sábado, 24 de outubro de 2020

João Gabriel de Lima - Seu candidato prometeu um viaduto? Não vote nele

- O Estado de S.Paulo

Um postulante a prefeito tem a obrigação de conhecer e enfrentar temas espinhosos

Paulo Maluf começou sua carreira na ditadura. Veio a democracia, e ele se aclimatou rapidamente ao novo ecossistema com eleições, postulando cargos a cada pleito. Recebeu de seus adversários o apelido de “candidato competente”, pois competia, competia, competia – e raramente ganhava. Em suas frequentes campanhas eleitorais, ficaram famosas as propagandas de TV com imagens de túneis, pontes e viadutos, sempre com o carimbo “obra de Maluf”. A mais famosa de todas é o elevado João Goulart, conhecido como Minhocão, aquela aberração urbana da qual São Paulo não consegue se livrar.

Vai longe o tempo em que prometer obras viárias dava votos. “Viadutos apenas mudam o lugar dos engarrafamentos. Hoje se sabe que a única solução para o caos urbano é melhorar o transporte público”, diz Sérgio Avelleda, professor do Insper e diretor do Ross Center, organização internacional destinada a melhorar a vida nas cidades.

No dia 15 de novembro os brasileiros escolherão seus prefeitos. Como identificar um bom candidato no emaranhado de promessas amontoadas em lives e sabatinas? Um bom começo é descobrir os consensos inescapáveis em cada área e saber o que o candidato pensa a respeito. Na área de mobilidade urbana, o exemplo acima, há um consenso em torno do transporte público. A divergência se dá no que priorizar – ônibus? Metrô? Ciclovia? – e na melhor maneira de viabilizar o investimento. 

O propósito do podcast Estadão Cidadania – Onde Nos Entendemos, disponível a partir de hoje nos tocadores digitais, é precisamente este. Apresentar aos eleitores os fatos inescapáveis em cada área, ajudando a separar a conversa séria do populismo barato. Os podcasts da série têm cerca de meia hora cada um e se compõem de três partes. Na primeira, “Onde nos entendemos”, são apresentados os consensos. Na segunda, “Precisamos conversar sobre”, as divergências. Ao final, os convidados se dirigem ao eleitor de modo a envolvê-lo no debate, além de dar dicas sobre o que deve ser levado em consideração na hora de escolher um candidato.

O programa de estreia fala de Educação. A convidada especial é Priscila Cruz, diretora executiva do Todos Pela Educação. Com ela aprendemos, entre outras coisas, que o grande consenso na área é o investimento nos professores – em como melhorar sua formação e criar planos de carreira que façam sentido. Aí começam as discussões. Como deve ser essa carreira? Como avaliar os professores? Seria o caso de pagar um bônus por desempenho? Que países desenvolveram modelos inspiradores para o Brasil? Um debate eleitoral sério deveria contemplar essas questões, mesmo que espinhosas. 

Os podcasts, apresentados por mim, reúnem um convidado externo e um jornalista especializado do Estadão. Na primeira temporada, há protagonistas da sociedade civil, como Priscila Cruz e Luiz Felipe D’Avila, especialistas que participam de redes internacionais de conhecimento, como Sérgio Avelleda, Ilona Szabó e Tomas Alvim, e políticos que conhecem o dia a dia da administração pública. Assim como uma casa precisa de alicerces, um debate de alto nível se assenta sobre fatos e dados – que um postulante a prefeito tem a obrigação de conhecer e enfrentar. Seu candidato evita temas espinhosos como avaliação de professores? Fuja. Prometeu um viaduto ligando o leste ao oeste da cidade? Não vote nele de jeito nenhum.

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