Estudos comprovam que taxas de homicídio teriam subido mais não fosse o controle das armas de fogo
Desde que foi regulamentado, em julho de 2004, o Estatuto do Desarmamento tem estado sob fogo cerrado da bancada da bala. Em pouco mais de uma década de vigência, foi sendo desfigurado. Agora, prepara- se no Congresso Nacional o que pode ser o golpe de misericórdia contra a legislação de controle de armas.
A Comissão de Constituição e Justiça recebeu do senador Sérgio Petecão ( PSD- AC) parecer favorável ao projeto do senador Wilder Morais ( PPGO), batizado de Estatuto do Armamento, que facilita a comercialização, a posse e o porte de armas de fogo e munição para maiores de 18 anos no país. Basta comprovar que o interessado está apto psicologicamente, tem bons antecedentes e capacidade técnica para manuseá- las.
O autor do projeto que praticamente aniquila o Estatuto do Desarmamento diz que pretende resgatar o direito de escolha do cidadão e argumenta que, em referendo realizado em 2005, 63% da população votaram contra a proibição do comércio de armas de fogo e munição.
De modo geral, essas propostas se alimentam do pânico da população, num momento em que o país vive uma grave crise de segurança. O objetivo é passar a ideia de que cidadãos armados estarão mais seguros. Ledo engano.
Mais de cem policiais militares já foram assassinados este ano no Rio de Janeiro. As armas não os protegeram — e eles são treinados para usá- las. Porque segurança não depende só da arma, mas das circunstâncias, como número de bandidos, tipo de armamento etc.
Essa visão deturpada só interessa à bancada da bala e à indústria de armas. Convém lembrar que, segundo o “Mapa da Violência”, o Brasil ocupava em 2012 o quarto lugar entre os maiores exportadores de armas de fogo, ficando atrás apenas de Estados Unidos, Itália e Alemanha.
Fora dessa lógica de mercado, é um contrassenso achar que se combate a violência com mais armas, ainda que elas estejam nas mãos de cidadãos de bem. Foi uma arma legalizada que tirou a vida de dois estudantes e feriu outros quatro no Colégio Goyases, em Goiânia, no mês passado. O adolescente que disparou contra os colegas, inspirado nos massacres de Columbine ( Estados Unidos) e Realengo, usou a pistola da mãe, que é PM. Depois da tragédia, de pouco vale discutir se estava ou não bem guardada. A questão é que foi parar nas mãos do jovem.
É certo que o Estatuto não resolve sozinho o problema da violência, mas é um forte aliado. Dizer que é inócuo porque durante a sua vigência as taxas de homicídio aumentaram é faltar com a verdade. De fato elas cresceram, por motivos diversos, como polícias despreparadas, falta de integração entre forças de segurança, fronteiras vulneráveis, crise financeira. Mas estudos comprovam que teriam subido mais não fosse o controle de armas. Segundo o “Mapa da violência”, de 2004 a 2014, foram poupadas 133.987 vidas graças a esse freio no ritmo de expansão.
Afrouxar o controle sobre as armas reforçará a saúde financeira dos fabricantes, mas, com certeza, deixará a sociedade mais doente em meio a essa epidemia de violência que atinge o país.
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