Atraso
nas vacinas foi deliberado, diz governador de Alagoas
O
governador de Alagoas, Renan Filho (MDB), recorreu a uma metáfora
futebolística, tão comum na política, para explicar por que a falta de uma
coordenação nacional no combate ao coronavírus contribuiu para o
recrudescimento da pandemia no Brasil.
“O
Ministério da Saúde é fundamental nesse processo, e em meio à crise, tivemos
quatro ministros. Imagina a Seleção Brasileira, às vésperas da Copa do Mundo,
trocando de técnico quatro vezes, cada um com um time de diferente, um lateral
esquerda, outro de direita. Certamente isso dificulta a organização do time”.
O
mandatário é filho do senador Renan Calheiros (MDB-AL), que ontem teve a
nomeação para o cargo de relator da CPI da pandemia impedida por uma liminar da
Justiça Federal do Distrito Federal. Nas redes sociais, o senador classificou a
decisão como “interferência indevida”, acusou o governo Jair Bolsonaro de
orquestrá-la, anunciou que vai recorrer, e provocou: “Por que tanto medo?”
Para Renan Filho, contar com Renan Calheiros na relatoria da CPI não deveria inspirar medo, mas, sim, confiança pela sua experiência política e disposição para conciliação. “Não se encontra no Senado tanta gente com a capacidade dele, experiente, calmo, sereno. O senador Renan é equilibrado e no papel de relator, só vai ajudar”.
O
governador acrescenta que o senador seria incapaz de qualquer injustiça na
condução dos trabalhos “porque já foi injustiçado, e sabe o que isso
significa”. Uma alusão às denúncias contra o senador no âmbito da Lava-Jato.
Renan ainda responde a oito processos no Supremo Tribunal Federal, mas dos 17
originais, nove já foram enviados ao arquivo.
Na
última semana, Renan Filho recebeu um telefonema do presidente Jair Bolsonaro,
que tem o alagoano como único interlocutor entre os governadores do Nordeste.
Na conversa, Bolsonaro reafirmou ao governador que o momento é inoportuno para
a CPI.
O
governador não discordou do presidente naquele momento, porque seria uma
descortesia em pleno telefonema com o chefe do Executivo. Ontem, entretanto,
Renan Filho disse à coluna que tem outra opinião: “Quem decide o momento ideal
para uma CPI é o Congresso Nacional”.
Renan
Filho acredita que Bolsonaro lhe telefonou para fazer “um gesto na direção do
diálogo”, já que o senador Renan havia sido indicado para relatar a CPI. O
governador lembrou que, em entrevistas recentes, Renan Calheiros disse que,
como relator, conversaria com todos, “especialmente com o presidente, se ele
desejar”.
Até
ontem, havia ambiente para o diálogo, mas a ofensiva judicial da deputada Carla
Zambelli (PSL-SP), aliada de primeira hora do Palácio do Planalto, e que obteve
a liminar barrando Renan, tumultuou o jogo. Se a decisão for revogada, Renan
assumirá o posto pintado para a guerra, um figurino que ainda não havia
exibido.
No
fim de semana, Renan foi ao Twitter declarar-se suspeito em relação a qualquer
investigação sobre o governo de Alagoas que surgir na CPI. Uma reação à
campanha deflagrada nas redes sociais pelos bolsonaristas, que impulsionaram a
hashtag #Renansuspeito, já que o relator da CPI é pai de um governador, e os
governadores serão investigados quanto à gestão dos recursos federais para o
enfrentamento da pandemia.
Renan
Filho diz que não teme essa investigação porque Alagoas tem bom desempenho na
pandemia. É o terceiro Estado com menos mortes por grupo de 100 mil habitantes,
e não foi investigado pela Polícia Federal.
Para
conter a covid-19, ele associou medidas de distanciamento social e de restrição
de circulação, à ampliação da rede hospitalar. Relata que acelerou a conclusão
de quatro hospitais, ao mesmo tempo em que contou com o apoio da Federação das
Indústrias e da Associação Comercial em comerciais para a televisão nas medidas
restritivas. Está em vigor o toque de recolher a partir das 21 horas, e dias
pontuais para o fechamento dos shoppings. A lotação das UTIs está em 76%.
“Por
essas ações a rede não colapsou até agora. É possível construir um discurso
integrado, mas houve no Brasil uma intenção de dividir o país”.
Renan
Filho invoca o infográfico elaborado na semana passada pelo site “Poder360”,
que comparou unidades federativas a países. Nesse comparativo, o Distrito
Federal e sete Estados brasileiros estariam entre os 10 países com mais vítimas
da covid-19. Amazonas, com 2.903 mortes por milhão, desponta acima da República
Tcheca, líder do ranking mundial. Alagoas estaria empatado com a Bahia, em 32º
lugar, com 1.186 mortes por um milhão de habitantes.
Renan
Filho defende que a CPI faça esse modelo de cálculo. “Quantas vidas teriam sido
salvas se as medidas corretas de enfrentamento à pandemia fossem tomadas no
momento adequado? Essa história também precisa ser contada”, conclamou.
Ele
admite que não será possível um cálculo direto ou objetivo, “mas obviamente
dará para demonstrar que algumas regiões têm resultados melhores do que outras,
e podemos olhar o que levou a isso, podemos fazer discussão com especialistas”,
sugeriu.
Num
momento em que o Brasil ainda vivencia um platô de 3 mil mortes diárias, o
governador considerou “muito grave” a nova revisão do cronograma de imunização,
e vê um atraso intencional na busca de imunizantes.
“Nós
nos atrasamos deliberadamente na aquisição de vacinas. Em determinado momento,
o Brasil era contra a compra de vacinas, e isso se verbalizou por meio de
várias autoridades. E não temos um cronograma de vacinação, ele é alterado a
cada semana, quinzena ou mês, e é sempre para postergar, nunca para antecipar”.
Renan Filho lembra que defendeu a urgência de uma coordenação nacional de combate à pandemia, com a integração de esforços entre as três unidades da federação na reunião de governadores, ministros e chefes das Casas Legislativas no Palácio da Alvorada há um mês. “Governo federal e Congresso concordam com essa falta de coordenação, por isso criaram o comitê [nacional de combate à pandemia], mas de lá pra cá, não teve ação nenhuma”.
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