O Globo
É o futuro que nos acena com esperança
quando a juventude responde ao chamado de se habilitar ao voto. O presidente do
Tribunal Superior Eleitoral, ministro Edson Fachin, anunciou que o prazo de
regularização dos títulos de eleitor para o pleito deste ano chegou ao fim com
incremento de 2,042 milhões de adolescentes de 16 a 18 anos aptos a
votar. A mobilização intensa — do TSE aos famosos locais e estrangeiros,
passando por coletivos de juventude e brasileiros comuns, todos preocupados com
o destino de uma democracia sob permanente ataque — impactou brasileiras e
brasileiros menores de idade, que disseram “sim” à participação política, mesmo
desobrigados de ir às urnas.
— A juventude brasileira foi convocada a
participar das eleições em outubro, e a resposta foi impressionante — festejou
Fachin.
Nesta semana, o ministro já tinha proferido
no Supremo Tribunal Federal (STF) discurso contundente contra a atmosfera
golpista que emana do Planalto:
— O respeito entre as instituições e a harmonia entre os Poderes dependem hoje não só da abertura para o diálogo, mas também de uma posição firme: não transigir com as ameaças à democracia; não aquiescer com informações falsas e levianas; não permitir que se corroa a autoridade do Poder Judiciário.
O engajamento da juventude do Brasil ao
processo eleitoral é bem-vindo e necessário. Lembrou muito a corrida à Casa
Branca, em 2020, quando a participação de eleitores jovens, negros e latinos
bateu recorde e foi essencial para eleger a chapa democrata, de Joe Biden e
Kamala Harris. Lá, chamou a atenção a atuação da advogada negra Stacey Abrams.
Em 2018, ela perdeu a eleição para o governo da Georgia por margem pequena de
votos, após 53 mil eleitores, 70% afro-americanos, terem o registro suspenso
por uma norma feita sob medida para excluí-los. Os nomes nas listas de votação
tinham de estar exatamente iguais às identidades estaduais, sem um acento ou
hífen fora do lugar.
Após a derrota, Abrams fundou a organização
Fair Fight (Luta Justa, em tradução livre) para denunciar falhas no sistema
eleitoral e atrair jovens e minorias étnicas para votar. Dois anos atrás, às
vésperas do pleito que livrou os EUA da reeleição de Donald Trump, o movimento
conseguira registrar 800 mil novos eleitores na Georgia, dos quais 45% negros e
igual parcela de jovens com menos de 30 anos. O estado deu maioria aos
democratas pela primeira vez desde 1992, quando Bill Clinton se elegeu
presidente.
Num Brasil em que, a cada eleição, cresce o
total de abstenções, votos nulos e brancos, o engajamento do eleitorado jovem é
auspicioso. A faixa etária está mergulhada em problemas e carece de políticas
públicas. Pesquisa da FGV Social sobre percepções da juventude mostrou que o
índice de felicidade dos jovens despencou de 7,3 (de zero a dez) em 2013 para
6,4 em 2020. Foi o mais baixo nível de satisfação com a vida já registrado no
grupo. Ao todo, 59% se declaravam preocupados, outro recorde; e 32% com raiva.
A satisfação com o sistema educacional, que atingira 56% em 2018, caiu para 41%
no primeiro ano da pandemia. “Dos jovens brasileiros, 30% não acreditam que
podem subir na vida com trabalho. Foi o pior resultado entre países
latino-americanos. No Peru, a proporção era de 3%”, informou o economista
Marcelo Neri, da FGV Social.
Na convocação geral à juventude para as
eleições 2022, houve muita ênfase na escolha do próximo presidente. Mas é
preciso lembrar a moças e rapazes que o Brasil escolherá também governadores,
um terço do Senado Federal (27 nomes, um por unidade da Federação), deputados
federais, estaduais e distritais. São todas funções essenciais à elaboração e à
aplicação de leis e políticas públicas. Quatro anos atrás, além de Jair
Bolsonaro, presidente, e Hamilton Mourão, vice, o Brasil escolheu para a Câmara
dos Deputados, entre 513 parlamentares, 77 mulheres e 125 pretos e pardos.
Quase um terço da casa do povo tinha entre 51 e 60 anos. Somente em 2018 o
Brasil elegeu a primeira deputada federal indígena, Joenia Wapichana (Rede-RR).
Antes dela, só o cacique xavante Mário Juruna (PDT-RJ), em 1982.
Os brasileiros de 15 a 29 anos beiram um
quarto da população. Têm capacidade de contribuir para aumentar a
representatividade de gênero, raça e idade nos espaços de poder. Não por acaso,
a Uneafro, organização do movimento negro, anunciou instalação de 25 comitês
Brasil afora para debater participação política e agenda antirrascista nas
eleições 2022. Coalizão Negra por Direitos e PerifaConnection, entre outras
entidades, lançaram campanha pelos dez anos da Lei de Cotas, marco reparatório
que viabilizou a entrada na universidade pública de milhares de jovens negros e
de baixa renda.
O coletivo Engajamundo ocupou ruas de Rio
de Janeiro, São Paulo, Recife, Porto Alegre, Belém e Fortaleza com ações para
incentivar o eleitorado jovem a tirar o título de eleitor.
— Somos 50 milhões de jovens no Brasil.
Temos o poder de mudar o resultado das eleições. Para isso, é preciso trazer os
jovens para participar ativamente da construção de um país que tenha nossa
cara, idade e linguagem — disse Larissa Pinto Moraes, diretora executiva.
A mudança está com eles.
Nenhum comentário:
Postar um comentário