sexta-feira, 2 de dezembro de 2022

Bernardo Mello Franco - Gaiola de Ouro 2.0

O Globo

Câmara quer gastar R$ 150 milhões para comprar edifício que abrigou hotel de luxo e império de Eike

A Gaiola de Ouro vai mudar de endereço. Os vereadores do Rio querem deixar o Palácio Pedro Ernesto, no coração da Cinelândia. O plano é comprar o Edifício Serrador, que já sediou o império de Eike Batista.

Inaugurado em 1944 como hotel de luxo, o prédio tem 24 andares e conta com heliponto, elevadores informatizados e cobertura panorâmica. Nos tempos de glória, abrigou a boate Night and Day, que atraía celebridades internacionais e políticos da velha capital.

O imóvel está avaliado em quase R$ 150 milhões. Numa conta conservadora, ainda seria preciso gastar mais R$ 20 milhões para adaptá-lo às novas funções legislativas.

Apesar dos custos, os vereadores parecem animados. Sonham com gabinetes mais amplos e confortáveis, valorizados pela vista de cartão-postal. Enquanto se ocupam com os dramas municipais, poderão contemplar o Pão de Açúcar, o Aterro do Flamengo e a Baía de Guanabara.

Embora envolva recursos públicos, o negócio está sendo tramado a toque de caixa. A transação veio à tona nesta semana, enquanto os eleitores se distraíam com os jogos da Copa. A depender dos nobres edis, será concretizada antes do Natal.

A direção da Câmara argumenta que a mudança vai racionalizar os trabalhos, hoje espalhados por cinco edifícios. Os vereadores também reclamam que as instalações atuais estão malconservadas. O problema é justificar o gasto milionário em tempos de crise.

O discurso de que a Casa tem devolvido parte de seu orçamento é uma desculpa capenga. O dinheiro pertence ao contribuinte, não aos vereadores. Se está sobrando, a lei deveria ser alterada para reduzir os repasses nos próximos anos.

A Câmara afirma que sua antiga sede será transformada em centro cultural. Os deputados estaduais disseram o mesmo no ano passado, quando se mudaram do Palácio Tiradentes. Hoje o prédio histórico está subutilizado, e seu anexo foi deixado às moscas em plena Praça XV.

O historiador Brasil Gerson contava que o Pedro Ernesto foi apelidado de Gaiola de Ouro devido ao custo exorbitante. Sua construção consumiu 23 mil contos de réis, mais que o dobro do Theatro Municipal. Agora o palácio arrisca ser abandonado em 2023, quando fará cem anos.

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