O Estado de S. Paulo
Risco de eleger uma bancada menor de
deputados reduz incentivos de lançar candidato a presidente
O fundo eleitoral restringiu
o apetite dos partidos para lançar candidatos à Presidência. A despeito dos
valores vultosos (R$ 4,9 bilhões) reservados aos partidos, os recursos de
campanha para presidente, paradoxalmente, ficaram escassos.
O fundão tornou a campanha presidencial ainda mais cara. Antes, o partido que tinha um candidato à Presidência podia captar recursos de empresas. Agora não mais. Os partidos têm que disputar recursos com as outras candidaturas, inflacionando o jogo. Quem não tem candidato à Presidência tem uma clara vantagem.
Quanto mais recursos forem alocados para candidatos à Presidência, menos estarão disponíveis para outros cargos eletivos, especialmente para o Legislativo federal que, em última instância, é o que vai definir o quinhão de recursos a que cada partido terá direito no próximo ciclo. Esse talvez tenha sido o efeito perverso não antecipado do fundo público de campanha.
É como se as artérias partidárias
estivessem prestes a enfartar. Nessa situação, o corpo desenvolve circulação
colateral, especialmente quando o miocárdio sofre uma redução paulatina do
aporte sanguíneo, sinalizando que as artérias coronárias estão em vias de
entupir. Mas quando o processo de entupimento é rápido, não oferecendo tempo
hábil para o desenvolvimento de circulação colateral, o miocárdio enfarta.
As coronárias do sistema político já dão
sinais de obstrução com Lula e Bolsonaro,
que se nutrem da polarização que, perversamente, cria barreiras ao surgimento
de alternativas. O risco é de que o fundão obstrua as coronárias do sistema
partidário antes de os partidos gerarem candidaturas colaterais competitivas.
Não interessa à maioria dos partidos
arriscar eleger uma bancada menor de deputados que possa comprometer a sua
competitividade futura, entrando em uma disputa presidencial já altamente
polarizada.
A terceira via só
teria condições de ser uma alternativa real de irrigação colateral na disputa
presidencial por meio de um processo vigoroso de concertação, o que exigiria
grande capacidade de coordenação dos mais variados partidos. Teria que haver
garantias de que tais partidos, se vitoriosos, alcançariam maiores retornos com
a Presidência. Mas o caminho é tão incerto que desestimula tal
coordenação.
Em vez de proporcionar um equilíbrio
agregador, com vários partidos oferecendo candidato, independentemente das suas
chances de sucesso, o fundão gerou um equilíbrio separador, com presidenciáveis
sendo oferecidos por poucos partidos, somente por aqueles com maiores
probabilidades de vitória.
*Cientista político e professor titular da Escola Brasileira de Administração
Pública e de Empresas (FGV EBAPE)
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