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terça-feira, 8 de março de 2022
O que a mídia pensa: Editoriais / Opiniões
EDITORIAIS
Guerra na Europa trará prejuízo à
recuperação do PIB
O Globo
A economia brasileira cresceu 4,6% em 2021
e recuperou as perdas do ano anterior, o primeiro da pandemia. Sem dúvida, foi
um alívio. Economias grandes, como a mexicana, ainda não voltaram ao patamar
pré-pandêmico. Mas, numa comparação mais ampla, fica evidente que o resultado
está longe de excepcional. O crescimento do PIB brasileiro em 2021 ficou abaixo
da média global e dos resultados apurados em Estados Unidos, Índia e China (que
nem recessão sofreu em 2020). A festa do governo federal com o anúncio foi
desproporcional. O que houve foi recuperação, um passo à frente depois de dois
ou três para trás. O PIB estava no final do ano passado num nível 0,5% acima do
registrado na mesma época do ano em 2019. Mal saímos do lugar.
Desgraçadamente, crescimento econômico
medíocre alternado com períodos de recessão tem sido a marca da economia
brasileira desde 2014. Não parece que mudará. Pelo menos não neste ano. A
perspectiva é que o PIB volte ao estado anêmico que o caracteriza. Analistas
ouvidos pelo Banco Central (BC) estimam uma expansão de apenas 0,4% em 2022. A
guerra na Europa trouxe mais incertezas a um quadro que antes já não era bom.
As principais causas da dificuldade
brasileira para crescer são conhecidas. A produtividade não aumenta na
velocidade necessária, a economia é fechada demais, o ambiente de negócios é
sufocante, e o Estado drena do setor privado a pouca poupança que depois faz
falta nos investimentos. Pior que enfrentar todos esses problemas é contar com
uma classe política que finge não ter nada a ver com isso. O ritmo de aprovação
das reformas no Congresso dá a impressão de que vivemos todos na Escandinávia,
sem motivo algum para urgência.
Os problemas estruturais deverão se agravar
por questões circunstanciais. Se é verdade que estados e municípios estão com
os cofres cheios e que os gastos em ano eleitoral farão a economia rodar mais
rápido, o conflito na Europa trará consequências negativas. É o caso da alta
nos grãos (em particular, o trigo) e no petróleo. Por ora, o preço da gasolina
não sentiu os reflexos da guerra, mas isso mudará. Com o isolamento da Rússia,
o petróleo bateu ontem em US$ 130 o barril. É inevitável o impacto na inflação
global — e, por tabela, na brasileira.
Aumentará a pressão sobre o BC, que já
vinha adotando uma estratégia de alta nos juros. A política monetária mais
restritiva, embora imprescindível, tem como efeito indesejado a redução da
atividade econômica. A queda no ritmo já estava prevista para o segundo
semestre. Com a guerra, o BC poderá ser obrigado a pôr o pé mais fundo no
freio.
Com o preço do barril subindo diariamente,
muitos países têm estudado formas de aliviar o impacto no preço dos
combustíveis. Caso os Estados Unidos e a Europa decidam boicotar o petróleo da
Rússia, os efeitos serão mais longos. Preocupado com a eleição, o governo
federal já vinha defendendo um desconto. O debate ganhará mais corpo de agora
em diante. Independentemente da solução que se encontre, as amarras que
retardam o crescimento econômico no Brasil continuarão intactas. Desatar esses
nós é que deveria ser a maior prioridade.
É precipitado liberar máscaras em
hospitais, escolas e nos transportes
O Globo
Pouco mais de dois anos depois do primeiro
caso de Covid-19 no Brasil, governos começam a suspender a obrigatoriedade do
uso de máscaras, uma das principais medidas de restrição adotadas por estados e
municípios para deter o novo coronavírus. Ontem a prefeitura do Rio, com aval
do comitê científico que a assessora, decidiu abolir as máscaras em lugares
fechados, até em hospitais, escolas e no transporte público. Foi um exagero.
Em ambientes abertos, elas já não eram
obrigatórias no Rio desde outubro do ano passado, embora boa parte da população
tenha continuado a usá-las, principalmente a partir da ascensão da
supercontagiosa variante Ômicron. Apenas a exigência do passaporte sanitário foi
mantida, mas, segundo o próprio prefeito Eduardo Paes, também está com os dias
contados.
O secretário municipal de Saúde, Daniel
Soranz, justificou a decisão com base nos números da doença na cidade. Segundo
ele, a taxa de transmissão do novo coronavírus é de 0,51% (a menor da
pandemia). A de internação é de 0,9% — há menos de 50 hospitalizados na rede
municipal do Sistema Único de Saúde. Quase 85% dos cariocas estão com o esquema
vacinal completo. Mas o percentual dos que receberam a dose de reforço ainda é
baixo (42%). Isso deveria ter sido levado em conta, já que apenas ela tem se
revelado eficaz para deter as novas variantes.
A decisão do Rio, primeira metrópole
brasileira a abolir as máscaras em lugares fechados, deverá ser seguida por
outras cidades. São Luís, Cuiabá, Belo Horizonte e Brasília são algumas das
capitais em que elas já não são mais obrigatórias ao ar livre. Em Porto Alegre
e Florianópolis, foram dispensadas para crianças. No dia 15, o Fórum Nacional
de Governadores deverá discutir o fim de medidas de restrição, entre elas a
exigência do uso de máscaras.
O importante a observar é que, apesar de os
números estarem em queda depois da onda avassaladora da Ômicron, há incerteza
sobre o grau de imunidade conferido pelas infecções às novas variantes. Além
disso, há disparidades entre as regiões. Cidades como São Paulo e Rio, com a
vacinação avançada, não representam a realidade do Brasil, onde há muitos
bolsões de não vacinados. Os índices de contágio e internação também não são
homogêneos.
É desejável que as restrições sejam
revistas à medida que a doença reflua em todo o Brasil. É o que já ocorre
noutros países. Mas o momento ainda não permite o “liberou geral”. Convém
lembrar que cerca de 400 brasileiros ainda morrem diariamente vítimas da Covid-19.
Nesse cenário, seria fundamental manter a obrigatoriedade de uso de máscaras ao
menos em hospitais, no transporte público e em escolas (é baixo o percentual de
crianças vacinadas em todo o Brasil). Da mesma forma, os passaportes sanitários
não devem ser abolidos, pois são um incentivo à vacinação e uma garantia de
segurança aos cidadãos. Forçar a volta à normalidade pode até render dividendos
políticos a prefeitos, governadores e ao presidente Jair Bolsonaro, sempre
contrário a todo tipo de restrição. Mas não se extingue pandemia por decreto.
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