O Globo
Quando a situação econômica não é
favorável, é hora de acelerar, não de diminuir, o ritmo da agenda social
Atravessamos um momento de incertezas na
economia. Eventos como a guerra na
Ucrânia, o acirramento da competição entre Estados
Unidos e China e as recentes
altas na taxa global de juros tornam ainda mais difícil a recuperação do mundo
pós-pandemia.
Essas circunstâncias agravam a situação
econômica do Brasil, já pressionada por problemas estruturais como desemprego,
falta de investimentos e inflação.
Tudo indica que estamos à beira de um
inverno na economia, com desaceleração do crescimento em escala global. Diante
desse clima de incerteza, é compreensível que o setor privado comece a refazer
cálculos e a rever alguns gastos.
Os investimentos sociais são alguns dos primeiros a passar por esse tipo de escrutínio. As empresas raciocinam que, colocando menos dinheiro em projetos sociais, em programas educativos e de capacitação profissional ou em iniciativas sustentáveis, estarão mais bem preparadas para atravessar as turbulências na economia.
Essa postura não apenas é contraproducente,
como ilustra bem a diferença entre aqueles que tomam decisões ao sabor das
circunstâncias e aqueles que se baseiam em ideias sólidas.
Conjunturas mudam a toda hora. A economia é
cheia de subidas e descidas imprevisíveis, em ritmo vertiginoso. Boas ideias,
no entanto, conseguem atravessar sem um arranhão esse terreno movediço, pois
apontam para objetivos muito mais abrangentes e ambiciosos.
Quem atua na área social não pode se basear
em circunstâncias. O líder de uma ONG na favela, o educador voluntário, o
profissional de saúde que atende comunidades ribeirinhas ou o agente ambiental
não podem esperar o fim da crise para realizar seu trabalho. Muito pelo
contrário, é quando as circunstâncias do país pioram que seu trabalho se torna
ainda mais essencial.
Períodos de incerteza na economia servem
para testar se nossas elites empresariais realmente têm como norte as ideias
expressas na sigla em inglês ESG — environmental
(ambiental), social (social) e governance (governança). Será que a sociedade
brasileira está preparada para dar prioridade a mazelas como pobreza,
desigualdade e degradação do meio ambiente? Ou esse compromisso só vale da boca
para fora?
É fundamental que o setor privado entenda
que a manutenção do investimento social é benéfica também do ponto de vista
puramente financeiro. Nenhum país supera momentos de crise sem investir em seu
capital humano, apostar em tecnologia e inovação, fortalecer seu mercado
interno e capacitar sua mão de obra para ampliar a produtividade. Quando as
circunstâncias econômicas não são favoráveis, é hora de acelerar, não de
diminuir, o ritmo da agenda social.
Essa deve ser a convicção de nossos
filantropos. Se o Brasil e o mundo atravessarem um período de crise, precisamos
de uma elite, no melhor sentido da palavra, verdadeiramente compromissada com
um ideário social, que use seu poder político e econômico para fazer frente às
circunstâncias e para manter ativos os programas mais promissores de combate à
pobreza.
Tempos de crise são oportunos para que um
povo mostre que não é motivado pelas circunstâncias, mas sim por grandes
ideias.
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