Valor Econômico
Eleição deve reverter onda oposicionista
nos Estados
Os governos estaduais estão nadando em
dinheiro. A constatação tem sido feita por diversos economistas, inclusive pelo
gaúcho Darcy Francisco Carvalho dos Santos, em um artigo que usa a frase
inicial desta coluna como título. É uma excelente notícia para os governadores
que tentam a reeleição ou para seus apoiados. Poderá representar a reversão de
uma tendência que vem se manifestando desde 2006: a de troca de mando nas
oligarquias regionais.
Há 16 anos, 18 dos 27 vencedores das
eleições estaduais eram da situação local. Esse número caiu para 17 em 2010, 14
em 2014 e apenas 12 em 2018, no que foi a primeira vez desde 1994 em que a
oposição regional prevaleceu. É claro que cada uma das 27 sucessões estaduais
tem a sua própria trama, mas vento de cauda diminui o risco das turbulências.
No que depender de caixa para a máquina, as condições estão dadas para se virar
essa curva.
Segundo Darcy Francisco, os Estados tiveram somados um déficit de R$ 167,9 milhões em 2019, último ano pré-pandemia e primeiro da gestão dos atuais mandatários. Em 2021, até o fim do quinto bimestre, tinham um superávit de R$ 124,6 bilhões. Em termos proporcionais, a situação mais folgada é a do Amapá (33% sobre a despesa). Em termos absolutos, a de São Paulo, com R$ 29,6 bilhões.
Parte dessa situação folgada deve-se a
governadores que fizeram um ajuste da máquina, como os tucanos João Doria, em
São Paulo, que liquidou várias estatais, Eduardo Leite, no Rio Grande do Sul,
que vendeu a CEEE, e Cláudio Castro (PL), no Rio de Janeiro, que colherá os
louros pela venda da Cedae.
Em Minas Gerais, em um caso único, Romeu
Zema (Novo) terá um manancial de recursos a administrar depois do acordo de compensação
da Vale pelo desastre de Mariana em 2015.
Mas o que verdadeiramente explica essa
guinada não são particularidades locais, e nem ajustes feitos pelos
governadores. As reformas econômicas, sabe-se, surtem efeito a longo prazo.
Houve uma importante transferência federal para as ações de enfrentamento da
pandemia, reguladas pela lei complementar 173 de 2020. Foram R$ 60 bilhões em
quatro parcelas, além da dispensa de pagar a dívida com a União. A lei proibiu
ainda aumento para pessoal por um bom período de tempo.
Neste ano, o que pesou a favor foi o nível
de arrecadação, que subiu muito, sobretudo em termos nominais, como ressalta o
economista Guilherme Tinoco, assessor especial da Secretaria da Fazenda em São
Paulo. “Houve crescimento pelo aumento da atividade e pela inflação. Por outro
lado, a despesa foi contida pela aplicação da lei complementar, que impede
reajustes”, comentou.
A importância da inflação não pode ser
diminuída para a construção desse resultado. “Em termos nominais, o PIB cresceu
14,6% este ano, e este PIB nominal é o que afeta a arrecadação. E não houve
reajuste. Ou seja, a inflação aumentou a receita nominalmente e baixou a
despesa em termos reais”, afirmou Darcy Francisco.
No caso de São Paulo, os dados de
arrecadação tributária demonstram isso. Em termos nominais, o Estado arrecadou
R$ 177,2 bilhões até outubro desse ano, segundo dados disponíveis no portal da
Secretaria da Fazenda. Nos doze meses de 2019, período pré-pandemia, o fisco
somou R$ 173,5 bilhões.
A soma de todos estes fatores explica
fenômenos como o anúncio de um investimento estadual de R$ 50 bilhões em dois
anos, feito por Doria no fim de setembro. Mesmo governos que estavam com a
corda no pescoço, como Minas Gerais, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul ou
Alagoas, conseguiram colocar o pagamento de servidores e fornecedores em dia.
O contraste com o governo federal é
evidente. A arrecadação tributária também subiu no nível federal, e o governo
Bolsonaro também não concedeu aumentos ao funcionalismo, à parte exceções como
a do vencimento dos militares. Tinoco lembra que a projeção de déficit federal
no início do ano era de R$ 250 bilhões. Hoje fala-se em R$ 95,8 bilhões. O teto
de gastos, mesmo combalido, freia contudo o avanço sobre o caixa. “Antes ganhos
de arrecadação viravam despesa, agora não. O teto de gastos de alguma forma
segura isso”, comenta Tinoco.
Mesmo todo o espaço que está sendo criado
para o governo Bolsonaro na PEC dos Precatórios, não equivale ao que o Palácio
do Planalto poderia despejar em despesa pública se o teto não existisse nesse
momento. Em outras palavras, a algibeira cheia dos governadores não se reproduz
na mesma medida para Bolsonaro.
O desafio dos incumbentes em 2022 será o da
gestão da folha. Não haverá mais a trava para reajustes. A folha está
represada, a inflação deverá estar em queda no próximo ano, o panorama para
crescimento econômico é recessivo e a arrecadação deve cair.
A tentação populista é grande. Basta ver,
no plano nacional, a ânsia de Bolsonaro em encontrar alguma brecha inexistente
para aumentar o funcionalismo, “nem que seja 1%”, como disse esta semana. Nos
Estados as pressões devem ser maiores.
O governador que usar a bonança para
distribuir aumentos tende a armar a mesma bomba de tempo que os governadores
Sergio Cabral e Luiz Fernando Pezão acionaram no Rio, colaborando para a
destruição política de si mesmos e para a devastação econômica do Estado. Os
governadores que resistirem chegarão em 2023 em situação mais confortável.
Ano eleitoral, contudo, não costuma fazer
bem para as contas públicas. Atravessarão melhor o período os governantes que
conseguiram fazer reforma administrativa durante suas gestões.
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