O Globo
O governo Bolsonaro editou medida
provisória que extingue o Bolsa Família e o substitui por um novo programa
chamado Auxílio Brasil. Alardeado como um Bolsa Família melhorado, com maior
cobertura e maior valor, o programa é uma colagem de iniciativas mal desenhadas
submetidas a interesses eleitoreiros.
A primeira promessa do governo é que o
Auxílio Brasil trará uma ampliação significativa do alcance e do valor dos
pagamentos. Há uma promessa de que se incluam mais beneficiários e de que o
valor do benefício aumente 50%. A medida provisória, porém, não define qual
será o valor, nem qual será a linha de pobreza extrema que permitiria a
ampliação dos beneficiários.
No Bolsa Família, o valor do benefício era definido em lei e atualizado por meio de medidas provisórias. No Auxílio Brasil, essa definição se dará posteriormente, por ato administrativo, permitindo que flutue mais livremente de acordo com interesses políticos, aumentando em ano eleitoral e congelando ou reduzindo-se em outros anos.
A recomendação dos especialistas era
justamente o contrário: que tanto o valor como a regra de correção fossem
estabelecidos em lei para dar previsibilidade à política pública, protegendo-a
de ações eleitoreiras. Bolsonaro certamente não inventou o expediente de
aumentar benefício social às vésperas das eleições, mas não precisava ter
ampliado ainda mais as brechas para o oportunismo.
O aumento de 50% que o governo propagandeia
como expansão muito expressiva não leva em conta as perdas inflacionárias que
vêm se acumulando desde 2014. Se o benefício médio saltar para R$ 285, como se
espera, o aumento real, descontada a inflação desde 2014, será de apenas 14% —a
maior parte do aumento é apenas recomposição do valor do Bolsa Família dos anos
Dilma.
Além dos três benefícios básicos que mais
ou menos substituem os mecanismos do Bolsa Família, o Auxílio Brasil inclui
benefícios provavelmente inexpressivos ou inúteis para crianças em extrema
pobreza que se destaquem no esporte ou em ciências, um auxílio rural em troca
da doação de alimentos, um auxílio urbano para trabalhadores formais, um
programa de crédito consignado para quem recebe o auxílio e um programa de
vouchers para creches. A simplicidade, a clareza e o foco que eram as marcas do
Bolsa Família serão substituídos por uma sucessão de ações pulverizadas,
confusas e de eficácia duvidosa.
Particularmente preocupante é o Auxílio
Criança Cidadã, que oferece vouchers (espécie de vale ou cupom) para o
pagamento de mensalidades de creches privadas para famílias com crianças até 2
anos. A criação desse auxílio é acompanhada da revogação do sistema de repasses
às prefeituras para criar vagas em creches municipais destinadas a quem recebe
o Bolsa Família.
A substituição do financiamento de creches
municipais por vouchers para a contratação de creches privadas é uma das
obsessões ideológicas de Paulo Guedes. A experiência internacional, porém,
mostra que o modelo gera creches de baixa qualidade que consolidam
desigualdades educacionais entre ricos e pobres.
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