Folha de S. Paulo
A festa de 2022 ficará na lembrança como a
mais triste e revoltante da história
O Carnaval deu um passo de caranguejo na tentativa de driblar a pandemia e, ao mesmo tempo, garantir o lucro dos empresários. É como se tivéssemos regredido a 1840, quando foi realizado o primeiro baile carnavalesco no Rio. Quatro anos depois o sucesso já cobrava seu preço. A ceia, os vinhos e os refrescos continuavam a ser servidos aos dançarinos, mas a entrada custava o dobro, passando de 2.000 para 4.000 réis.
Na época mulheres não pagavam ingresso.
Agora elas pagam R$ 700 ou até mais caro nas festas privadas, a maneira pela
qual as prefeituras de quatro das principais cidades carnavalescas —Rio, São
Paulo, Salvador e Belo Horizonte— contornaram as restrições sanitárias impostas
aos desfiles
de blocos, que estão proibidos.
Ou seja: o folião
na rua, mesmo mostrando o comprovante de vacinação pendurado na fantasia de
jacaré, corre o risco de pegar a peste. Em ambientes fechados e elitistas,
desde que os protocolos sejam seguidos, ele está liberado para pular à vontade
ao som de breganejos e sofrências, que desbancaram as marchinhas e sambas de
enredo.
Voltemos aos bailes do passado, que as
circunstâncias atuais reviveram. Nos salões animados pelas orquestras do
Municipal, do Cassino Atlântico e dos hotéis Copacabana e Glória, quem pedisse
outra coisa que não champanhe era um penetra. Nos anos 60 e 70, a plebe ignara
corria para comprar a revista Manchete e ter um gostinho imaginado de como era
o bacanal no Baile do Havaí, com todo mundo nu na piscina do Iate Clube. E
quantas pessoas em 1907 possuíam carros de luxo para exibir no corso da avenida
Central?
Quem pensa que o Carnaval sempre foi uma
festa de gente pobre está mais enganado que o prefeito Eduardo Paes. As camadas
populares inventaram, construíram e conquistaram seu espaço. Hoje elas estão
impedidas de brincar. A folia de 2022 ficará na lembrança como a mais triste e
revoltante da história.
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