Por Isadora Perón e Luísa Martins /
Valor Econômico
BRASÍLIA - Após os reiterados ataques do presidente Jair Bolsonaro contra o sistema eleitoral eletrônico, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) reagiu ontem e abriu um inquérito para investigá-lo. A corte eleitoral também encaminhou uma notícia-crime ao Supremo Tribunal Federal (STF) para que o presidente seja investigado no inquérito das “fake news” após a live da última quinta-feira, quando propagou mentiras e ilações sobre as urnas eletrônicas.
As duas medidas foram aprovadas por
unanimidade pelos ministros do TSE, após o presidente da corte, Luís Roberto
Barroso, fazer um duro discurso em resposta a Bolsonaro - que tem feito ataques
pessoais ao ministro nas últimas semanas.
No STF, caberá ao ministro Alexandre de
Moraes decidir se inclui Bolsonaro como alvo da apuração sobre “fake news”.
Moraes, que também faz parte do TSE, vai presidir a corte eleitoral durante as
eleições de 2022.
Já o inquérito administrativo aberto no TSE
terá como objetivo apurar “abuso do poder econômico e político, uso indevido
dos meios de comunicação social, corrupção, fraude, condutas vedadas a agentes
públicos e propaganda extemporânea, relativamente aos ataques contra o sistema
eletrônico de votação e à legitimidade das eleições 2022”.
A medida foi tomada a pedido do
corregedor-geral da Justiça Eleitoral, ministro Luis Felipe Salomão
“considerando os relatos e declarações, sem comprovação, de fraudes no sistema
eletrônico de votação, com potenciais ataques à democracia e à legitimidade das
eleições”.
O prazo para Bolsonaro apresentar provas
sobre suas alegações de fraudes terminava esta semana. Na live que fez na última
quinta-feira, porém, o próprio presidente admitiu que não tinha como comprovar
as suas suspeitas e chamou de “indícios” vídeos com “fake news” divulgados na
internet.
Ao iniciar a sessão - a primeira depois do
recesso do Judiciário - Barroso rebateu os ataques do presidente. “A ameaça à
realização de eleições é uma conduta antidemocrática. Suprimir direitos
fundamentais, incluindo os de natureza ambiental, é uma conduta
antidemocrática. Conspurcar o debate público com desinformação, mentiras, ódio
e teorias conspiratórias é conduta antidemocrática.”
Barroso também fez um alerta: “Há coisas
erradas acontecendo no país e nós todos precisamos estar atentos, precisamos
das instituições e da sociedade civil, ambas bem alertas”.
Segundo ele, “nós já superamos os ciclos do
atraso institucional, mas há retardatários que gostariam de voltar ao passado”.
Para o ministro, “parte dessas estratégias inclui o ataque às instituições.”
Citando o que aconteceu nos Estados Unidos,
após a eleição de Joe Biden, Barroso disse que o “voto impresso não é contenção
adequada para o golpismo”, já que na maior parte do país não se adota a urna
eletrônica.
Barroso também afirmou que o TSE tem
adotado a postura de responder todas as informações falsas divulgadas em
relação ao sistema de votação, e que esse trabalho é feito por servidores e
agências de checagem, “gente que se esforça para não nos convertermos no país
da mentira”.
“Aos que querem se acorrentar à crença de
que uma mentira repetida muitas vezes se torna verdade, só podemos esperar que
sejam iluminados algum dia pelo bem”. Na última quinta-feira, o tribunal
rebateu em tempo real as afirmações de Bolsonaro durante a live.
O presidente do TSE também disse que
escolheu responder com “indiferença” aos ataques pessoais que sofreu.
“Se eu parar para bater boca, eu me igualo
a tudo que quero transformar. Ódio, mentira, agressividade, grosseria, ameaças,
insultos, são derrotas do espírito. O universo me deu a bênção de não cultivar
esse sentimentos”, disse Barroso.
Ontem, o dia começou com uma nota de todos os ex-presidentes do TSE em defesa do sistema de eleitoral. O texto também foi assinado por Barroso e pelos ministros que vão ocupar o cargo em 2022: Edson Fachin e Moraes.
O grupo apontou que, desde 1996, quando a
urna eletrônica começou a ser usada, jamais se documentou qualquer episódio de
fraude. “Nesse período, o TSE já foi presidido por 15 ministros do Supremo
Tribunal Federal.”
Eles também se posicionaram contra a
aprovação do voto impresso e a contagem pública manual de votos, que seria uma
volta a um “cenário das fraudes generalizadas”.
Único ministro do STF a não assinar a nota,
Nunes Marques, que foi indicado por Bolsonaro, disse que não foi consultado
sobre o posicionamento. Por ser novo na Corte, ele ainda não fez parte da
composição do TSE. Em nota, porém, ele não se posicionou contra o que chamou de
“voto impresso auditável”, disse apenas que essa é uma decisão que cabe ao
Congresso.
Nenhum comentário:
Postar um comentário