Ao que parece, mais uma vez o
Congresso vai dar as costas aos brasileiros. Os números apurados pelo GLOBO e
pela Folha de S. Paulo indicam que o deputado Arthur Lira e o senador Rodrigo
Pacheco devem ser eleitos presidentes da Câmara e do Senado. Os dois, como se
sabe, são os candidatos apoiados por Jair Bolsonaro. Pacheco em duas
entrevistas disse que até agora não viu crimes de responsabilidade cometidos
pelo presidente e que “erros do governo na pandemia são escusáveis”. Lira não
precisa dizer nada, todo mundo sabe o que ele pensa e como ele age.
O que se
desenha com
a eleição destes dois senhores é que os evidentes crimes praticados por
Bolsonaro, contabilizados já na casa das duas dezenas, serão ignorados pelo
Congresso. E obviamente também não tramitará qualquer outra denúncia por novos
crimes que certamente o presidente perpetrará. Até o momento, 61 pedidos de
impeachment de Bolsonaro foram encaminhados ao Congresso por partidos políticos
e entidades civis. O presidente deveria ser julgado por apoiar o golpe de 1964,
apoiar motim da PM, tentar interferir na PF, apoiar manifestações
antidemocráticas, se calar diante de declarações antidemocráticas de ministros,
ameaçar o STF, ameaçar procuradores, atentar contra a vida na pandemia, entre
outros crimes.
Como se
vê,
o presidente do Brasil é um criminoso contumaz. E a maioria dos 594 deputados e
senadores que vão eleger os novos chefes das duas casas do Congresso tende a se
alinhar àqueles que já disseram publicamente que os erros de Bolsonaro são
desculpáveis ou que ele não cometeu crime. Não precisa ser muito esperto para
entender o que a constatação explica. E a sua compreensão depõe ainda mais
contra o Congresso brasileiro. Deputados e senadores estão trocando votos por
cargos, vantagens e benesses do poder executivo, como sempre. Em alguns casos,
compreende-se. Em outros, não.
Não surpreende, por exemplo, que mesmo alguns parlamentares do DEM de Rodrigo Maia, que apoia Baleia Rossi para dirigir a Câmara, votem em Arthur Lira. O Democratas é um partido de aglomeração. Reúnem-se nele políticos de centro, de centro-direita ou de direita. O partido não vota monoliticamente como orientação política, mas sempre apoia medidas de caráter liberal. Sucessor da Arena e do PDS, que dominaram o Congresso durante a ditadura, virou coadjuvante em todos os governos civis desde José Sarney. O DEM é conhecido pelo seu gosto de apoiar governos, não importa qual.
Os
senadores do PT,
por outro lado, anunciaram que vão votar em Rodrigo Pacheco. E não é por falta
de opção. Significa que o maior partido de esquerda do país, teoricamente o
principal opositor do governo de extrema direita de Bolsonaro, se alia a este e
como consequência o auxilia a encobrir seus crimes de responsabilidade. Um
petista que circula pelos altos escalões do partido diz que no Senado “o bicho
é outro”, que as razões internas superam as questões partidárias. Como? Pois é.
O partido que em 1985 expulsou os deputados Airton Soares, Bete Mendes e José
Eudes, que votaram em Tancredo Neves no Colégio Eleitoral, vai permitir agora
que seus senadores votem com Bolsonaro.
No meio
do caos que
o governo promoveu no país, especialmente durante a pandemia que já matou mais
de 210 mil brasileiros, é incrível que Bolsonaro ainda tenha prestígio no
Congresso a ponto de conseguir eleger os presidentes de Câmara e Senado. Sob
qualquer ângulo que se olhe, nenhum presidente desde Deodoro da Fonseca, que
derrubou um império e instaurou uma república, tumultuou tanto o país quanto
Bolsonaro. O Congresso é cego? Não, claro que não. Ele se faz de cego porque as
votações para presidentes das duas casas serão secretas. E no escuro tudo fica
mesmo muito embaçado.
Antes de
a vaca ir
de vez para o brejo, dá tempo para o presidente Rodrigo Maia cumprir seu papel
histórico antes do fim do seu mandato, aceitando um dos 61 pedidos de
impeachment de Bolsonaro que repousam em sua mesa. Não vale dizer que o
processo daria em nada. Porque não é verdade. Impeachments são votados a plenos
pulmões, a viva voz e com o rosto descoberto dos parlamentares, que usariam no
máximo uma máscara profilática, pelo menos os não negacionistas. Aí a coisa
muda, não é mesmo? Apoiar publicamente um presidente com popularidade de
míseros 26% (Pesquisa Exame/Idéia) é diferente de votar num parlamentar
bolsonarista, ainda mais protegido pela escuridão.
