Desavenças menores e questões pessoais têm de ser deixadas de lado neste momento
As ameaças à democracia que partem do bolsonarismo levam à união de forças políticas pontualmente adversárias, mas que compartilham a defesa das liberdades e dos demais direitos republicanos que constam da Constituição de 1988, resultado de uma longa travessia de 24 anos por uma ditadura militar.
Os manifestos em prol da democracia que começaram a circular no último fim de semana expressam este movimento de união de forças que divergem, mas entendem a importância da preservação das liberdades, da mesma forma como aconteceu na ditadura militar, quando manifestos passaram a circular a partir do momento em que os controles sobre a imprensa foram relaxados. Não eram simples textos de propaganda política, mas documentos que marcavam pontos de união entre grupos contrários ao arbítrio, da direita liberal à esquerda. Acontece o mesmo agora.
Mas alguns segmentos à esquerda ainda resistem a esta obviedade histórica, talvez muito condicionados pelos objetivos varejistas da luta ideológica, ou nem isso, que não deveriam impedir o entendimento amplo na defesa da democracia. Sem ela, a via eleitoral para a rotatividade das diversas forças políticas no poder fica obstruída. É lamentável que a miopia da luta político-partidária e vetos pessoais prejudiquem a construção de uma frente democrática.
Parte do PT ainda tem resquícios de uma resistência histórica a alianças, talvez pela característica de alguns de seus grupos de buscarem a hegemonia na política. Enquanto o partido esteve no Planalto, a força de atração gravitacional do poder fez com que a legenda contasse com alguns partidos de esquerda em sua órbita. Além daquela direita que criticavam. Concluído aquele ciclo de 13 anos em Brasília, composições foram desfeitas. É natural.
A redemocratização levou à fragmentação da frente pela democracia, que subsistiu da década de 70 ao início dos anos 1980. Restabelecidas franquias para a formação de partidos, as lideranças do PT, puxadas por Lula, fizeram a opção por uma legenda de perfil classista, enquanto outro polo da esquerda naquela aliança, social-democrata, simbolizado por Fernando Henrique Cardoso, abriu-se a entendimentos. Chegou ao poder em 1994 e governou com a centro direita. O PT se curvou à realidade, teve de fazer o mesmo para assumir o Planalto e lá se manter, mas uma parcela da legenda foi abduzida pelas práticas heterodoxas de aliados políticos fisiológicos e clientelistas.
Políticos de esquerda passaram por longa experiência de acordos políticos, até com quem execravam no passado, para conquistar o poder e se manter nele. Negociar apoios não é pecado. Ele é cometido quando se negocia o acesso criminoso ao dinheiro do contribuinte. Mas políticos experientes que passaram por essas práticas não deveriam recusar-se a defender as liberdades por não gostarem da companhia nas alianças.
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