Valor Econômico
Medidas emergenciais podem antecipar a
reindustrialização
A reindustrialização do país é um objetivo
explícito do governo Lula, praticamente não tem opositores, mas depende de
planejamento de médio e longo prazo e da criação de um amplo programa nacional.
É possível, porém, tomar medidas executivas rápidas que não dependam do
Congresso e possam desde já começar a reerguer a indústria.
Um grupo de pessoas ligadas ao setor
industrial, principalmente empresários e economistas, denominado “Brasil
Primeiro”, dedicou meses a estudar um minipacote com medidas simples para
reanimar a indústria enquanto o plano maior estaria sendo desenhado pelo novo
governo.
Na sexta-feira (31/3), o grupo entregou ao ministro da Fazenda, Fernando Haddad, suas propostas emergenciais. O documento tem só quatro itens, majoritariamente relacionados à indústria, mas cujos benefícios alcançariam a sociedade em geral. São ideias de execuções facilitadas, quase todas dependentes apenas de atos administrativos e que podem aumentar a competitividade da indústria no curto prazo. Abaixo, um resumo dos quatro itens:
1. Agilização burocrática e poupatempo
empresarial. A ideia é criar uma Agência Federal de Investimentos, na qual
empreendedores de setores produtivos possam ter acesso rápido às opções de
apoio público ao investimento. Seria criado também um “Poupatempo Empresarial
Nacional”, em que qualquer empresa possa resolver rapidamente quaisquer
pendências e/ou regularizações na União, nos Estados e nos municípios.
2. Plano safra industrial. A indústria
teria um sistema de financiamento nos mesmos moldes do existente para a
agricultura. Ou seja, créditos seriam oferecidos ao setor em condições
competitivas internacionalmente em prazo e custo. Se necessário, o Tesouro
deveria prever a equalização de juros enquanto a Taxa de Longo Prazo (TLP) não
for modificada.
Seria preciso estabelecer níveis coerentes
para a exigência de garantia a financiamentos de investimentos.
Também seria necessário simplificar o
acesso a financiamentos como InovaCred e InovaCred 4.0. E modificar a Lei do
Bem, que incentiva investimento em inovação tecnológica, assim como a lei da
depreciação acelerada, para que seus benefícios sejam acessíveis à maioria das
empresas, e não restritos às que operam no regime de lucro real.
Seria importante também capacitar gerentes
de bancos públicos para atuar como representantes do BNDES e da Finep,
tornando-os parceiros da indústria, como são ao financiar o agronegócio no
Plano Safra.
3. Comércio exterior. Propõe-se a criação
de um mecanismo de drawback consolidado por valores, classificando o direito
por famílias de produtos, por meio de um banco de drawback. E também a
ampliação do uso de drawback para serviços contratados no exterior vinculados
ao produto/serviço exportado.
Sugere-se ainda a oferta de seguro de
crédito para as exportações de pequenos negócios por meio do fortalecimento da
ABGF, a agência gestora de fundos garantidores.
4. Digitalização de empresas industriais.
Propõe-se o incentivo à digitalização via redução de custos indiretos de mão de
obra conforme metas alcançadas e verificadas. Ao mesmo tempo, haveria
financiamento de investimentos em equipamentos e sistemas para digitalização e
criação de programa de extensão em capacitação para gestores de pequenas e
médias empresas industriais.
Entre os que assinam o documento estão
Mario Bernardini, empresário e consultor; José Cristiano Daudt, industrial e
engenheiro; Fernando Bitzer, engenheiro e ex-executivo industrial; Hiram
Freitas Andreazza, diretor de empresa industrial; Paulo Tonicelli, CEO de
empresa exportadora; Pedro Evangelinos, presidente da Abrava-Sindratar;
Cristina Helena Pinto de Mello e Nelson Marconi, ambos economistas e
professores; Fausto Oliveira, jornalista e escritor.
A proposta foi apresentada a Haddad e a
dois secretários do Ministério da Fazenda, Gabriel Galípolo e Guilherme Mello.
Mario Bernardini, um dos líderes signatários da proposta, disse à coluna que
Haddad pediu detalhamentos e revelou que um “Plano Safra Industrial” está nas
intenções dele.
Os empresários sugeriram que o FAT,
responsável por 60% do funding do BNDES, passe a ser corrigido pelo IPCA
projetado, por se tratar de um fundo público e não de investimentos. Assim, o
BNDES poderia emprestar a juros abaixo da Selic, sem custos adicionais ao
Tesouro.
Haddad considerou a mudança politicamente
complicada e disse preferir reservar recursos no Orçamento para equalização de
juros, tal como no agro.
Na reunião do dia 31, os empresários
lembraram que a legislação sobre depreciação acelerada favorece as indústrias,
mas só as que operam no regime de lucro real. Tal como ocorre com a Lei do Bem,
o incentivo estaria chegando a apenas 7% das empresas. “Sugerimos a extensão do
benefício às indústrias do lucro presumido”, disse Bernardini. Mas Galípolo
argumentou que o lucro presumido já é incentivado. Segundo Bernardini, isso não
corresponde à realidade: “Estudo da Fiesp mostra que, em média, quem está no
lucro presumido paga mais impostos sobre o faturamento do que os que operam no
lucro real. Ficamos de atualizar o estudo e encaminhá-lo a Guilherme Mello”.
Bernardini considera que houve real
interesse na simplificação do drawback. Os empresários também ficaram de
encaminhar proposta detalhada sobre o tema.
Em suas sugestões, eles tentaram poupar o
Tesouro de gastos adicionais. Consideraram que a melhor solução para financiar
a indústria a custos razoáveis seria mesmo a redução da remuneração do FAT. “Se
o pequeno poupador da caderneta e o do FGTS são remunerados muito abaixo da
TLP, não há razão para o FAT ser remunerado como um especulador”, disse
Bernardini. Na ampliação da depreciação acelerada, argumenta, não há renúncia
fiscal. Apenas antecipação de créditos. Na Lei do Bem, haveria uma modesta
renúncia fiscal.
Paulo Tonicelli, também signatário, saiu
otimista do encontro. “Estamos trabalhando em detalhamentos para ser discutidos
com o governo, que ouviu, entendeu e nos abriu a porta. Aliás, esta é a melhor
notícia”, afirmou.
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