Tribunal pede ainda inclusão de presidente em inquérito das fake news do STF
Weslley Galzo, Vinícius Valfré / O Estado de S. Paulo
BRASÍLIA - Por unanimidade, o Tribunal
Superior Eleitoral (TSE) aprovou ontem à noite duas medidas contra o presidente
Jair Bolsonaro em razão de suas acusações infundadas de fraude no sistema
eleitoral e de ameaças à votação de 2022. Foi determinada a abertura de um
inquérito administrativo e pedida a inclusão de Bolsonaro em outra
investigação, das fake news, que tramita no Supremo Tribunal Federal (STF). O
desfecho dos inquéritos poderia acarretar impugnação do registro da candidatura
de Bolsonaro à reeleição ou até mesmo determinar sua inelegibilidade. Ao
aprovar o envio de notícia-crime para que Bolsonaro seja incluído como
investigado no inquérito das fake news, cujo relator é o ministro Alexandre de
Moraes, os magistrados fecham o cerco contra o Palácio do Planalto. Moraes
poderá decidir sozinho se acata o pedido ou se leva para julgamento no plenário
do STF. Sem citar Bolsonaro, o ministro Luis Roberto Barroso, presidente do
TSE, disse que o Brasil está à beira da “erosão da democracia”.
O Tribunal Superior Eleitoral (TSE) aprovou
na noite de ontem, por unanimidade, duas medidas contra o presidente Jair
Bolsonaro por declarações infundadas de fraude no sistema eletrônico de votação
e ameaças às eleições de 2022. Os ministros decidiram abrir um inquérito
administrativo e, ainda, pedir a inclusão de Bolsonaro em outra investigação, a
das fake news, que tramita no Supremo Tribunal Federal (STF). O desfecho dessas
apurações pode atrapalhar os planos de Bolsonaro, levando à impugnação de
eventual registro de candidatura à reeleição ou até mesmo inelegibilidade.
A decisão do TSE representa até agora o mais duro movimento do Judiciário na tentativa de conter ameaças do presidente, que tem condicionado a realização das eleições à aprovação do voto impresso, hoje em tramitação na Câmara. O inquérito administrativo, proposto pela Corregedoria-geral da Justiça Eleitoral, vai apurar se, ao promover uma série de ataques sem provas às urnas eletrônicas, Bolsonaro praticou “abuso do poder econômico e político, uso indevido dos meios de comunicação, corrupção, fraude, condutas vedadas a agentes públicos e propaganda extemporânea”.
Na última quinta-feira, o presidente usou
uma transmissão ao vivo pelas redes sociais e a estrutura do Palácio da
Alvorada para exibir uma série de vídeos antigos e informações falsas contra as
urnas eletrônicas, alegando que o sistema é fraudável. Na live, também
divulgada pela TV Brasil, uma emissora pública, Bolsonaro admitiu, porém, não
ter provas das fraudes.
Ao aprovar o envio de notícia-crime ao
Supremo para que Bolsonaro seja incluído como investigado no inquérito das fake
news, que tem como relator o ministro Alexandre de Moraes e já relaciona
aliados do governo a ações para desacreditar instituições, os magistrados
fecharam o cerco contra o Palácio do Planalto.
O presidente do TSE, Luís Roberto Barroso,
disse que o Brasil está à beira da “erosão da democracia” e reagiu com
veemência aos ataques de Bolsonaro. “Há coisas erradas acontecendo no País e
nós todos precisamos estar atentos. Precisamos das instituições e da sociedade
civil alertas”, afirmou Barroso na primeira sessão do tribunal após o recesso
do Judiciário. “Nós já superamos os ciclos de atraso institucional, mas há
retardatários que querem voltar ao passado.”
Sem citar Bolsonaro, o ministro destacou
que “voto impresso não é contenção adequada para o golpismo” e em várias
ocasiões mencionou o perigo de líderes autoritários, extremistas e populistas,
sob o argumento de que, embora eleitos pelo povo, eles desconstroem pilares da
democracia, procurando “demonizar” a imprensa e “colonizar” os tribunais
constitucionais.
“A ameaça à realização de eleições é uma
conduta antidemocrática. Suprimir direitos fundamentais, incluindo os de
natureza ambiental, é uma conduta antidemocrática. Conspurcar o debate público
com desinformação, mentiras, ódio e teorias conspiratórias é conduta antidemocrática”,
insistiu Barroso, que lembrou a tentativa de invasão do Capitólio, em janeiro,
nos Estados Unidos, quando o então presidente Donald Trump perdeu as eleições.
Para o presidente do TSE, o voto impresso “é a porta aberta” para a ocorrência
de fraudes, o incentivo ao coronelismo e às milícias. ‘Harmonia’. Foi um dia
marcado por reveses para o Planalto. Na primeira sessão deste segundo semestre,
o presidente do Supremo, Luiz Fux, também reagiu aos ataques desferidos por
Bolsonaro e disse que “os juízes precisam vislumbrar o momento adequado para
erguer a voz diante de eventuais ameaças”.
Assim como Barroso, Fux não citou o nome
Bolsonaro, mas o recado foi claro quando cobrou respeito às instituições e
afirmou que a manutenção da democracia exige permanente vigilância. “Harmonia e
independência entre os poderes não implicam impunidade de atos que exorbitem o
necessário respeito às instituições”, disse ele.
A intervenção dos dois magistrados ocorre
em momento de crise institucional entre os poderes, após acusações de Bolsonaro
contra a urna eletrônica e sucessivas ameaças às eleições. Para responder aos
ataques da cúpula do governo, Barroso também divulgou ontem nota assinada por
ele ao lado de 15 ex-presidentes do TSE e ministros do Supremo, em defesa do
atual sistema de votação. O documento contou, ainda, com a assinatura do
vice-presidente do TSE, Edson Fachin, e do ministro Alexandre de Moraes, que
presidirá o tribunal durante as eleições de 2022.
As mensagem de Fux e Barroso não deixaram
dúvidas sobre os destinatários, incluindo no rol os comandantes das Forças
Armadas. O Estadão revelou que no último dia 8 o presidente da Câmara, Arthur
Lira (Progressistas-al), recebeu recado do ministro da Defesa, Walter Braga
Netto, por meio de um interlocutor político. Na ocasião, o general pediu para
comunicar, a quem interessasse, que não haveria eleições em 2022 sem aprovação
do voto impresso. Lira procurou Bolsonaro e disse a ele que não contasse com a
Câmara para ruptura institucional.
Pouco depois do discurso do presidente do
Supremo, Bolsonaro deu uma resposta. “Queremos uma farsa no ano que vem ou uma
eleição marcada por suspeição?”, perguntou ele, em cerimônia no Ministério da
Cidadania. “Chefe de Poder tem limite. Não é ‘o que eu quero, pode confiar’. É
o povo que tem de confiar”, protestou.
Bolsonaro reclamou que “não se pode falar a
verdade”, sob pena de sofrer até processo de impeachment, no seu caso. “Se nos
calarmos, nos curvarmos ao politicamente correto para atender às velhas
práticas, (...) nós todos sucumbiremos”, disse. Para o presidente, aliança com
Centrão não se enquadra nessas práticas criticadas por ele.
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