensibilidade, por exemplo, a manifestações de Bolsonaro sobre direitos humanos e sobre os temas sociais mais quentes do momento. E mesmo sobre intervenção, não na economia, mas a militar. É só o começo, mas tudo indica que, antes mesmo de se completar a configuração da disputa presidencial, os mercados já começam a elevar a voz na campanha.
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