Notícias do novo estádio de futebol em São Paulo, já apelidado de Itaquerão, a ser construído para realizar jogos da Copa do Mundo de 2014, e quem sabe poderá até abrigar a cerimônia e o jogo de abertura, revelam: faltam 20.000 lugares que seriam supridos por assentos provisórios; localiza-se em cima de dutos de combustíveis da Petrobrás; as obras já foram iniciadas sem os contratos assinados; cada parte fala uma coisa sobre o que estaria incluído nos valores divulgados e muito, muito dinheiro público envolvido, do BNDES e da Prefeitura, via renúncia fiscal.
Enquanto isso, no mega-empreendimento do trem-bala, apelidado de TAV-Brasil, depois de anos de debates, audiências públicas, modelagens, pajelanças das mais diversas formas e origens, e aporte de muito, muito dinheiro público do BNDES e até dos Correios, o que se sabe é que, enfim, após vários cancelamentos e adiamentos o leilão é realizado e, surpresa (???) não aparece nenhum interessado. Aí então, num passe de mágica, em poucos dias, sem qualquer nova consulta ou audiência públicas, muda-se profundamente o formato do processo de licitação. Agora não mais a obra inteira, mas primeiro a definição da tecnologia, e o resto depois em outro processo licitatório.
Tudo que havia sido afirmado, inclusive na recente campanha eleitoral, se desmanchou no ar.
No escândalo do esquema de corrupção no DNIT, na VALEC e em todo o Ministério dos Transportes, divulga-se que os contratos têm, recorrentemente, seus valores aditados e a desculpa mais utilizada para justificar esses aditivos é que houve alteração no projeto.
Esses exemplos têm repercussão nacional e levantam a curiosidade da mídia e das pessoas, porém, o que é pior, retratam prática corriqueira e recorrente da contratação obras públicas, ou premeditadamente para futuramente propiciar descaradamente os tais aditivos, ou simplesmente por inépcia, desinteresse e/ou preguiça.
É a falta de uma especificação aqui, um erro de quantificação de demanda ali, o uso de uma tabela de custos defasada acolá, um documento importante que falta mais adiante e coisas desse tipo. Resumindo, tanto o caminho da corrupção como o do desperdício “não intencional”, que não deixa de também ser criminoso, necessitam quase que inapelavelmente de maus projetos e sua irmã gêmea, a falta de planejamento.
Uma reforma na administração pública passa necessariamente pelo reforço e profissionalização dos setores de projeto e planejamento de obras e serviços públicos, garantindo sua autonomia frente a pressões políticas e sua responsabilização solidária, inclusive pecuniária, pelos resultados.
Na imensa maioria dos casos, principalmente nas obras de engenharia, que se costuma, com razão, dizer tratar-se de uma das Ciências Exatas, não há justificativas para erros repetidos, repetidos e repetidos, pelos mesmos órgãos quase sempre implicando em aditivos no limite dos 25% permissíveis pela legislação das licitações.
Difícil é fazer dar certo, e com um preço justo e previsível, um trem-bala sem saber por onde passariam os trilhos, onde ficariam as estações e qual tecnologia seria usada. Da mesma forma, para construir um estádio para abrir a Copa do Mundo é, no mínimo estranho, não saber quem paga pelo desvio dos dutos, orçado em “módicos” R$ 30 milhões, bem como é um tanto patética, a previsão de alugar, já de início, 20.000 assentos provisórios, ou seja, um terço da capacidade da obra permanente. É mais um avanço do “jeitinho brasileiro”: prever e fazer o “puxadinho” junto com a obra.
Urbano Patto, Arquiteto Urbanista e Mestre em Gestão e Desenvolvimento Regional, membro do Conselho de Ética do Partido Popular Socialista -PPS- do Estado de São Paulo. Comentários, sugestões e críticas para urbanopatto@hotmail.com.
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