Folha de S. Paulo
Sem apoio, impeachment reflete dependência de Bolsonaro do centrão
Em 2018, Joice Hasselmann disse que queria ser
"o Bolsonaro de saias". "A gente tem almas
parecidas", afirmou, entre o primeiro e o segundo turno daquela eleição.
Na mesma época, o ativista Kim Kataguiri declarou voto no candidato do PSL para
derrotar a "ameaça à democracia" que enxergava no PT.
A dupla se juntou a petistas, movimentos estudantis e outros oposicionistas para pedir o impeachment do presidente nesta quarta (30). Joice disse que não votaria em Bolsonaro "nem com uma arma na cabeça", e Kataguiri afirmou que era preciso derrubar "um dos presidentes mais criminosos da história".
Nenhum dos dois deputados se converteu
milagrosamente ao antibolsonarismo. Ambos, no entanto, passaram a se
desvincular do presidente nos últimos anos por razões políticas, em especial
depois dos choques entre Bolsonaro e o lavajatismo. Joice e Kataguiri são
exemplos de uma transformação na base que mantém o governo de pé.
Bolsonaro chegou ao Planalto como um
presidente que sofria humilhações
constantes em votações no Congresso. Ao fechar um acordo com o
centrão, o governo pagou um preço alto, mas conseguiu fazer sua agenda andar
com menos tropeços. O carimbo de ex-aliados no pedido de impeachment é um sinal
da dependência desse novo arranjo.
Apesar do apoio exótico, o processo tem
poucas chances de prosperar. Caciques do Congresso calculam que haveria menos
de 200 votos a favor do impeachment, quando são necessários 342. Eles dizem que
o presidente pode dormir tranquilo, uma vez que o centrão está mais interessado
em colher os benefícios dessa parceria do que em passar por uma transição de
poder.
O governo atravessa seu momento mais
delicado, mas conserva uma estabilidade singular graças aos acordos no
Congresso. As suspeitas de corrupção que surgiram até agora na compra de
vacinas devem afastar outros Joices e Kataguiris, mas não fizeram
efeito em outros círculos políticos. Bolsonaro é do centrão.
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