O Estado de S. Paulo
Planalto vê 7 de Setembro como divisor de
águas; governadores temem armas e invasões.
Há mais entre o céu e a terra do que a vã
filosofia, os aviões de carreira e a fumaça dos tanques militares que
desfilaram na Praça dos Três Poderes no dia nervoso da votação da cédula de
papel no Congresso. O clima é de tensão e preocupação, depois de o presidente
Jair Bolsonaro pedir o impeachment do ministro do STF Alexandre de Moraes e
resolver se apoderar do nosso 7 de Setembro para transformá-lo num divisor de
águas a seu favor.
Bolsonaro passou anos construindo ligações
com a milícia. Ao assumir a Presidência, liberou geral as armas para a
população civil para deixar as tropas bolsonaristas de prontidão. Depois, minou
o comando dos governadores sobre as polícias estaduais, enquanto metia a mão na
Polícia Federal. Por fim, rachou as Forças Armadas, ao intervir no Ministério
da Defesa e nos comandos de Marinha, Exército e Aeronáutica.
Resultado: o Brasil está como o diabo gosta. Roberto Jefferson, Sérgio Reis, Ottoni de Paula, Daniel Silveira, oficiais baderneiros da PM de São Paulo e adoradores de armas em geral conclamam as tropas para as ruas. Dane-se a Pátria! Dane-se a Nação! O objetivo confesso é endeusar o mito e atiçar a invasão do Supremo e do Congresso, ameaçando ministros e parlamentares.
“É fogo de palha, preocupação zero”,
declarou o vice Hamilton Mourão, tentando tranquilizar o País, mas está
difícil. Basta um punhado de malucos, ou de infiltrados, para transformar esse
fogo de palha num incêndio de grandes proporções. Quem vai impedir? E, depois,
quem vai apagá-lo?
O Brasil está feroz e doentiamente
dividido, mas há um desequilíbrio de forças. A minoria ameaça com revólveres,
fuzis, invasões e agressões. A maioria, desarmada, defende-se com declarações e
manifestos do STF, Senado, ex-presidentes, ex-ministros, lideranças políticas,
econômicas, financeiras, profissionais e religiosas.
No Planalto, o 7 de Setembro é visto como
um “divisor de águas”, com expectativa de recorde de bolsonaristas nas ruas,
mas sem risco de ataques a tiros contra instituições e seus representantes.
“Isso, não”, diz um ministro. Fora do Planalto, inclusive nos governos
estaduais, não há essa certeza e João Doria (SP) alerta para “militantes
bolsonaristas armados”. O sinal amarelo piscou quando dois coronéis da PM
paulista, um da ativa, outro da reserva, subverteram a ordem: convocaram a
turba que a PM, depois, terá, ou teria, de controlar.
Na visão da oposição, a crise começa com o
presidente, que ataca, atiça, ameaça agir fora da Constituição e contra as
eleições e não para de fustigar Judiciário, governadores e mídia. Logo, o
Supremo apenas reage em defesa da democracia, das instituições e do equilíbrio
da Federação, ao atender ora à PF, ora à Procuradoria-geral da República, e
determinar a prisão ou busca e apreensão daqueles que acatam a orientação de
cima e atemorizam instituições e pessoas.
Já a versão do Planalto, encampada sem
restrições pelo núcleo bolsonarista, é oposta: o Supremo e particularmente
Alexandre de Moraes é que provocam, esticam a corda e ameaçam Bolsonaro, ao,
por exemplo, mandarem para a prisão os aliados Roberto Jefferson,
trabalhista-integralista, e Daniel Silveira, um valentão. Assim, Bolsonaro
apenas reagiria aos ataques. O pedido de impeachment de Moraes foi “para
incomodar”. O 7 de Setembro é para “mostrar força”.
Nesse clima, 25 dos 27 governadores se
reuniram ontem e estão dispostos a patrocinar uma reunião entre os poderes,
para baixar a tensão e as labaredas. Até porque, enquanto Bolsonaro brinca
perigosamente de guerra, armas e xingamentos, a economia recua, a pandemia é
incerta e quem sofre? A população. Crises são sempre desastrosas, mas crises
artificiais e ameaças de golpe são ainda piores: demolidoras.
Nenhum comentário:
Postar um comentário