sexta-feira, 4 de junho de 2021

Bruno Boghossian - Tropa política autorizada

- Folha de S. Paulo

Sem punição a Pazuello, militares deixam de ser instituição de Estado para servir ao presidente

O Exército não disfarça mais a decisão de servir aos propósitos políticos de Jair Bolsonaro. Com a decisão do comandante Paulo Sérgio Nogueira de Oliveira de engavetar um processo contra o general Eduardo Pazuello, sem punição, os militares reconhecem que deixaram de ser uma instituição de Estado para trabalhar a favor do presidente.

Pazuello violou uma regra básica da caserna ao participar de um ato político com Bolsonaro, há dois domingos. A infração foi tão óbvia que a falta de uma advertência ou mesmo de uma repreensão verbal pública carrega um recado evidente. Na prática, a absolvição do general autoriza os quartéis a agirem politicamente em defesa do presidente.

Bolsonaro e Pazuello fizeram uma dobradinha para afirmar que o general não violou a regra que proíbe a participação de militares de ativa em eventos político-partidários, uma vez que o presidente não é filiado a nenhum partido.

A desfaçatez mostra que Bolsonaro está convencido de que tem um Exército submisso a suas vontades. Ao aceitar a desculpa esfarrapada, Paulo Sérgio talvez quisesse evitar uma crise com o presidente, mas mostrou que ele tem razão.

Trata-se de uma vitória para Bolsonaro, que trabalhou ativamente para evitar a punição e ainda premiou Pazuello com um cargo no Planalto. Com a decisão, o presidente faz uma demonstração de força para sua base radical, sedenta por sinais golpistas, e ainda estimula outros fardados a seguirem o exemplo do general.

A aliança com Bolsonaro já rendeu aos militares cargos, prestígio e uma generosa reforma de carreiras. Em troca, o presidente explora a imagem das Forças para fabricar a ilusão de um governo eficiente, exibir poder e ameaçar opositores.

Ao acobertar a corrupção disciplinar, o comandante do Exército passa a mensagem de que militares da ativa podem se envolver na política, desde que estejam alinhados a Bolsonaro. Interessado em ter oficiais amados para escoltar seus sonhos autoritários, o presidente agradece.

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