O Estado de S. Paulo.
Ignorar preferências do Congresso gera mais derrotas e maior custo governativo
A interpretação dominante das relações
executivo-legislativo em sistemas presidencialistas é a de que o número de
cadeiras ocupadas pelo partido do presidente no Congresso é o fator mais
importante para explicar seu sucesso no legislativo.
Entretanto, em ambientes multipartidários,
como o brasileiro, mesmo presidentes majoritários podem enfrentar maiores
dificuldades para aprovar a sua agenda.
Por que a maioria numérica de cadeiras no legislativo ocupadas pelos partidos que fazem parte da coalizão presidencial não é condição suficiente para que o presidente governe de forma bem-sucedida?
No artigo Congruent we Govern, escrito em
parceria com Frederico Bertholini e Marcus Melo, mostro que a variável chave
para explicar o sucesso legislativo de presidentes em ambientes
multipartidários não é o tamanho da maioria, mas a congruência de preferências
ideológicas entre a coalizão e o plenário do Congresso.
Coalizões que espelham a preferência
mediana do Congresso geram mais sucesso legislativo ao presidente a baixo
custo. Por outro lado, quando as preferências da coalizão e do plenário são
incongruentes, o presidente tende a enfrentar mais derrotas e o custo de
gerenciar essa coalizão aumenta.
A partir de nove rodadas de surveys com os
parlamentares de 1990 a 2021 (Zucco e Power), identifiquei que existe uma
grande variação na composição ideológica das coalizões presidenciais desde
Sarney até Lula 3.
Algumas coalizões são mais congruentes com
o plenário, como a do governo FHC 1. Por outro lado, as coalizões dos governos
Bolsonaro e Lula 3 apresentaram o nível de incongruência com o plenário muito
parecido, variando apenas o sinal do polo, que é invertido. Enquanto a coalizão
de Bolsonaro foi mais à direita da preferência da Câmara, a de Lula 3 é mais à
esquerda.
Embora a coalizão de Lula 3 seja menos
incongruente com o plenário do que a de seus governos anteriores, o que sugere
aprendizado, ela, a despeito de possuir um maior número de partidos (14), só
gera maioria simples, é ideologicamente mais heterogênea e não aloca de forma
proporcional poderes e recursos levando em consideração o peso político dos
parceiros.
Talvez não seja por acaso que o governo
Lula 3 tenha decidido ter nada menos do que 37 ministérios e reproduzir o
orçamento secreto criado por Bolsonaro ao centralizar no Ministério das
Relações Institucionais a execução de recursos discricionários na ordem de R$
25 bilhões como RP2. Ainda é cedo, entretanto, para saber se essa estratégia
vai proporcionar sucesso legislativo.
*Cientista político e professor titular da Escola Brasileira de Administração Pública e de Empresas (FGV Ebape)
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