- O Globo
A decisão do Exército de não punir o
general Eduardo Pazuello é um daqueles momentos históricos em que uma
instituição comete erro que traz consequências graves. Para as Forças Armadas a
submissão à hierarquia, aos seus códigos e estatutos é a espinha dorsal da
instituição. Se um general pode desrespeitar as normas disciplinares, o capitão
também pode e, no fim, o soldado poderá. Abre-se o espaço para que outros sigam
esses passos. Esse é o caminho que eles sempre abominaram, o da anarquia
militar. O que o Exército fez agora foi dizer que aceita a pressão de
Bolsonaro, mesmo que isso signifique desrespeitar suas próprias normas, mesmo
que isso aprofunde o perigoso caminho da politização da ForçaA nota diz que
acolhe os argumentos apresentados por escrito e oralmente pelo general
Pazuello. E o que ele disse foi que aquele não era um ato político, dado que o
presidente Bolsonaro não tem partido. Ora, isso não é verdade. Aquela foi uma
manifestação política. Desde o desfile de motos pelo Rio, os gritos dos
seguidores, até os discursos no palanque. Era um ato de campanha política,
mesmo não sendo época oficial de eleições. Pazuello sabe que foi isso que
aconteceu naquele domingo. Decidiu fazer o Exército de bobo e o Comando aceitou
essa desculpa.
“O
Exército informa que o Comandante do Exército analisou e acolheu argumentos
apresentados por escrito e sustentados oralmente pelo referido oficial
general”. Ou seja, concordou com uma explicação totalmente distante da
realidade. “Desta forma, não restou caracterizada a prática de transgressão
disciplinar por parte do general Pazuello”, diz a nota.
O presidente Bolsonaro quando foi militar,
mais de três décadas atrás, feriu as regras disciplinares, foi preso e
processado pela Justiça Militar. Ele saiu do Exército exatamente por
indisciplina. Foi um “mau soldado”, como definiu o ex-presidente Ernesto Geisel.
Hoje ele é comandante em chefe das Forças Armadas, por ser o presidente, mas
isso não significa que as Forças devam aceitar que ele imponha essa mesma visão
de indisciplina às tropas.
O episódio Pazuello é uma linha divisória que o Exército não deveria cruzar. Para Bolsonaro é uma vitória. Ele quer que as instituições o sigam e que abram mão da autonomia. Bolsonaro quer acabar com a diferença entre Estado e governo, e transformar a força terrestre no que ele define como “o meu Exército”. Ao ceder à pressão, o general Paulo Sérgio Nogueira de Oliveira mostra por que foi escolhido para o lugar do general Edson Pujol. Ele aceita a pressão do Planalto.
O vice-presidente Hamilton Mourão foi
punido, em 2015, quando fez declarações políticas na época em que estava na
ativa. Ele pediu, “o despertar da luta patriótica”, durante o governo Dilma.
Perdeu o Comando Militar do Sul, não pode mais falar para as tropas e foi
transferido para a Secretaria de Economia e Finanças. Mesmo ele que viveu esse
episódio admitiu que Pazuello tinha que ser punido para “evitar que a anarquia
se instaure nos quartéis”. Foi o que ele disse logo após os eventos do Rio.
Segundo Mourão, aquela era uma manifestação “de cunho político”. E disse que o
próprio Pazuello sabia que tinha errado e havia telefonado para por seu
“pescoço no cutelo”.
O plano de Bolsonaro sempre foi cooptar as
instituições civis e militares da República para o seu projeto político. Ele
está seguindo os mesmos passos de Coronel Hugo Chavez que trocou comandos das
Forças Armadas e as submeteu ao chamado bolivarianismo. A politização das
Forças Armadas, a partidarização das polícias militares, são parte central do
projeto de Bolsonaro. O presidente conspira contra a democracia brasileira,
enfraquecendo as instituições. E essa quinta-feira foi para ele, “um grande
dia”. Para o Brasil foi o passo mais perigoso dado pelas Forças Armadas desde o
fim da ditadura militar.
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