Folha de S. Paulo
País continua andando devagar mesmo para os
padrões menos que medíocres da vizinhança
As maiores economias do mundo vão crescer
menos em 2022 do que o FMI previa
antes da guerra. O Brasil é uma das pouquíssimas que se
salvaram da revisão para baixo das estimativas do Fundo Monetário
Internacional. Em vez de crescer 0,3% neste ano, cresceria 0,8%.
Quanto América
Latina e Caribe vão crescer, na estimava do Fundo? O triplo do
crescimento brasileiro: 2,5%. No caso de 2023, chute ainda mais arriscado, o
Brasil cresceria 1,4% e América Latina & Caribe de novo 2,5% (o que inclui
o crescimento brasileiro, claro, empurrando a média regional para baixo).
Previsões de crescimento costumam estar bem erradas. As do FMI (e as do Banco Mundial e as da OCDE) foram horrivelmente erradas assim que começou a epidemia, em particular para o Brasil. Mas, além dos números, a historinha contada pelo Fundo tem algum interesse, embora não seja também lá novidade.
O argumento de base para revisão "para
cima" no caso brasileiro é que o país poderia se
beneficiar da alta do preço de commodities (petróleo, grãos,
minérios), essas mesmas carestias que empurram
a inflação para cima e desgraçam o poder de compra dos salários.
Além do mais, o Brasil não está no grupo
dos países emergentes que padeceram de fuga de capitais por causa da crise da
guerra. Na verdade, o vaivém de dinheiro melhorou no Brasil desde o início
deste ano (depois de anos muito ruins, diga-se de passagem).
E daí?
Daí que, mesmo beneficiado pela sorte
equívoca e duvidosa de faturar inadvertidamente uns trocados com a guerra, o
Brasil continua andando devagar mesmo para os padrões menos que medíocres da
vizinhança. Tem sido assim desde o começo da década de 2010. Nas contas dos
economistas do Fundo, ainda seria o caso de 2019 a 2023.
Tomando como base o ano de 2019, o último
antes da epidemia, e levando as estimativas até 2023, o Brasil cresceria 2,4%
no quadriênio. América Latina & Caribe, 4,4% (mesmo incluindo o peso morto
brasileiro. Sem o Brasil, vai crescer bem mais).
Nas economias avançadas, o crescimento
seria de 6,3% nesse quadriênio (trata-se de Estados Unidos, Canadá, Japão,
União Europeia do euro, Reino Unido e uns ricos menores). Na média ponderada do
mundo, o crescimento acumulado a partir de 2019 até 2023 seria de 10,3%.
Sim, nesse pacote mundial tem o peso da
China, da Índia e países do leste da Ásia. Mas por que estamos arrumando
desculpas, por assim dizer? Sim, desculpas: dizer que a China é um caso
excepcional. Ou dizer que a Índia é um caso diferente e compreensível de país
de muito pobre que tem sucesso em sair da renda baixa (como o Brasil já o fez),
como é também o caso de certos países da África.
Mas o que está acontecendo mesmo com os
países do Oriente
Médio e na Ásia Central? Vão crescer 11,3% no quadriênio 2020-2023.
Ah, sim, lá estão os países petrolíferos, como a Arábia Saudita, mas não
apenas. Mas, sim, somos uma aberração, não importa muito para onde se olhe. O
crescimento da economia da África Subsaariana nesse período seria de 10,9%,
segundo os chutes mais ou menos informados do FMI.
Não é novidade, o Brasil tem sido uma
aberração desde 2014. Mesmo o crescimento da economia depois de 2010 e antes da
Grande Recessão caía pelas tabelas, na comparação com a vizinhança
sul-americana.
Mais incrível é que o assunto praticamente
desapareceu da conversa, como se o nosso destino manifesto fosse afundar no
esquecimento e como se agora estivéssemos limitados apenas a manter "as
instituições funcionando" a fim de que muitos de nós não tenhamos de ir
para o exílio.
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