quarta-feira, 1 de julho de 2020

Bernardo Mello Franco - Os entregadores pedem passagem

- O Globo

Eles ralam cada vez mais e recebem cada vez menos. Na pandemia, os entregadores de aplicativos têm ajudado milhões de brasileiros a se alimentar sem sair de casa. As empresas ampliaram os lucros, mas reduziram a remuneração dos trabalhadores.

Segundo a Rede de Estudos e Monitoramento da Reforma Trabalhista, que reúne pesquisadores de diferentes universidades, 60,3% dos entregadores viram sua renda cair desde a chegada do coronavírus. Metade deles roda de domingo a domingo, sem direito a descanso e a direitos básicos, como seguro e vale-refeição.

“É uma nova forma de precarização do trabalho. No dia em que fica em casa, o entregador não recebe nada. Estamos falando de pessoas que já viviam no limite antes da pandemia”, ressalta a socióloga Ludmila Costhek Abílio, pesquisadora da Unicamp.

Nos últimos meses, o medo da contaminação aumentou a pressão sobre os entregadores, que já se queixavam das más condições de trabalho.

“Se você se atrasa ou recusa uma corrida, sua pontuação cai e fica mais difícil pegar outra entrega. Às vezes não dá nem para almoçar”, conta o paraibano Carlos Pereira, que roda cerca de 200 quilômetros por dia no Rio, das 10h à meia-noite.

No carnaval, ele conheceu outra face da uberização do trabalho. Um motorista atingiu sua moto e fugiu sem prestar socorro. Com ferimentos nas pernas, Pereira levou quase um mês para se recuperar e ainda teve prejuízo de R$ 1.000 com a oficina.

Hoje os entregadores de aplicativos farão a primeira greve nacional por melhores condições de trabalho. Uma das bandeiras é o reconhecimento de vínculo com as empresas, o que garantiria os direitos previstos na CLT. Outra reivindicação é o estabelecimento de valores mínimos por corrida. Algumas empresas chegam a pagar menos de R$ 5 por deslocamentos curtos.

Líder do mercado de aplicativos, o iFood afirma que “apoia a liberdade de expressão” e que não vai retaliar quem cruzar os braços. Apesar da promessa, há entregadores com medo de represália. Por isso, surgiu nas redes sociais uma campanha para que os consumidores não peçam entregas nesta quarta-feira.

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