Valor Econômico
É preciso cautela para avaliar que os índices
de aprovação de Lula estão derretendo ou que ele está fora do páreo
Nos 25 anos em que atuo na área de
consultoria de risco político, nunca observei um debate eleitoral tão
antecipado quanto o atual. A reação do mercado à pesquisa publicada pelo
Datafolha em 14 de fevereiro, que mostrou uma queda de 11 pontos na aprovação
do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, deixou isso claro. No mesmo dia, o
dólar fechou abaixo de R$ 5,70 pela primeira vez desde novembro.
É muito difícil dizer o quanto as expectativas sobre o resultado das urnas em 2026 estão influenciando o câmbio. Mas há um consenso cada vez maior (certo ou não) de que só uma vitória da oposição levará a um ajuste fiscal e de que estamos caminhando para um cenário de mudança em 2026. Também influenciam essa avaliação a expectativa de desaceleração da economia este ano por conta do aumento da taxa de juros, e as várias vitórias eleitorais de candidatos de direita pelo mundo.
A oposição certamente tem chances em 2026.
Muito vai depender do cenário externo e das próximas decisões do governo Lula.
Mas vários fatores sugerem que é prematuro antecipar uma vitória da oposição em
2026.
Primeiro, a aprovação de Lula não está baixa
para um governante em meio de mandato. A queda mostrada pelo Datafolha foi de
fato dramática: de dezembro a fevereiro, o percentual de eleitores que avaliam
o governo como “ótimo/bom” caiu onze pontos, de 35% para 24%. Mas qualquer
amostra de uma pesquisa individual pode ter viés por razões puramente
estatísticas (isso acontece na indústria) - assim, a melhor prática é olhar a
média de todas as pesquisas. Sob essa ótica, o cenário é outro.
Dois outros institutos de pesquisa que foram
a campo no final de janeiro mostraram uma queda bem mais modesta. A Genial
Quaest mostrou uma queda de 33% para 31% nas respostas “ótimo/bom” entre
dezembro e janeiro. O recuo indicado pela AtlasIntel foi cinco pontos, de 43%
para 38%. E a Paraná Pesquisas, que foi a campo depois do Datafolha em
fevereiro, mostrou uma queda de 34% para 29% entre dezembro e fevereiro. Em
novembro, os dados da Paraná mostravam “ótimo/bom” em 32% - apontando um recuo
de três pontos percentuais em três meses.
Além disso, a taxa de “ótimo/bom” de Lula
também está melhor que a do ex-presidente Jair Bolsonaro no mesmo ponto de seu
mandato.
A taxa de aprovação binária
(aprova/desaprova) também não é tão desfavorável. Usando a média de todas as
pesquisas, Lula foi eleito com uma aprovação de 52%. Essa taxa subiu para cerca
de 54% em seu primeiro ano de mandato, e entrou em 2025 com uma média de 49%.
Em janeiro e fevereiro, recuou para entre 44% e 46%, dependendo de como a média
é calculada (novamente, uma queda de três a cinco pontos). A aprovação média do
presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, por exemplo, é hoje (com um mês de
governo) de 48%, e algumas pesquisas já mostram um recuo para 44%.
Um banco de dados com informações de mais de
450 eleições coletado pela IPSOS Public Affairs pelo mundo mostra que qualquer
governante que tem 45% de aprovação popular seis meses antes do pleito ganha
78% das vezes. Com 40% de aprovação, vence em 58%. No meio de seu mandato, a
aprovação de Bolsonaro estava em 40%. Um ano antes da eleição, caiu para 32% -
e voltou a ficar acima de 40% na véspera do pleito. Mesmo assim, o
ex-presidente perdeu por apenas um ponto percentual. É preciso cautela,
portanto, para avaliar que os índices de aprovação do presidente Lula estão
derretendo ou que ele está fora do páreo.
Mas a queda é real - e foi puxada
principalmente pelos preços de alimentos no domicílio, que subiram 8% no
segundo semestre de 2024. A aprovação do presidente caiu mais entre quem ganha
até dois salários mínimos, entre mulheres e no Nordeste - exatamente os
eleitores mais sensíveis aos preços dos alimentos. Alguns analistas argumentam
que o presidente está mais “isolado” ou que perdeu a “conexão” com o povo. Mas
será que ele estava “conectado” com o povo em 2024, mas não está mais? É
improvável. A única coisa que mudou desde então foi a inflação dos alimentos. O
escândalo do Pix deve ter exacerbado a queda, mas o fator principal era outro.
Olhando para a frente, é bem provável que a
aprovação do presidente caia um pouco mais, já que a maioria dos economistas
prevê que os preços dos alimentos subam mais este ano, a economia desacelere e
o desemprego aumente.
Ainda assim, a alta de 12% na renda real em
2023, e de outros 7% a 8% em 2024, deve impedir o derretimento da aprovação do
presidente Lula. Ainda que a economia deva desacelerar este ano, a maioria dos
economistas ainda projeta um aumento de 2% na renda em 2025 - o que não é uma
má notícia para o Palácio do Planalto.
De todo modo, está muito claro que a inflação
é o calcanhar de Aquiles do governo. Uma análise da Eurasia Group identificou
que governantes perderam eleições em 2024 não por conta de uma onda ideológica
da direita, mas porque os eleitores estavam insatisfeitos com o aumento do
custo de vida. Foi isso que levou Trump de volta à Casa Branca e a direita ao
poder na Alemanha. Logo, o maior risco para Lula é “entrar em pânico” com a
queda de sua aprovação, gastar mais do que deve e acabar com um PIB maior e com
inflação mais alta nas mãos. Em termos eleitorais, é melhor deixar a economia
esfriar e trazer a inflação para baixo que tentar aumentar o PIB e gerar mais
aumento no custo de vida - o grande algoz de todos os governantes em 2024.
Lula pode muito bem perder em 2026. O cenário externo será importante, e o presidente pode tomar decisões que mantenham a inflação elevada. E se temas de segurança ganharem relevância, isso pode prejudicá-lo. Mas é muito cedo para já considerar a oposição como favorita.
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