quarta-feira, 1 de julho de 2020

Pela 1ª vez, menos de 50% estão ocupados

Em movimento recorde, 9 milhões de pessoas desistiram de procurar trabalho de março a maio

Por Bruno Villas Bôas | Valor Econômico

RIO - Apesar dos sinais de que abril foi o “fundo do poço” em diferentes setores da economia, a crise do mercado de trabalho se aprofundou no trimestre móvel encerrado em maio, quando 7,8 milhões de pessoas perderam suas ocupações. Pela primeira vez, menos da metade (49,5%) da população em idade para trabalhar (14 anos ou mais) estava ocupada.

Segundo economistas, os sinais não são de melhora do emprego nos próximos meses. Mesmo que a flexibilização do isolamento social permita uma retorno dos informais às ruas, a expectativa é de mais dispensas nas empresas nos próximos meses ou, na melhor das hipóteses, de uma estabilização.

Dados divulgados ontem pelo IBGE mostram que a população ocupada - empregados, empregadores, conta própria, servidores - era de 85,9 milhões no trimestre até maio, queda de 8,3% frente aos três meses anteriores. Houve uma perda de 7,8 milhões de vagas. É o pior resultado da série histórica, iniciada em 2012.

O destaque negativo foi a perda de 1,98 milhão de ocupações no comércio, o que representa redução de 11,1% ante os três meses anteriores. Mas outras atividades tiveram perdas expressivas, como indústria (-1,23 milhão de postos), construção (-1,08 milhão) e serviços domésticos (-1,17 milhão).

Apesar dos resultados tão negativos, a taxa de desemprego do país cresceu relativamente pouco: de 11,6% no trimestre até fevereiro para 12,9% no trimestre até maio. O resultado ficou praticamente em linha com a mediana das projeções de analistas ouvidos pelo Valor Data, de alta da taxa para 13%. O país tinha 12,9 milhões de desempregados.

Segundo economistas, a taxa de desemprego do país não mostrou a realidade do mercado de trabalho. O IBGE segue metodologias internacionais e não há nada de errado com seus cálculos. Para o órgão, desempregado é quem procura trabalho e não encontra. O problema é que a quarentena dificulta ou impede essa busca.

Dados do IBGE mostram que 9 milhões de pessoas tornaram-se inativas no trimestre até maio. São pessoas em idade de trabalhar, mas que preferiram não procurar vaga. É um movimento recorde. Nos cálculos da MCM Consultores, sem esse marcha para fora da força de trabalho, o desemprego teria atingido 20 milhões de pessoas e a taxa estaria em 18,9%.

Com a flexibilização da quarentena, os indicadores de desemprego devem mostrar alta em junho, refletindo uma maior busca por vagas no mercado de trabalho, diz Fabio Romão, economista da LCA Consultores. Cálculos da consultoria são de alta da taxa para 14% em maio. Se confirmada, a taxa será um recorde da série.

“Ainda vamos ver fechamento de vagas em junho, mas talvez em ritmo menos dramático. Nossa sensação é que o setor formal concentrou seus ajustes em abril. Empresas que planejavam demissões antes da pandemia usaram aquele momento para ajustar os quadros”, afirmou o economista da LCA.

Daniel Duque, pesquisador do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (Ibre/FGV), acrescenta que, além da flexibilização da quarentena, a perspectiva de redução do auxílio emergencial pago pelo governo tende a motivar mais trabalhadores a buscar colocação no mercado em junho e julho, puxando a taxa de desemprego para cima.

Duque calculou o desempenho do mercado de trabalho isoladamente no mês de maio, expurgando março e abril do trimestre móvel usado pelo IBGE. Ele identificou que a queda da ocupação foi de 1,2% em maio, ante o mês anterior. Essa queda havia sido mais intensa em abril, de 6% em relação a março.

“São dois saldos negativos, mas um menor do que outro. O estoque de emprego caiu mais devagar, mas não chegou ao fundo do poço. Então, é um movimento semelhante ao que vimos nos dados do emprego formal do Caged”, explica o pesquisador. “O ajuste do emprego não chegou ao fim.”

Duque afirma que as medidas adotadas pelo governo, como a possibilidade de redução da jornada de trabalho, evitaram uma maior perda de empregos no país. Para ele, o ajuste do mercado de trabalho vai ser mais intenso do que o previsto nas horas trabalhadas, e menos no desemprego.

“Estamos revisando nossa projeção da taxa de desemprego média do ano para algo em torno de 15,5%, abaixo da taxa média de 18,7% que prevíamos antes. O que estamos esperando é uma redução mais intensa das horas trabalhadas e menor da população ocupada”, afirma o pesquisador.

A Guide Investimentos concorda que as medidas do governo amorteceram parte dos impactos da pandemia de coronavírus sobre o mercado de trabalho, mas acrescenta em relatório que os danos ao mercado de trabalho levarão mais tempo para serem totalmente avaliados.

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