O Estado de S. Paulo
Não há garantia de que Bolsonaro conseguirá dobrar o valor do Bolsa Família
É blefe por enquanto a promessa do
presidente Jair Bolsonaro de elevar para R$ 400 o benefício médio do novo Bolsa
Família em ano eleitoral.
O Orçamento do governo para 2022 não tem e
nunca teve dinheiro para bancar R$ 80 bilhões, montante que seria necessário
para atender a 17 milhões de famílias com um benefício de R$ 400. São mais de
R$ 45 bilhões acima do que foi previsto este ano para o Bolsa Família,
rebatizado agora de Auxílio Brasil.
Na véspera do envio da PEC dos precatórios, o ministro da Casa Civil, Ciro Nogueira, e líderes governistas, seguindo a fala do presidente, saíram por aí vendendo a ideia de que a proposta, se aprovada rapidamente, seria a solução para garantir o benefício de R$ 400 (acima dos R$ 300 previstos inicialmente) via criação de um bônus social. Contam como certeza que nenhum parlamentar vai negar o apoio à PEC porque o benefício é para reduzir a pobreza no pós-pandemia.
A realidade é que a PEC foi para o
Congresso sem a previsão de que o fundão, que será criado para o pagamento
antecipado dos superprecatórios, esteja autorizado a pagar o bônus adicional
para o programa social.
Muitos acham que essa foi uma decisão
típica do governo Jair Bolsonaro de não assumir a manobra para depois dizer que
foi o Congresso que aprovou a medida, diante da necessidade de o governo ter de
cumprir decisão do STF, que mandou regulamentar o programa de renda básica no
País – projeto aprovado há 17 anos.
Acontece que o bônus social, mesmo que
incluído pelo Congresso, como muitos acreditam que acontecerá de fato, é puro
suco de contabilidade criativa. Uma manobra fiscal das contas públicas com
sabor eleitoral.
O que a ala política quer é usar o fundo,
que fica longe do alcance das amarras do teto de gastos, para pagar um valor
fixo aos beneficiários, desvirtuando até mesmo a lógica do “dividendo social”,
que dependeria da quantidade de dinheiro que ingressasse com privatizações e
vendas de imóveis.
Essa é a razão pela qual a criação do bônus
social junto com o fundão dos precatórios enfrenta muita resistência no
mercado, que, nas últimas duas semanas, deu o seu recado via elevação de juros
e dólar diante da maior percepção de risco. Esse cenário não era esperado pelo
governo, porque se acreditava até então que o discurso de que a PEC é melhor do
que um “fura-teto” de gastos seria comprado. Não foi.
Com a inflação descontrolada, a manutenção
dessa volatilidade por muito tempo não é bom negócio para o presidente, que
está visivelmente desconfortável com a alta de preços, a ponto de transferir a
culpa do problema para os governadores.
A tensão tende a continuar, já que o
imbróglio dos precatórios não acaba com a aprovação da PEC e muito menos a
definição do valor do Auxílio Brasil, que foi criado estrategicamente por MP
sem fixar valor algum.
Mesmo com o bônus social sendo aprovado,
colocá-lo em pé para abastecer o Auxílio Brasil em 2022 é tarefa complexa. Vai
demorar. Outra pedra no caminho dos R$ 400 de Bolsonaro é o risco certo de
judicialização da PEC no STF, que em outras ocasiões tomou decisões contrárias
sobre o tema.
Como Bolsonaro depende dessa PEC para
concretizar seu pacote econômico-eleitoral, é melhor a essa altura preparar um
plano B com muita urgência. Sem ela, o orçamento eleitoral do presidente cai
por terra, e aí a coisa se complica.
Como em outras vezes em que esteve
impossibilitado de fazer suas vontades, o presidente pode ser empurrado a
chutar de vez as regras fiscais (abertamente ou de forma camuflada) em nome da
reeleição. Ímpeto similar foi visto em eleições passadas. Seguir esse caminho
pioraria a confiança no Brasil.
Outra opção, para amenizar o desgaste com
seus eleitores, será culpar os congressistas por não ter conseguido garantir os
R$ 400. É para isso que serve a promessa.
A verdade é que não há qualquer garantia de
que Bolsonaro conseguirá dobrar o valor médio do Bolsa Família. Se considerar o
risco de o STF derrubar a PEC, nem R$ 300 estão assegurados. A pergunta é como
o presidente vai agir diante de tantos obstáculos para tirar do papel a
política que poderia amenizar o gosto amargo da queda de popularidade a pouco
mais de um ano das eleições.
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