2 – As manifestações
políticas dessa oposição assumem forma variada em cada país. Nos Estados
Unidos, está presente na disputa entre democratas e trumpistas, na Europa, nas
várias frentes que se articulam em oposição ao avanço extrema direita. Nos
países em que a democracia já claudicou, por sua vez, a frente é ainda mais
ampla, de resistência permanente à consolidação dos regimes autoritários.
3 – Em todos os países o caldo de cultura do autoritarismo é o mesmo: os sentimentos de insegurança e medo das mudanças provocadas pelo avanço do processo de globalização. No Brasil, particularmente, dois vetores foram relevantes para o crescimento do autoritarismo. Primeiro, a deslegitimação da política institucional, a partir da divulgação dos episódios de corrupção conhecidos como mensalão e petrolão. Segundo, a crise econômica que alcançou tardiamente o país, agravada por erros de condução na política econômica dos governos de então. A sequência desses eventos levou sucessivamente ao impedimento de Dilma Roussef, ao esvaziamento do governo Temer e à vitória, em 2018, do candidato Bolsonaro, representante confesso da extrema direita nacional, articulada organicamente com lideranças políticas e intelectuais afins em outros países.
4 – Logo após a
posse do novo governo, as consequências deletérias de sua agenda política se
fizeram sentir. Aumento da violência entre as pessoas, destruição ambiental,
aprofundamento da crise econômica, maior desigualdade e exclusão social,
isolamento internacional e, mais importante, ameaças cotidianas ao ordenamento
democrático vigente no país. Ao longo desse período o Cidadania posicionou-se
coerentemente em oposição ao governo, apoiou no primeiro turno das eleições de
2022 a candidatura de Simone Tebet e integrou, no segundo turno, a frente ampla
democrática que se constituiu em torno da candidatura Lula.
5 – A tentativa
de golpe ocorrida em 8 de janeiro, o apoio passivo que mereceu de parcelas
importantes da população e a persistência de setores relevantes do eleitorado
seduzidos pela solução autoritária mostram, contudo, que as tarefas da frente
ampla democrática não se esgotaram no segundo turno das eleições. A democracia
permanece em risco e o governo Lula deve ser apoiado por todos os democratas
enquanto esse risco persistir. Nesse sentido, foi correta também a decisão da
direção do Cidadania, que manifestou apoio do partido ao novo governo.
6 – Consideramos
que essa política deve ser mantida. Não há espaço político e eleitoral hoje
para uma frente democrática de oposição. Há divergências históricas entre o
Cidadania e o programa implementado pelos governos anteriores do PT. Hoje
contudo todas essas divergências estão representadas também por outros atores
no interior do governo e nosso papel deve ser a participação no debate interno
do campo governista, de forma aberta e corajosa, sem omitir ou escamotear as
críticas pertinentes.
7 – Não
partilhamos, contudo, essa posição com nosso parceiro federado, o PSDB, que
sinaliza o caminho da construção de uma oposição democrática ao governo Lula.
Consideramos essa posição um equívoco político e eleitoral, que dificilmente
atingirá o objetivo declarado de construção de um bloco democrático capaz de
enfrentar, simultaneamente, o PT e o bolsonarismo. No entanto, uma vez que a
federação é um pacto com data de vencimento, devemos discutir de forma fraterna
com nossos parceiros como equacionar essa diferença política de fundo,
particularmente na montagem das chapas e na campanha para as eleições de 2024.
Temos que definir regras de convivência e de resolução de conflitos, regras
que, ao contrário das que vigoraram em 2022, venham a ser observadas.
8 – Nossa
posição é, também, contrária à toda tentativa de ampliação da federação com a
incorporação do Podemos, inclusive à participação de conversas preliminares sem
a autorização prévia do Diretório Nacional do Cidadania. A política deve
determinar as estratégias eleitorais e parlamentares, não o contrário. E não há
razões políticas ou programáticas que justifiquem a associação eleitoral, por
quatro anos, com o Podemos. Com esse partido não temos afinidade na vertente
social-democrata de nossa agenda, tampouco na vertente ambientalista e sequer,
talvez, na vertente liberal. Podemos e devemos conviver e cooperar com ele no
âmbito da frente ampla democrática de apoio ao governo, mas a apresentação
conjunta, na mesma federação, na disputa eleitoral resultará em apagamento da
nossa identidade e consequente desastre político e eleitoral para nós.
9 – Devemos, em
vez de pensar em ampliar a federação, intensificar o diálogo com o PSDB, de
forma a facilitar a construção de chapas competitivas para 2024. Convencer,
além disso, ao partido parceiro a encampar, nesse processo, a diretriz maior de
derrota política e eleitoral do bolsonarismo e, no âmbito dessa diretriz, o
objetivo de maximizar o resultado dos dois partidos nas eleições de prefeitos e
vereadores, somando esforços, abrindo espaços para os candidatos mais
competitivos em cada situação local.
10 –
Paralelamente, precisamos construir canais de diálogo regular com o governo e,
dentro dele, com nossos parceiros históricos, como Rede, PV, PSB, MDB e PDT, de
forma a chegar em 2026 em condições de operar uma verdadeira ampliação,
política e programática, de nossa federação, para construir um ator político
capaz de encarnar, ao contrário do que aconteceu em 2018 e 2022, um polo
relevante na política nacional.
*Caetano Araújo. Sociólogo, Membro do
Conselho da FAP e do Diretório Nacional do Cidadania.
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