Bolsonaro
quer impor roteiro, desqualificar Calheiros e dar Pazuello aos leões, mas os
fatos o condenam
Com
a instalação da CPI da Covid, começa hoje uma nova
fase do governo Jair Bolsonaro, que, além de já estar
em campanha eleitoral antecipada para 2022, vai estar muito ocupado em tentar
explicar o inexplicável numa tragédia histórica que já levou 390 mil vidas no
Brasil. Bolsonaro vai passar a ter oposição real e muita
visibilidade negativa.
A
CPI é como o coronavírus:
desconhecida, altamente contagiosa e potencialmente letal. Se Bolsonaro reagir
a ela com o negacionismo com que trata o próprio vírus, ficará em maus lençóis.
Mas, se ele é incompetente como presidente, é esperto como candidato e na
relação com o Centrão.
Suas três prioridades: impor o roteiro da CPI, desqualificar o senador Renan Calheiros como relator e
manter controle sobre o general e ex-ministro da Saúde Eduardo Pazuello.
Quanto ao roteiro, o Planalto fez 23 perguntas a ministros sobre os erros mais gritantes, mas tem muito mais. Exemplos: por que tratar a pandemia até hoje como “gripezinha”? E por que Bolsonaro jogou no lixo documentos do Exército e da Abin sobre isolamento? Nenhum ministro tem resposta para isso, assim como ninguém sabe que tipo de motivações, ou interesses, estão por trás da posição sobre isolamento, máscaras e vacinas – e sem pôr nada no lugar, além de cloroquina...
Atacar
Calheiros é fácil, pelos processos no Supremo e por ser pai do governador de
Alagoas, Renan Filho,
como acatou ontem a Justiça Federal no DF. Mas Renan pode ser tudo, menos bobo.
É experiente, tem liderança e, depois de tanto tempo recolhido, sabe bem o que
o esperava e espera ao voltar aos holofotes.
Quanto
a Pazuello, ele é um risco para Bolsonaro. Como ministro, já se atrapalhava
todo com jornalistas, mentindo, apresentando previsões irreais de vacinas,
tirando onda de irritado. Já imaginaram numa CPI com raposas, maioria
oposicionista, montanhas de erros e nenhuma defesa?
Até
na véspera da CPI, Pazuello e o sucessor, Marcelo Queiroga, continuaram errando.
Um ex-ministro da Saúde passeando sem máscara num shopping logo de Manaus? E o
atual tentando culpar o Butantan por
falta de segundas doses? De Pazuello não se espera muito e o próprio Exército
não sabe o que fazer com ele. Mas Queiroga? Está mal informado, ou entrou na
dança política?
Ontem,
Queiroga jogou para governadores, Butantan e Coronavac a culpa por
muitos brasileiros, sabe-se lá quantos, não conseguirem tomar a segunda dose.
Se há vacinas, o Brasil deve à Coronavac. E por que não há segunda dose?
Porque, em 21 de março, dois dias antes da nomeação de Queiroga, o Ministério da Saúde liberou
Estados e municípios a gastarem todo o estoque na primeira. É mais uma
irresponsabilidade criminosa, até porque as previsões de doses nunca foram
confiáveis. O ministro não sabia?
Foi
também o Ministério da Saúde quem confiscou toda a produção nacional do kit
intubação, mas, quando os insumos e medicamentos começaram a faltar e o governo
de São Paulo mandou nove ofícios pedindo envio urgente de kits, o que Queiroga
respondeu? Mandou os “Estados ricos” comprarem seus próprios kits. Comprar
onde, se todo o estoque foi requisitado pelo governo federal?
A estratégia do governo é jogar Pazuello aos leões e deixar os demais ministros na fila da jaula, inclusive Paulo Guedes e o ex-chanceler Ernesto Araújo. Todos, porém, só cumpriram ordens. Um manda, os outros obedecem. O presidente Jair Bolsonaro é o grande responsável, cometeu os grandes erros, é o grande alvo. A intensa articulação do Planalto para esvaziar a CPI, atacar Calheiros e usar Pazuello de escudo esbarra numa antiga verdade: contra fatos, não há argumentos. Nem articulação que dê jeito.
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