Já está avançada a divisão interna dos principais caciques do DEM, uma das jóias mais vistosas das eleições de 2020, entre o apoio ao projeto presidencial de Luciano Huck e o de João Doria (PSDB) em 2022. Não são poucos os interesses em jogo no tabuleiro, e cada um dos lados tem apoiadores de peso para o seu projeto, além de argumentos sólidos e que envolvem a geopolítica estadual em sua ponderação.
Neste
momento e diante do avanço das duas hipóteses, o namoro com Ciro Gomes (PDT) é
a hipótese menos avançada, embora tanto o presidente nacional da sigla, ACM
Neto, quanto o presidente da Câmara, Rodrigo Maia, mantenham uma ponte
estendida rumo ao pedetista.
Avançou
muito nos últimos meses a aproximação de Luciano Huck com o DEM. O partido
passou a ser o destino mais provável do apresentador de TV caso ele finalmente
deixe a hesitação de lado e decida se lançar num projeto presidencial. Neste
caso, ele faria isso como candidato do DEM, e não do Cidadania, como chegou-se
a ventilar.
O partido de Roberto Freire, embora tenha em sua órbita os chamados movimentos de renovação, plataforma importante do projeto de Huck, vem perdendo fôlego eleitoral, ao passo que o DEM vem crescendo. Maia, ACM Neto e Eduardo Paes compõem a tríade demista que conversa com Huck, e espera uma resposta sua até março do ano que vem.
As
conversas começaram no meio do ano, e já evoluíram muito. O convite para a
filiação foi feito sem rodeios, e está subentendido que Huck já está convencido
de que, se for mesmo candidato, terá de ser por um partido estruturado como o
DEM. A hesitação do apresentador ainda é de se apresentar como um candidato de
centro-direita, quando prefere ser classificado como progressista. Mas os
aliados têm alertado que esse campo já está congestionado e que, nele, Huck tem
poucas chances.
Para
tê-lo no time, o DEM aceita fazer uma revisão programática que contemple a
defesa de um liberalismo nas duas pontas: na economia e também na pauta de
costumes, o que o afastaria do reacionarismo bolsonarista e daria discurso a
Huck.
O
namoro cada vez mais sério acendeu o alerta na seção paulista do DEM e no PSDB.
O vice-governador de São Paulo, Rodrigo Garcia, sempre foi um general importante
na configuração do primeiro escalão demista. Fechou uma aliança muito explícita
com João Doria Jr. de que, caso o tucano conseguisse cumprir uma série de
tarefas entre 2019 e 2022, seria o candidato ao governo de São Paulo, numa
inédita cessão de lugar do PSDB no Estado que governa desde 1995.
Acontece
que nenhum cacique do DEM fora de São Paulo acredita que o PSDB vá abrir mão de
ter candidato em São Paulo, ainda mais depois de uma eleição municipal em que
saiu com sotaque ainda mais paulista (encolheu no resto do Brasil e cresceu em
São Paulo). Além disso, os demistas do Nordeste temem repetir 2018, quando,
mesmo dividido, o DEM decidiu sair em aliança com o PSDB pela sétima (!) vez e
Geraldo Alckmin foi humilhado nas urnas.
Esses
dirigentes do DEM argumentam que Doria tem um perfil muito “arrumadinho”,
difícil de emplacar fora de São Paulo, ainda mais diante de uma disputa que vai
ter Jair Bolsonaro e o PT. “Corremos sério risco de ficar de novo assistindo a
um segundo turno entre Bolsonaro e o PT”, me disse um importante player do DEM
entusiasta a saída Huck.
Mas
o apresentador do Caldeirão não é igualmente janota, além de ser
alguém ingênuo e pouco versado nas artes da política? A essa pergunta os
partidários de sua filiação ao DEM respondem que ele tem uma inserção nacional
que precede a política, e é alguém identificado com preocupações sociais graças
a sua imagem consolidada na TV.
O
que mais seduz o DEM, para além dessas questões de imagem, é a possibilidade de
ter uma candidatura própria pela primeira vez desde 1989, com Aureliano Chaves.
“Essa é uma dívida que nunca que se paga? Onde está escrito que precisamos ser
linha auxiliar do PSDB o resto da vida?”, pondera um demista.
A
sedução parece sublimar até o cálculo de vir a ter o governo de São Paulo, algo
muito além da atual estatura do DEM, mesmo diante das vitórias em capitais
(Rio, Salvador, Curitiba e Florianópolis). Rodrigo Garcia, sempre muito
cauteloso na articulação política, tem se mostrado internamente disposto a
bancar a briga, mesmo se tiver de ficar em lado oposto de seus tradicionais
aliados Neto e Maia.
Tem
dito que, caso seu partido o trate como peça descartável e ache que é pouco ter
o governo de São Paulo, vai tentar vencer uma eventual convenção. Se fia no
fato de que é um dos mais reconhecidos operadores do partido em votos no
Congresso e em convenções, profundo conhecedor dos humores das bancadas da
Câmara e do Senado.
Se,
ainda assim, for derrotado, tem dito explicitamente que se filiará a outro
partido para apoiar Doria e disputar o governo paulista. Esse destino pode ser
o próprio PSDB, o que não interessa tanto a Doria, pois deixa de somar tempo de
TV em sua coligação, o PSD do antigo aliado Gilberto Kassab (com quem rompeu há
alguns anos, mas, segundo interlocutores de ambos, voltou a ter boa relação) ou
mesmo o MDB, partido que se aproximou da órbita do Palácio dos Bandeirantes na
sucessão paulistana.
E
a opção Ciro? Deixou de ser tão sedutora aos olhos dos pais fundadores (ou
herdeiros) do DEM. Isso porque o mapa do Brasil após as eleições se mostrou
ainda inclinado à centro-direita, com os partidos da política tradicional
voltando a mostrar força. A avaliação interna do DEM é que o caminho para
vencer Bolsonaro é por aí, e não pela centro-esquerda (que, ademais, estará
congestionada por Ciro, pelo PT e pela estrela ascendente Guilherme Boulos, do
PSOL).
Tudo
isso é o retrato de 2020, que depende de 2021 para desaguar em 2022.
Algumas
respostas precisarão ser dadas:
Huck
vai deixar a Rede Globo e o conforto da fama e dos contratos milionários para
se aventurar no terreno pantanoso, pouco conhecido por ele e violento da
política? Nem seus entusiastas têm certeza disso;
Doria
vai conseguir fazer nos próximos dois anos um governo bem avaliado, que lhe
permita sair de São Paulo com capital eleitoral suficiente para se
nacionalizar?
Bolsonaro
vai conseguir recuperar seu eleitorado à base de reação da economia e
composição com o chamado centrão? Nesse caso, o DEM ficará no governo e ainda
flertará com a possibilidade de apoiá-lo (algo que hoje, com exceção de Onyx
Lorenzoni e Ronaldo Caiado, ninguém no partido quer?)
Rodrigo Maia e Davi Alcolumbre vão para o tapetão e conseguirão se reeleger para novos mandatos à frente das presidências da Câmara e do Senado? Isso elevará ainda mais o já alto cacife do DEM para a sucessão presidencial.
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