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Uma visão estreita do cargo
Em 1992, a poucos meses da abertura do processo de impeachment contra o presidente Fernando Collor, suspeito de corrupção, o deputado Benito Gama (BA), presidente da Comissão Parlamentar de Inquérito que apurava o caso, foi chamado para uma audiência com o ministro Célio Borja, da Justiça.
Ex-ministro do Supremo Tribunal Federal, no cargo desde abril, Borja fora deputado federal eleito pelo Rio e presidente da Câmara por duas vezes. Era respeitado como político, jurista e professor da Universidade do Estado do Rio. Apoiara o golpe militar de 64. O que ele queria conversar àquela altura com Benito?
Desconfiado, o deputado teve o cuidado de avisar antes aos seus principais pares da Comissão que iria ao encontro de Borja. E foi preparado para ouvir dele algum pedido que pudesse favorecer Collor. Borja o recebeu sozinho. A audiência durou o suficiente para Borja informar ao deputado mal ele se sentou à sua frente:
– Chamei-o para dizer que sou o ministro da Justiça do Brasil. Não sou advogado do presidente.
E mais não disse. Levantou-se, apertou a mão de Benito e acompanhou-o até a porta de saída.
Se restava ainda alguma dúvida sobre o que faz o ex-juiz Sérgio Moro no governo Bolsonaro, ela evaporou-se, ontem, quando o ministro escreveu em sua conta no Twitter que só receberia em audiência o presidente da Ordem dos Advogados do Brasil, Felipe Santa Cruz, quando ele mudasse de postura.
As palavras exatas de Moro: “Tenho grande respeito pela OAB, por sua história, e pela advocacia. Reclama o Presidente da OAB que não é recebido no Ministério da Justiça. Terei prazer em recebê-lo tão logo abandone a postura de militante político-partidário e as ofensas ao presidente da República e a seus eleitores”.
A mensagem de Moro foi postada quando ele soube que Santa Cruz declarara que os apoiadores de Bolsonaro sofrem de “desvio de caráter”. Declaração infeliz, injusta e absurda. Inexistem estudos de qualquer natureza que tenham detectado que os apoiadores de Bolsonaro sofrem de “desvio de caráter”.
O que ele disse não passa de uma mera opinião, fruto da mágoa que guarda desde que Bolsonaro afirmou, em junho último, que o pai de Santa Cruz foi assassinado por integrantes da Ação Popular, grupo de esquerda que se opôs à ditadura de 64. O pai de Santa Cruz foi preso por militares e desapareceu desde então.
Fosse de fato ministro da Justiça do Brasil como foram muitos que o antecederam, Moro não teria atacado o presidente da OAB como o fez. Quando nada em respeito à justificada mágoa que ele tem de Bolsonaro. Ou porque como ministro da Justiça do Brasil, ele deveria saber lidar com posições contrárias às suas.
Nos estertores da ditadura de 64, o ministro Petrônio Portela, da Justiça, saiu à campo para conversar com políticos de todos os matizes ideológicos interessado em construir uma ponte para o futuro. Antes de Borja, Jarbas Passarinho foi um ministro que dialogava com todos para pavimentar o caminho de Collor.
Moro comporta-se como advogado de Bolsonaro e do seu governo desde quando tomou posse. Logo de início, fez questão de “perdoar” seu colega Onyx Lorenzoni por uso de caixa 2 em campanhas. A Bolsonaro, já forneceu informações sigilosas da Polícia Federal, o que não é permitido. Bajula-o a não mais poder.
A ex-juíza Selma Arruda, que se elegeu senadora pelo PSL do Mato Grosso, é unha e carne com Bolsonaro. Conhecida como “Moro de saia” pelo rigor com que tratava os políticos, acabou cassada esta semana por uso de caixa 2. Não sem que antes Moro fosse advogar por ela junto a cada ministro do Tribunal Superior Eleitoral.
Bolsonaro admira Moro cada vez mais. Nem por isso confia nele. Teme estar criando uma cobra que poderá picá-lo adiante.
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