Valor Econômico
Não está claro por que os preços estão
perdendo força mesmo com um avanço maior do PIB
Há algo de muito positivo nos preços dos
serviços, que caíram mais do que seria razoável esperar, que leva os analistas
a questionamentos sobre qual era o tamanho, de fato, da ociosidade da economia,
se ela estava sendo medida de maneira correta. A taxa de crescimento também
surpreendeu - ficou em 0,9% no segundo trimestre, indicando uma variação do PIB
de cerca de 3% para este ano.
O que esta fazendo a inflação cair mesmo com um crescimento maior do PIB? O presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, arriscou um palpite há pouco mais de um ano. Para ele, pode ser o conjunto de reformas que o governo fez, a começar pelas da Previdência e a trabalhista, assim como a aprovação de uma lei para conter a expansão do gasto público - que foi agora substituída pelo arcabouço fiscal, que permite o crescimento do gasto - e, na área mais microeconômica, os marcos regulatórios do saneamento e do gás.
Assim como a taxa de crescimento do PIB
surpreendeu, a dos serviços também está surpreendendo. Em julho houve alta de
0,5% frente a junho e, em 12 meses, o aumento foi de 6%, segundo dados
divulgados ontem pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatísticas (IBGE).
Com a performance de julho, os serviços estão em um patamar 12,8% superior ao
de fevereiro de 2020, antes, portanto, da pandemia.
Já os preços dos serviços, segundo o IBGE,
tiveram elevação de apenas 0,08% em agosto, depois de terem aumentado 0,15% em
julho. Os serviços subjacentes - que incluem os mais ligados à atividade
econômica - caíram de 0,2% para 0,14%, sendo que a taxa em 12 meses, até
agosto, está em 5,5%, ainda acima do teto da meta para a inflação deste ano, de
4,75%.
Já medido pela média móvel de três meses,
anualizada e dessazonalizada - cálculo que suaviza movimentos mensais de preços
e ainda capta a tendência -, os serviços subjacentes caíram de 5,3% para 4,1%
entre julho e agosto, o que levou analistas a preverem uma inflação de
serviços, segundo essa métrica, ao redor de 4,5% a 5% no ano.
Uma reforma muito importante foi a
trabalhista, que está ligada à taxa natural de desemprego, que no começo do ano
passado era estimada em 10% e, hoje, está em 8,8%.
Esta é uma história que pode ser vista,
também, na economia norte-americana, que historicamente teve recessão depois de
ciclos de aperto monetário. Desta vez, no entanto, parece que uma desaceleração
da economia dará conta de trazer a taxa de inflação para algo mais próximo da
meta informal, de 2%, ainda que de forma gradual. Ao contrário do que se
esperava no início do ano, atualmente uma recessão na economia dos EUA parece
algo mais distante
Ontem o Banco Central Europeu decidiu por
mais um aumento, o décimo, da taxa de juros básica, que teve uma elevação de
0,25 ponto percentual e está, hoje, no seu maior nível histórico: 4% ao ano.
Segundo a presidente do BCE, Christine
Lagarde, nem todos os dirigentes da instituição apoiaram a decisão. Alguns
advogaram uma pausa, mas houve “maioria sólida” a favor do aumento, que ela não
pode dizer se foi o último.
Lagarde disse, ainda, que à medida que o
aperto monetário avança, o foco vai mudar do patamar da taxa de juros para o
tempo em que ele permanecerá elevado. “Se mantidos por tempo suficiente, darão
contribuição substancial para que a inflação retorne à meta” de 2%, disse ela.
Na zona do euro há risco de recessão.
No Brasil, os analistas devem acompanhar
com lupa a evolução do PIB potencial.
As estimativas de ociosidade que o Banco
Central fez, em cada relatório de inflação, se mostraram equivocadas, como
mostrou a diretora Fernanda Guardado, em apresentação feita recentemente.
Há duas maneiras de se ver a ociosidade da
economia. Olhando o passado e, a partir dele, se projetar o futuro. Não se
captura mudanças estruturais a partir desta forma. Uma outra maneira é mais
econômica, presumindo-se as diversas variáveis, o que tem uma boa dose de
discricionariedade. O BC trabalha com ambas e várias outras maneiras de se calcular.
E, ainda assim, não capturou o fato de que havia ociosidade não percebida.
No fundo, o que se quer é crescer mais sem que isto gere mais inflação. Se foram as reformas que começaram há uns bons anos que estão permitindo isto, é muito importante saber e, para que não fique só nas mãos do Banco Central dar uma resposta, seria bom que os economistas de fora do governo e os da academia se debruçassem sobre esse tema.
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