segunda-feira, 4 de outubro de 2021

Mirtes Cordeiro* - Os idosos dos tempos de agora

Falou e Disse

Cada vez fica mais distante a ideia das pessoas idosas em casa, sentadas em suas cadeiras à espera de ajuda dos familiares, ou acomodadas com os problemas impostos pela vida.

O mês de outubro teve início com a comemoração pelo Dia Internacional da Pessoa Idosa. A data foi instituída pela Organização das Nações Unidas (ONU), em 1991, e serve como um alerta para a sociedade civil sobre a necessidade de proteção e de cuidados com os idosos.

De repente, me descobri uma pessoa idosa. Aconteceu quando decidi parar de trabalhar, após viver e trabalhar durante 72 anos.

A vida é assim; a gente nasce, cresce, passa por vários momentos carregados de felicidade, amor, afeto, desilusão, angústia, satisfação e segue em busca de algo a cada dia, sempre o que consideramos melhor e possível para nós e para o outro. Sim, porque no trajeto a gente vai agregando maridos ou companheiros, filhos, amigos, os amigos dos amigos, a vizinhança, os gatos e os cachorros… tive vários.

No entanto, é o trabalho que marca a vida desde cedo. Primeiro pela necessidade de sobrevivência, mas também porque o trabalho exerce um papel fundamental na vida do ser humano na relação com a natureza e através das relações, nós, homens e mulheres, transformando as nossas vidas e nossas consciências pelo exercício da criatividade, da inteligência, em magia da utopia, o “lugar” ideal que não é o agora, na concepção grega da palavra.

Então, cá estou eu agora aos 76 anos, idosa, no dizer de todos, das estatísticas, dos censos que produzem os dados que deveriam ser utilizados para planejar e executar políticas públicas.

Embora pareça que nada muda, muita coisa acontece. O organismo começa a se queixar do tempo de funcionamento. Aí muda o equilíbrio, doem as articulações, falta nitidez à visão, o tesão enfraquece, numa forte indicação de que é preciso suprir algumas necessidades orgânicas.

No entanto, com o avanço das tecnologias, da ciência, da medicina, o mundo tem se dado conta de que mudou significativamente a expectativa de vida da população.

Um estudo do Departamento Intersindical de Estatísticas e Estudos Socioeconômicos (Dieese) mostrou que quase um quinto da população brasileira é composta por pessoas com 60 anos ou mais. (Pesquisa de 02/2021).

Dos cerca de 210 milhões de habitantes do país, 37,7 milhões de brasileiros possuem 60 anos ou mais. Desses, no levantamento nacional, 18,5% trabalham; 85% moram com outras pessoas; 21% moram com estudantes; 75% contribuem com pelo menos metade da renda familiar; 26% estão em domicílios que receberam auxílio emergencial; 32% têm plano de saúde; 58% apresentam comorbidades; e 2,5% testaram positivo para a Covid-19.

Interessante destacar que dos que trabalham, uma parte o faz porque ainda se sente responsável pela manutenção da família, sobretudo morando com filhos desempregados ou com baixos salários, e netos. Mas também é comum o exercício do trabalho, por aquelas que se sentem pessoas produtivas, com boa saúde e aptas ao desenvolvimento das suas criatividades, sobretudo quando a atividade laboral pode ser exercida com flexibilidade e sem a preocupação da sobrevivência básica.

Com o índice de desemprego alto, em 14 milhões, é quase impossível que idosos ocupem postos de trabalho, mesmo estando aptos e manifestando interesse.

Em 2011, a expectativa de vida do brasileiro era de 74,1 anos, índice que vinha se mantendo em crescimento até 2019, chegando a 76,6 anos sendo, 73,1 entre os homens e 80,1 anos entre as mulheres.

Atualmente, com a pandemia registrando quase 600 mil mortos, houve uma regressão no geral: o brasileiro perdeu quase dois anos de vida. “A expectativa de vida dos brasileiros caiu 1,8 ano em 2021”. (Registro da pesquisa realizada pela pesquisadora Maria Castro DPSG/Harvard).

