- Valor Econômico
Maioria das propostas não traz estímulo suficiente para reativar a economia logo e pode criar distorções graves
Os números do PIB para o primeiro trimestre serão divulgados hoje. Segundo pesquisa do Valor publicada em 27 de maio, a mediana das estimativas do desempenho do PIB indica uma contração de 0,2% ante o quarto trimestre, com a previsão mais otimista sendo de estabilidade e a mais negativa de um recuo de 1%. Esse provável resultado já foi razoavelmente antecipado pelos participantes de mercado, com a mediana das expectativas de crescimento do PIB de 2019 diminuindo de 2,5% na média de dezembro para 1,2% em 24 de maio (Relatório de Mercado do Banco Central).
A divulgação das contas trimestrais tende a reacender as discussões sobre a necessidade de estímulos do governo para evitar uma deterioração adicional da atividade nos próximos trimestres. As propostas existentes são similares àquelas usualmente discutidas em momentos como o atual. No que se refere à política monetária e ao crédito, as sugestões mais frequentes tratam do corte da taxa Selic, da redução das alíquotas dos compulsórios bancários e da diminuição do IOF nos empréstimos. Essas ações dificilmente terão impacto significativo no curto prazo, pois a incerteza na economia permanece alta, os juros reais já estão em um patamar historicamente baixo e a liquidez no sistema financeiro não tem sido uma restrição para o aumento da oferta de crédito.
Há propostas que visam alavancar os investimentos privados, em particular em infraestrutura e nos serviços públicos. Essas medidas incluem a concessão de novos estímulos para a implementação de projetos de infraestrutura, a aprovação do marco regulatório para o setor de saneamento e a aceleração dos processos de privatização e de venda de concessões de serviços públicos. Essas decisões precisam ser perseguidas incessantemente, mas é improvável que tenham efeito na atividade no curto prazo, pois muitas delas exigem mudanças na legislação e têm prazo de implementação demorado. Apesar do empenho da equipe econômica, o sucesso dessa agenda demandaria um apoio menos volúvel do que o observado até agora por parte do presidente Bolsonaro.
Uma outra ação que tem sido discutida é a da liberação de recursos dos fundos constitucionais para investimentos dos governos estaduais. Essa alternativa dificilmente teria sucesso no estímulo à economia. A história ensina que planos dessa natureza não aumentaram os investimentos e a atividade no passado, funcionando apenas como forma de substituir verbas orçamentárias originalmente destinadas aos investimentos para o custeio de gastos correntes adicionais.
Outros projetos tratam do direcionamento de parte dos recursos associados a mecanismos de poupança forçada. Essas medidas incluem a liberação de recursos do PIS-Pasep e a destinação de maior parcela do FGTS para a construção civil. A antecipação do pagamento do PIS-Pasep seria uma decisão positiva para a economia. Sobre o FGTS, defendo sua extinção gradual, com o retorno dos saldos das contas para os correntistas e a incorporação das atuais contribuições diretamente aos salários dos trabalhadores. Discordo da destinação de ativos do fundo para setores específicos ou para a concessão de subsídios a segmentos privilegiados da sociedade. Além de os seus resultados não terem trazido benefícios visíveis para a redução da pobreza nem para o aumento da produtividade, essa não é a função do FGTS.
Outro conjunto de propostas trata de questões microeconômicas, como medidas de estímulo ao aumento da competição bancária, de aprimoramento da legislação de recuperação judicial e de melhoria das condições de negócios no país. Apesar de muito relevantes, esses projetos possuem prazo de maturação mais longo e é pouco provável que tenham repercussão imediata na atividade.
Há também sugestões irrealistas, como a concessão de estímulos fiscais e de subsídios e o aumento dos investimentos públicos com recursos da venda de reservas internacionais. A existência de um déficit primário significativo desde 2014, que tende a perdurar até 2022, a esperada aprovação de uma reforma da Previdência Social, que não impedirá a alta dos gastos públicos, e a necessidade de flexibilização da regra dos gastos, mesmo que temporária, tornam inadmissível a adoção de uma política fiscal ainda mais expansionista. Deixando de lado a enorme fragilidade desses planos, o setor público não tem a agilidade necessária para promover investimentos públicos de forma acelerada o suficiente para estimular a economia. Além disso, o Banco Central não consegue vender rapidamente um volume expressivo de dólares sem gerar enormes distorções no mercado de câmbio.
A maioria das propostas listadas aqui não estimularia significativamente a atividade no curto prazo e poderia gerar distorções graves na economia. A principal contribuição que o Executivo pode dar para evitar que a retomada seja ainda mais claudicante é a de se empenhar para aprovar reformas estruturais abrangentes e sinalizar de forma transparente os principais detalhes de sua agenda de governo. Vários desses projetos exigem uma atuação coordenada com o Legislativo, o que demanda um processo mais longo de convencimento da sociedade e de seus representantes. Outras, porém, precisam apenas da vontade e determinação política do presidente Bolsonaro para sua formulação e implementação.
Os últimos cinco meses confirmam que essa empreitada não será simples e muito menos livre de atropelos. O que se observou nesse período foi uma total falta de coordenação do governo, atritos desnecessários com o Congresso, propostas com detalhamento insuficiente e pouca transparência das decisões. Não é a forma adequada de promover as mudanças que o país tanto precisa para alcançar um crescimento menos frágil.
*Nilson Teixeira, Ph.D. em economia pela Universidade da Pensilvânia
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