CONTANDO
COM O OVO
A
turma do deputado Arthur Lira, candidato de Bolsonaro à presidente da Câmara,
garante que vai ganhar a eleição em fevereiro, quando os deputados voltarem do
recesso parlamentar. Diz que vai fazer barba, cabelo e bigode.
Um
dos mais fiéis deputados da base governista afirma que Lira fará maioria de
votos até mesmo no DEM de Rodrigo Maia, o que seria um vexame para o filho de
Cesar. O fato é que Lira está contando com o ovo mesmo sem antes ter combinado
com a galinha.
A MELHOR
ESCOLHA
Bolsonaro
pode ter se frustrado com seus escolhidos para os ministérios da Justiça e da
Saúde. Afinal, Sergio Moro e Luiz Mandetta não o obedeceram cegamente quando as
primeiras demandas absurdas foram apresentadas. Moro não entregou o controle da
PF ao presidente e Mandetta não endossou bestamente a cloroquina. Mas de onde
menos se esperava é que veio o melhor
cúmplice, quero dizer, o melhor aliado ou a melhor escolha de
Bolsonaro. Trata-se do procurador-geral da República, Augusto Aras. Logo ele,
quem tem mandato e prerrogativas.
BOBALHÃO
O
chanceler Ernesto Araújo disse ao Congresso que não há nenhuma crise
diplomática entre o Brasil e a China. As negociações entre os dois países
seguem sem sobressalto, garantiu o ministro que apenas a ala fascista (que muitos
chamam de ideológica) do governo apoia. Quem acha que a China é pragmática
demais para retaliar, veja o que ela fez na quinta com líderes do governo
Trump. Até Mike Pompeo, ex-secretário de Estado dos EUA, não pode mais entrar
no país. Se alguma empresa americana o empregar, terá eventuais contratos com o
gigante asiático suspensos. Outros 26 apoiadores ou membros da equipe de Trump
receberam as mesmas sanções. Quem sabe Ernesto Araújo não toma emprestado o
hipnotizador do general Pazuello para negociar com os chineses.
Vai
ser bobo assim lá na China.
CARTA DO
BOZO
Quem
escreveu a carta que Jair Bolsonaro mandou para o recém empossado presidente
dos Estados Unidos? Não importa, desde que seja imediatamente nomeado ministro
das Relações Estrangeiras. Ou, não. Pode ser mais uma falsidade emanada
daqueles porões escuros do Planalto.
SE FOSSE
SERRA
Foi
em 2001, na gestão do ex-ministro das Saúde José Serra, que o Departamento de
Comércio dos Estados Unidos e os laboratórios globais produtores de
medicamentos contra a Aids se dobraram ao Brasil e passaram a negociar preços.
Depois de muita pressão de Serra no Congresso, tinha sido aprovada lei
autorizando a quebra de patentes dos remédios que compunham o coquetel anti
HIV. As negociações, que só ocorreram para evitar a quebra daquelas patentes,
foram uma vitória brasileira e os preços despencaram. A lógica de Serra vale
ainda hoje: o
mercado nacional é muito grande para ser tratado com
descaso e o Estado brasileiro é um dos maiores compradores globais de remédios.
Depois da pandemia, o mundo continuará consumindo medicamentos para todas as
outras doenças.
FALTAM
LEITOS
Os
dados são do IBGE. Enquanto a população brasileira cresceu 8,4% entre 2012 e
2019, o número de leitos do SUS, por mil habitantes, caiu 12,8%. No Rio, no
mesmo período, a população cresceu 6,4% e os leitos do SUS diminuíram
inacreditáveis 28,4%. Pode?
VACINA
PRIVADA
Faz
sentido impedir que clínicas e empresas privadas comprem diretamente lotes de
vacinas para vender aos seus clientes ou para aplicar em seus empregados.
Afinal, estamos falando de uma pandemia
que alcança a todos indistintamente, mesmo os
desempregados e aqueles que não teriam dinheiro para comprar uma dose privada.
Mas há quem defenda a liberação, que poderia reduzir a pressão sobre a rede
pública. Pode ser. Mas, talvez mais adiante.
AGORA
VAI
Rebuliço
no Palácio da Paz Celestial. Chegou a carta do deputado Fausto Pinato
(presidente da Comissão Parlamentar Brasil/China) para o líder Xi Jinping
pedindo prioridade
para o Brasil na liberação das vacinas e dos insumos
necessários para a sua produção. Não se fala de outra coisa em Pequim.
PAPO
ADIADO
Algumas horas antes do início previsto, foi cancelado o bate papo organizado pela Lide Talks de Santa Catarina entre o governador Gean Loureiro e o deputado estadual Júlio Garcia, presidente da Assembleia Legislativa do estado. É que no amanhecer do dia do “talk”, Garcia foi preso pela PF numa operação contra uma organização criminosa especializada em fraudes, desvios de verbas públicas e lavagem de dinheiro. Fica para a próxima.
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