O Estado de S. Paulo.
A elite brasileira parece concentrar hoje
mais dinheiro do que a elite russa
As sanções anunciadas nos últimos dias têm
chamado atenção para os oligarcas, o grupo de russos muito ricos que ajudaria a
sustentar Putin no poder. O termo – oligarcas – é usado para a elite da Rússia,
mas não tipicamente para elites de outros países. O que permite usar a
denominação lá e não, por exemplo, aqui? Que semelhanças e diferenças existem
entre as nossas elites?
Nos dicionários, a definição de oligarca passa pela elevada influência política que o sujeito detém, mas também se permite o uso para definir alguém muito rico (um sinônimo de magnata, ricaço). A Rússia é, de fato, um país muito desigual, com alta concentração de renda naqueles que estão no topo dela – mas é difícil encontrar medida que mostre que essa concentração é maior do que no Brasil.
O 1% da população russa que está mais bem
posicionado na distribuição de renda concentraria 22% de toda a renda do país –
segundo o World Inequality Report 2022. É um dos maiores níveis do mundo. Mas
perderia para o do Brasil: aqui o 1% mais rico da população leva 27% da renda
(segundo a mesma fonte).
Esta concentração nunca foi inferior a 20%
da renda nacional, segundo o trabalho do Pedro de Souza, que construiu uma
série histórica desde 1926. Neste sentido, se a atual elite russa é
relativamente recente – vem dos anos 90, o Brasil tem uma tradição mais longeva
para o seu 1%. Não é difícil rastrear parte das fortunas brasileiras a boas
conexões políticas desde a ditadura militar (pense em empresários presos na
Lava Jato) ou até Vargas.
Voltemos aos dados do 1%: a fatia detida
por estes grupos no total do patrimônio, por sua vez, seria equivalente nos
dois países: em ambos o 1% mais rico responderia por cerca de 50% da riqueza (a
apuração desta medida, porém, é menos consensual).
Os dados mostram ainda que os ricaços de
ambas as nações ficariam bem na comparação internacional: os mais ricos de cada
país também pertencem ao clube dos mais ricos do mundo, segundo Branko
Milanovic. Em termos absolutos, pela revista Forbes, a Rússia tem mais
bilionários do que o Brasil (mas produzimos mais deles – proporcionalmente – em
2021).
Se há óbvias diferenças – os bilionários
russos fabricados por privatizações corruptas, o uso obstinado de offshores, o
envolvimento com um Estado mafioso – não é fácil encontrar uma medida que
permita classificar de forma inconteste os russos ricaços como oligarcas sem
incluir no rótulo os nossos também.
*Doutor em economia
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