É
provável que governo e Congresso empurrem com a barriga a definição das
questões fiscais
Os
investidores estão se preparando para terminar 2020 sob uma profunda incerteza
fiscal, especialmente ainda sem saber se o teto de gastos será respeitado ou
flexibilizado a ponto de minar a sua credibilidade. O mais provável é o governo
e as lideranças políticas no Congresso empurrarem com a
barriga a definição das questões fiscais cruciais.
O
tempo corre contra a votação das medidas mais aguardadas pelo mercado
financeiro ainda neste ano: o Congresso entra em recesso no dia 23 deste mês. O
presidente Jair Bolsonaro resolveu
esperar acabar as eleições municipais para retomar as negociações de temas como
a aprovação do Orçamento de 2021,
a prorrogação do auxílio emergencial e
a criação de um programa de transferência de renda, ou mesmo a simples
reformulação do Bolsa Família.
Se o ambiente não era favorável a discutir esses temas antes do desfecho do pleito municipal, no domingo passado, agora outro obstáculo poderá tolher os principais atores políticos a avançarem nas negociações: as eleições para o comando da Câmara dos Deputados e do Senado, marcadas para fevereiro de 2021.
Nesse
contexto político, da disputa para a presidência das duas casas, a expectativa
é que o governo não queira criar marolas desnecessárias e se concentre em
aprovar, nas sessões que restam no Congresso neste mês, a Lei de Diretrizes
Orçamentárias (LDO) e o Orçamento do ano que vem sem
grandes malabarismos.
E
qual a implicação dessa postura? É o governo não anunciar, por exemplo, um
programa de transferência de renda ou uma prorrogação do auxílio emergencial
por três meses que resulte na implosão do teto de gastos de imediato. Ou seja,
seria uma solução que evitaria o pior em termos de reação do mercado, mas, ao
mesmo tempo, não conseguiria eliminar a percepção de uma situação fiscal muito
frágil do País.
Na
prática, os investidores seguiriam exigindo um prêmio de risco para aplicar em
ativos brasileiros, como títulos do Tesouro ou ações em Bolsa.
Por outro lado, também não haveria um gatilho para deterioração significativa
dos preços dos ativos brasileiros em meio a um ambiente externo favorável, com
enorme apetite a risco pelos investidores globais, diante das notícias
favoráveis em relação a vacinas contra o coronavírus.
Haja
vista o que aconteceu, por exemplo, com as Bolsas de Valores nos Estados Unidos,
cujos principais índices acionários registraram em novembro o melhor mês de
ganho em mais de três décadas.
Enquanto
o Congresso e o governo ficaram paralisados no Brasil no mês passado, em razão
das eleições municipais, os mercados globais surfaram na onda do otimismo com
as vacinas contra covid-19 e também com a vitória do democrata Joe Biden no pleito presidencial
americano.
Se
o governo e o Congresso não fizerem uma grande burrada aos olhos dos investidores,
os preços dos ativos brasileiros devem se beneficiar de um ambiente externo
bastante favorável. E o que seria essa burrada?
Para
o mercado, no curtíssimo prazo, seria uma extensão do auxílio emergencial até
março de 2021, mediante crédito extraordinário, ou o anúncio de um novo
programa social turbinado em termos de valores, quer seja sob o nome de Renda
Brasil ou qualquer outro. Em resumo: essencialmente, medidas que indicassem que
Bolsonaro arbitrou em favor da ala política na disputa com a equipe econômica.
Assim,
a aposta dos investidores hoje é que o governo irá aprovar um Orçamento de 2021
preservando o teto de gastos, porém sem afastar os riscos às contas públicas no
ano que vem. Isso quer dizer não fazer nada (Renda Brasil, etc.), por enquanto.
Esse suspense sobre o que vai acontecer com o fiscal em 2021 será relativamente
inofensivo ao mercado, cortesia do ambiente externo, mesmo se os parâmetros do
Orçamento não forem críveis.
Todavia,
no meio desse caminho há uma pandemia. O Brasil vem registrando uma
aceleração no número de casos e de mortes de covid. As internações hospitalares
começam a tomar a capacidade dos leitos disponíveis nas UTIs. O risco é a
dinâmica da pandemia forçar autoridades de Estados e municípios a adotar
medidas de distanciamento, levando a perdas de renda e emprego.
Nesse cenário, a pressão por socorro financeiro à população mais vulnerável poderá ser tal que resulte em consenso político para aprovar mais gastos. Seria o derradeiro respiro do teto de gastos.
Nenhum comentário:
Postar um comentário