Valor Econômico
Situação econômica do Brasil era mais
complexa
Nos seus cem dias do primeiro mandato, em
2003, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva administrou uma alta na taxa
básica de juros logo na terceira semana do governo. O Banco Central, presidido
então por Henrique Meirelles, aumentou a Selic de 25% para 25,5% ao ano, no dia
22 de janeiro. Na véspera, a meta de inflação havia sido revista e o teta da
variação de preços fora fixado em 8,5%.
Assim como agora, o cenário em 2003 era de
baixo crescimento econômico e a inflação preocupava. A crise há 20 anos era
mais complexa pela diferença no nível de reservas de que o país dispunha.
Lula assumiu em janeiro daquele ano com cerca de US$ 38 bilhões de reservas cambiais. Esse nível baixo foi um dos motivos que havia levado o Brasil a recorrer ao FMI em 6 de agosto de 2002, durante o período eleitoral. Todos os candidatos a presidente, Lula inclusive, se comprometeram com o então presidente Fernando Henrique Cardoso de honrar os compromissos internacionais do Brasil. O petista voltou a assumir em janeiro deste ano com US$ 324 bilhões. Quem deu o tom do início do governo de 20 anos atrás foi o Ministério da Fazenda, tocado então por Antônio Palocci.
Uma outra grande diferença estava na
retórica do presidente. O presidente não se destacou por criticar o Banco
Central pela taxa Selic alta, como acontece agora.
Em 2003, ao contrário do que ocorre
atualmente, o Banco Central era tecnicamente subordinado ao Ministério da
Fazenda, sem independência funcional e mandato para a sua diretoria. Mas
Meirelles, que no ano anterior havia sido eleito deputado federal pelo PSDB,
tinha liberdade política para agir.
Em um ambiente de tranquilidade
institucional, Lula tomou posse pedindo o controle “das muitas e legítimas
ansiedades sociais”, que seriam atendidas, em suas palavras, “no momento
justo”. Lula lançou o programa “Fome Zero”, um dos carros-chefes de sua
campanha, logo no dia 30 de janeiro, mas o momento de sair de vez da austeridade
ainda demoraria.
No segundo mês do governo, o BC promoveu
mais um aumento da Selic, de 25,5% para 26,5% e apertou o crédito, elevando a
alíquota do depósito compulsório de 45% para 60%.
O ajuste era a palavra de ordem do começo
de 2003, como ficou claro na reunião de Lula com os 27 governadores em 22 de
fevereiro, quando se comprometeu a enviar a reforma da Previdência e a
Tributária ainda no primeiro semestre.
No primeiro mês do governo, o superávit
primário do setor público alcançou 7,01% do PIB, melhor resultado em 12 anos.
Estes primeiros movimentos tiveram resposta no mercado financeiro, com queda no
risco-país. Em 4 de março, o FMI liberaria a segunda parcela do desembolso previsto
para o Brasil, de US$ 4,6 bilhões (valores da época). A inflação também cedeu:
o IGP-M em março foi de 1,53%, menor variação desde maio de 2002.
O aperto do governo federal também se
refletia na relação com os Estados. Em 10 de março, Minas Gerais sofreu um
bloqueio de contas pelo não cumprimento do acordo de reestruturação da dívida
da União, celebrado em 2001.
Próximo ao cumprimento do prazo de 100
dias, Lula começou a soltar as amarras com mais vigor. No dia 31 de março
anunciou o aumento do salário mínimo de R$ 200 para R$ 240, o que em termos
reais significava um aumento de 1,85% em relação a abril de 2002.
Este ano, a negociação de um salário mínimo
de R$ 1.320 a partir de maio, com aumento real de 3,1%, ficou definida com a
votação da PEC da Transição pelo Congresso no fim do ano passado, quando Lula
conseguiu do Legislativo uma margem para gastar acima do teto de gastos e
garantir políticas sociais logo no começo de sua gestão.
Gordura para queimar em termos de
popularidade não era problema para Lula: pesquisa do Ibope divulgada em 2 de
abril mostrava o presidente com 51% de bom e ótimo e apenas 7% de ruim e
péssimo, realidade muito diferente da atual.
Mas a relação de Lula com suas bases já
começava a estressar. Um protesto de servidores federais reuniu milhares de
pessoas em 8 de abril, contra a política de austeridade do governo.
O contraste com a atualidade é significativo. Segundo a última pesquisa Datafolha divulgada, a soma de bom e ótimo de Lula está em 38%, enquanto a de ruim e péssimo alcança 29%.
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