Valor Econômico
‘O tempo para ficar mal com o presidente é
ali na beirada da eleição’
A perda de apoio de Jair Bolsonaro em sua
base de simpatizantes tem sido demonstrada em estudos sobre engajamento nas
redes sociais e pesquisas de avaliação de governo. A queda ocorre em proporção
menor quando o assunto é a intenção de voto para 2022, embora isso não seja
garantia de que o presidente chegará a um eventual segundo turno.
Tanto no nível dos eleitores quanto no da
classe política, há crescente potencial para um “estouro da boiada” que pode
inviabilizar o mínimo de competitividade para a reeleição. A rápida
deterioração da economia, aliada à crise de personalidade pela vinculação
explícita ao Centrão, seriam erros insustentáveis até para empedernidos
bolsonaristas.
Está aí a chance de uma terceira via, que busca encontrar espaço antes que Lula avance a ponto de ganhar a disputa no primeiro turno, como começam a indicar alguns institutos. Há muito chão pela frente, mas em nenhum horizonte a vida de Bolsonaro parece fácil para manter a cadeira no Planalto.
Parte relevante de seu eleitorado em 2018
se arrependeu e debandou para a oposição, enquanto outra já não o defende com
tanta força. Nota-se, nas últimas semanas, a curiosa espiral de silêncio em se
tratando de uma corrente política tão ruidosa e afeita ao fanatismo. Toda a
energia envolvida na mobilização dos atos antidemocráticos de 7 de setembro
aparentemente se dissipou.
Com o desfecho sem golpe e sem voto
impresso, Bolsonaro ficou desprovido de cartadas, exceto as tradicionais do
presidencialismo de coalizão, como a distribuição de cargos e de emendas
parlamentares. Voltou ao ninho do Centrão, onde era um mero integrante do baixo
clero, para decepção dos apoiadores que pregavam uma revolução. O pragmatismo
solapa o bolsonarismo, que depende da ideologia histérica, violenta,
anticientífica, não iluminista, para sobreviver.
O casamento com o PL e as demais legendas
do bloco fisiológico, como PP e Republicanos, serve menos ao interesse de
Bolsonaro - que poderia ir para qualquer sigla, vide as negociações anteriores
com o nanico Patriota - do que a esses partidos. Governistas por natureza,
extraem o que podem do corpo de um Executivo que sabem enfraquecido, incapaz de
apresentar realização em três anos de administração.
Sem vocação para a gestão, Bolsonaro
apostou no discurso da destruição e empurrou militantes para uma campanha
permanente contra as instituições. Resta saber se haverá fôlego para a sua
própria reconstrução eleitoral. Além do revés em pesquisas, a expectativa de
desidratação, com defecções na base, já se mostra uma realidade diante da
dificuldade de atrair apoios de governadores, prefeitos e parlamentares.
Aliados em Brasília declaram que a adesão a
Bolsonaro não viajará do Congresso para os palanques de seus redutos
eleitorais. O pagamento do governo em verbas e cargos encomenda apenas a
entrega de votos no plenário. O pacote não inclui o preço de fazer campanha
para um presidente cuja rejeição bate nos 69%, segundo o último levantamento
Genial/Quaest.
A debandada, informa o prefeito de um
grande município, filiado a uma sigla do Centrão, não pode ser agora, para que
não haja retaliação do governo federal. Mas já está contratada. “Não quero
ficar mal com o Bolsonaro antes do tempo. O tempo para ficar mal com ele é ali
na beirada da eleição. Porque não tem condição de votar em Bolsonaro”, afirma o
político, para quem “o Brasil não aguenta mais sofrer”.
“Isso é uma loucura muito grande o que a
gente está vivendo. Tenho vergonha do que aconteceu na reunião do clima [COP26]
e no G20. Foi patético. Não sou PT, mas Lula dava show, Obama dizia ‘Esse é o
cara’. [Bolsonaro] é tudo de ruim, O Brasil entrou numa fase horrorosa, com
inflação, economia que não vai para frente...”, critica o prefeito, que prefere
não se identificar.
No Rio, prefeituras da Região Metropolitana
têm sido irrigadas com recursos federais, como São Gonçalo, que apareceu na
liderança de municípios do país que mais receberam dinheiro de emendas
parlamentares do orçamento secreto, nos últimos meses. A cidade é comandada
pelo policial militar reformado Capitão Nelson (PL), um bolsonarista que
surpreendeu na eleição do ano passado ao vencer o petista Dimas Gadelha por
50,8% contra 49,2%, com diferença de 6 mil votos.
Apesar de acordos locais entre Bolsonaro e
prefeitos da populosa Baixada Fluminense, a previsão é de uma disputa pelos
cabos eleitorais entre o presidente e o seu maior adversário. “O pau vai
quebrar”, reconhece o prefeito Waguinho, de Belford Roxo, à frente do futuro
diretório do União Brasil, com a fusão em curso entre o PSL e o DEM.
Waguinho se diz bolsonarista e conta ter
sido convidado para ser vice na chapa à reeleição do governador Claudio Castro
(PL). Mas admite que o palanque estadual de Bolsonaro no Estado pode ser alvo
de traições com o crescimento de um movimento Lula-Castro entre prefeitos,
vereadores e deputados.
A filiação de Bolsonaro ao PL de Castro
engessa o governador, que ficará obrigado a fazer campanha para o presidente,
mas não segura o apoio daqueles que pretendem se vincular a Lula ou mesmo a uma
candidatura da terceira via, como a do ex-juiz Sergio Moro (Podemos) ou de quem
vencer as prévias do PSDB, se o governador de São Paulo, João Doria, ou o do
Rio Grande do Sul, Eduardo Leite.
No terceiro maior colégio eleitoral do
país, o objetivo do PT é isolar ao máximo o bolsonarismo. Para isso, abre mão
de lançar um nome a governador, vice ou mesmo ao Senado, onde por enquanto a
prioridade do partido é com a pré-candidatura do presidente da Assembleia
Legislativa, André Ceciliano, também negociável. Tudo para atrair aliados e
tirar votos de Bolsonaro.
As pontes com o governador já existem. Fiador da governabilidade de Castro, Ceciliano tem importantes espaços na administração estadual, como a pasta de Infraestrutura, compartilhada com o secretário Max Lemos (PSDB), cujo partido também está na corrida presidencial. É uma colcha de retalhos que mostra como é frágil o palanque de Bolsonaro, mesmo no único Estado onde o PL tem um governador.
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