O Globo
Após a vitória de 2002, Lula passou a
repetir que não tinha o direito de errar. Citava o exemplo de Lech Walesa, o
ex-presidente polonês. Eleito com ampla maioria, o sindicalista fez um governo
desastroso. Quando tentou voltar ao poder, teve 1% dos votos. “Se eu errar, a
classe trabalhadora nunca mais vai eleger alguém do andar de baixo”, dizia o
petista. Vinte anos depois, ele se aproxima de outro momento decisivo.
Lula lidera a corrida presidencial de 2022. Desfeitas as ilusões sobre uma terceira via, desponta como o único político capaz de derrotar Jair Bolsonaro. Apesar do favoritismo, ele tem colecionado gafes e tropeços. Ouvidos pela coluna, três ex-ministros de gestões petistas apontaram os mesmos problemas na pré-campanha: desorganização, falta de estratégia para atrair eleitores indecisos e excesso de falas desastradas do candidato.
O ex-presidente já foi obrigado a pedir
desculpas após dizer que Bolsonaro “não gosta de gente, gosta de policial”. Ao
se retratar, alegou ter confundido polícia com milícia. Não foi seu único
deslize recente.
Nas últimas semanas, ele estimulou
protestos nas casas de deputados, censurou os hábitos de consumo da classe
média, deu um palpite infeliz sobre a guerra na Ucrânia e definiu a pauta
religiosa como “muito atrasada”. Pode ser, mas ainda define milhões de votos no
Brasil.
Na terça, Lula disse que o deputado Arthur
Lira quer ser imperador do Japão. Teve que engolir uma correção: quem manda no
país asiático é o primeiro-ministro. Ontem ele se confundiu com o mapa
paulista: em visita a Sumaré, saudou a população de Avaré. Os dois municípios
são separados por mais de 200 quilômetros.
Insuspeito de simpatizar com o
bolsonarismo, o escritor Paulo Coelho cobrou um freio à “incontinência verbal”
do ex-presidente. A queixa foi comemorada por petistas que veem as mesmas
falhas, mas evitam confrontá-lo pessoalmente.
A escassez de conselheiros dispostos a
dizer o que pensam é um sintoma dos novos tempos do PT. O partido derrubou o
chefe de comunicação da campanha e empacou na escolha do substituto. Um novo
marqueteiro foi contratado às pressas, mas não fará milagres se o chefe
insistir no improviso.
Amanhã, Lula lançará oficialmente sua sexta
campanha ao Planalto. Desta vez, enfrentará um candidato a autocrata disposto a
incendiar o país para continuar no poder. O duelo pode definir o futuro da
democracia brasileira. Quem se dispõe a vencê-lo não pode abusar do direito de
errar.
Nenhum comentário:
Postar um comentário