segunda-feira, 5 de março de 2018

Angela Bittencourt: Lava-Jato força Temer a decidir sobre reeleição

- Valor Econômico

Para BNP Paribas Asset, Selic menor vai puxar o consumo

A inclusão do presidente Michel Temer - pelo ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Edson Fachin - no inquérito da Lava-Jato que investiga os ministros Eliseu Padilha (Casa Civil) e Moreira Franco (Secretaria Geral da Presidência) sobre suposto recebimento de propina da empreiteira Odebrecht em troca de facilidades na Secretaria de Aviação Civil, deu uma urgência inesperada à decisão do presidente se concorrerá ou não à reeleição. Com o encerramento do mandato em 31 de dezembro, Temer perde o foro privilegiado - o direito de ser julgado pelo STF e não por outra instância judicial - tornando-se mais vulnerável.

Se decidir disputar as eleições, em outubro, Temer poderá enfrentar seu ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, que cobiça o cargo majoritário. Ambos carecem de votos, mas Meirelles comanda o ministério mais poderoso da Esplanada e Temer tem autoridade. Essas competências deverão ser alinhadas se um ou outro seguir a trilha em direção ao Palácio do Planalto ou, ainda, seguirem juntos, na hipótese de um se contentar em ser vice do outro.

Ambos estarão melhor no retrato se o governo elevar sua aposta no crescimento e na oferta de emprego para livrar um batalhão de brasileiros de incertezas quanto ao futuro. O Índice de Positividade Brasil (IP Brasil), elaborado pela consultoria .Map a partir da análise de postagens nas redes sociais e artigos de formadores de opinião, mostra que o presidente acertou ao determinar a intervenção federal no Rio de Janeiro. A intervenção obteve um índice de positividade de 56% em uma escala de 0 a 100. Contudo, o índice de aprovação de Michel Temer permaneceu em 2%.

O monitoramento da.Map mostra também que, em fevereiro, o tema segurança dominou os debates nas redes, enquanto as manifestações sobre as condições da economia minguaram sem alterar, porém, o foco que, há meses, é o emprego. O Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged) lançou uma luz no fim do túnel na sexta-feira. Em janeiro foram criadas 77.822 vagas de trabalho com carteira. Setores que sazonalmente criam vagas em janeiro lá estavam. A construção civil mostrou, porém, um comportamento fora do padrão ao abrir quase 15 mil vagas. Esse dado é significativo para o setor que demitiu todos os meses, entre outubro de 2014 e junho de 2017 e retomou lentamente as contratações no segundo semestre.

Reação consistente do mercado de trabalho tende a fortalecer os índices de confiança - de empresários e consumidores - que já exibem resultados positivos. O Índice de Confiança Empresarial da Fundação Getulio Vargas (FGV), no gráfico, é um exemplo da mudança de humor dos empregados quanto às perspectivas para a economia.

"O consumo das famílias cresceu apenas 0,1% no quarto trimestre, apesar da expansão da massa salarial real em 1,2% e da aceleração na concessão de crédito real em 1,5% (todos com ajuste sazonal). Assim, o fraco desempenho do consumo no final do ano passado não foi reflexo de deterioração no mercado de trabalho nem de ausência de crédito, mas um aumento temporário da taxa de poupança", avalia Eduardo Yuki, economista-chefe da BNP Paribas Asset Management, em entrevista à coluna.

Yuki afirma que os indicadores de janeiro - como o Caged - sinalizam que o poder de compra das famílias continua em expansão no início do ano. Além disso, a concessão de crédito para pessoa física subiu 3,5% em relação a dezembro, com ajuste sazonal. A queda da taxa Selic, de 14,25% para 6,75% tem um poderoso efeito na economia. O economista explica que essa redução é transmitida à atividade pelo canal do crédito - com o corte do juro e, consequentemente, a possibilidade de renegociação de dívida passada por outra de custo menor. Esse processo reduzirá o pagamento de juros em cerca de R$ 80 bilhões. Parte desse montante impactou positivamente a situação financeira das famílias no ano passado, diz Yuki.

À coluna, o economista da BNP Paribas Asset demonstrou absoluta convicção na eficácia da política monetária em curso. "O consumo deve ser estimulado pelo pagamento de dívidas e também pela oferta de crédito novo. Toda vez que a Selic cai tem início um período de contratação de crédito. O emprego será outra alavanca para o consumo. Notamos que a disposição do empresário contratar um trabalhador está [historicamente] vinculada à margem operacional das empresas, à lucratividade, que vem crescendo."

Eduardo Yuki destaca os efeitos da política monetária, mas insiste que a recuperação econômica está baseada na perspectiva de ajuste fiscal nos próximos anos. "Juros estruturais em níveis baixos dependem da perspectiva de estabilização da dívida pública no início da próxima década e, consequentemente, da aprovação de medidas fiscais no próximo ano. A reforma da Previdência é parte essencial para ajustar as contas públicas", diz o economista, para quem não existe ajuste fiscal sem reforma da Previdência. "Atualmente, a taxa de dependência está em 12% (para cada 100 pessoas em idade ativa, há 12 acima de 65 anos) e o déficit da Previdência já atingiu 4% do PIB em 2017. Em 2050, nossa taxa de dependência atingirá 36%. O atual sistema não é consistente para o longo prazo."

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