Folha de S. Paulo
Sua atitude covarde de culpar terceiros não
combina com o ideal de virilidade
O assunto é delicado, mas não vejo como
possamos furtar-nos a ele. A pergunta se impõe: Bolsonaro é macho? E vão se
acumulando indícios de que não é. Antes de prosseguir, gostaria de dizer que,
pessoalmente, não penso que a virilidade seja uma característica desejável na
política. Pelo contrário, creio que ganharíamos se as decisões que mais afetam
a sociedade fossem tomadas com base não em testosterona, mas em ponderações
racionais.
O presidente, porém, parece ter uma visão diferente da minha. Ele já deu várias declarações sugestivas de que erige confusas idealizações em torno da hombridade em ponto central tanto para sua ética pessoal como para a própria autoimagem. Para não nos alongarmos muito, lembro apenas que Bolsonaro já disse preferir ver um filho seu morrer a aparecer "com um bigodudo por aí" e que qualificou como "fraquejada" o fato de ter gerado uma filha em seu último ciclo reprodutivo.
Se essa é a "Weltanschauung"
bolsonarista, como conciliar o culto à varonilidade com o humilhante
recuo que o presidente exibiu diante de todos na semana passada?
Alguém consegue imaginar um líder indubitavelmente macho como Putin ou Orbán
fazendo um discurso em que traça uma série de linhas vermelhas e renegar tudo
no dia seguinte? O pior é que o incidente da Semana da Pátria não é o único que
coloca em dúvida a masculinidade presidencial. Bolsonaro também já se adamou em
sua posição sobre a Amazônia ao falar na última Cúpula do Clima. Se me é lícito
tirar conclusões, eu diria que ele sempre tenta culpar terceiros por seus
próprios equívocos, atitude que a maioria classificaria como covarde, o que não
combina com nenhum ideal de virilidade.
A apostasia presidencial da semana passada,
porém, foi tão escancarada que bolsonaristas já devem estar se perguntando se o
mito não tomou secretamente a vacina da Pfizer. Seria uma explicação para estar
falando tão fino.
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