Embora seja o Nordeste uma região com profundas desigualdades, não sofreu grande impacto com a redução da expectativa de vida. Os pesquisadores creditam a isso ao fato de que no Nordeste, os estados tomaram medidas, contra a pandemia em concordância com as orientações científicas.

“As medidas que foram tomadas contra a pandemia, quando você compara as duas regiões, são completamente diferentes. Na região Nordeste você verifica medidas que iam completamente contra o que o presidente queria que fosse feito”, diz Castro.

Cada vez fica mais distante a ideia das pessoas idosas em casa, sentadas em suas cadeiras à espera de ajuda dos familiares, ou acomodadas com os problemas impostos pela vida.

Vem surgindo uma nova “categoria” de pessoas denominadas idosas pelos anos de vida, mas cada vez mais cuidando da saúde, fazendo exercícios, compartilhando amizades, afetos e amores novos. Muitos, se têm possibilidades, voltam ao mercado de trabalho e se aventuram nas linguagens digitais.

No Brasil, devemos creditar a orientação para saúde ao programa de saúde da família implantado pelo Sistema Único de Saúde (SUS), pelo Brasil inteiro, com suas equipes multidisciplinares orientadas para os cuidados com a prevenção e o controle de comorbidades como diabetes, hipertensão arterial, obesidade mórbida e outas doenças que acometiam os idosos com muita frequência.

Com os direitos garantidos pela Constituição e pelo Estatuto do Idoso, as pessoas com mais de 60 anos ganharam em qualidade de vida. No entanto, é preciso observar situações de pessoas idosas que ainda são exploradas pelas famílias ou por situações de abrigamento precário em que se encontram.

As pessoas com mais de 60 anos representam o segmento de consumo que mais cresce, ganhando mais importância na economia. No Brasil, 10,8 milhões de pessoas dependem da renda de aposentados para viver, segundo levantamento realizado pela LCA Consultores e publicado pelo jornal O Estado de São Paulo.

Geralmente temos medo do envelhecimento, natural, numa sociedade que cultua o que é belo sempre relacionado à juventude. O medo se expressa na insegurança financeira, no distanciamento da família, na má qualidade de vida. Enquanto isso, as coisas boas do envelhecimento chegam através da segurança na tomada de decisões, na experiência acumulada, com a saúde boa com independência e maior controle nas emoções. Foi o que revelou uma pesquisa da farmacêutica Pfizer, realizada com mais de mil pessoas entre homens e mulheres.

“Entre os achados, foi encontrado que uma boa parte dos brasileiros (43%) acreditam que estão envelhecendo exatamente da maneira esperada. Apenas 17% dos brasileiros acreditam que a experiência é pior do que imaginavam e para 28% o processo de envelhecer está superando as expectativas”. (Manuela Pagan)

Sobre a renda, a FGV indica que os idosos correspondem a 17,44% dos 5% dos brasileiros mais ricos e 1,67% dos 5% mais pobres. Quanto à fonte de renda, os idosos recebem 59,64% das aposentadorias da Previdência Social, 40,78% dos benefícios de Prestação Continuada (BPC-um salário mínimo)) e apenas 0,89% do Bolsa Família. (Agencia Brasil).

Quanto a escolaridade, os idosos constituem 30% dos analfabetos brasileiros.

Bom mesmo é seguir vivendo bem, aproveitando bem o tempo do envelhecimento. No entanto, é preciso que as políticas públicas incorporem a ideia de que o Brasil registra o crescimento da população idosa de forma acelerada, devendo chegar a 25,5%, até o ano de 2060, quando a população idosa será de 58 milhões, segundo o IPEA.

É necessário cuidar dos jovens agora para se ter uma velhice com melhor qualidade de vida no futuro próximo.

*Mirtes Cordeiro é pedagoga. 

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