Extrema direita usa a crise econômica na Europa para crescer além da
pregação contra os imigrantes
ATENAS - Foi só puxar o tema "eleições" para que o taxista que me
levava do aeroporto ao hotel, no centro de Atenas, mencionasse um fantasma, o
de Marine Le Pen, a líder de extrema direita e estrela da votação francesa no
domingo, cujo espólio é disputado pelos dois candidatos que passaram ao segundo
turno.
"O Le Pen daqui também está indo para cima, para cima, para cima",
diz o taxista.
Refere-se a "Chrysi Avgi" (Aurora Dourada), o partido neofascista,
criado pelos simpatizantes da ditadura dos coronéis que governou a Grécia entre
1967 e 1974.
Não que o partido possa roçar os 20% dos eleitores, como fez Le Pen. Mas
pode, pela primeira vez, superar a barreira dos 3%, o que lhe abriria as portas
do Parlamento na eleição do dia 6. Pesquisa publicada pelo jornal
"Ethnos" dá à "Aurora Dourada" 5,2%, o que é espantosas 18
vezes mais do que o obtido na anterior eleição geral (2009).
Por isso, o partido neofascista já mexeu na agenda eleitoral.
Comenta Fragkiska Megaloudi, no "Neos Kosmos", o jornal da
comunidade grega da Austrália:
"A agenda mudou dos sérios problemas sociais para a "ameaça"
dos imigrantes ilegais e para a criação de centros de detenção".
A propósito, o ministro para a Proteção dos Cidadãos, o socialista Michalis
Chrysochoidis, anunciou para a próxima semana a abertura do primeiro dos 30
centros de detenção para imigrantes sem documentos a serem abertos na Grécia.
Na verdade, há um certo exagero em dizer que a questão dos imigrantes roubou
a agenda. Na Grécia como na França, a extrema direita enganchou no seu
tradicional discurso xenófobo a agenda social que é a inquietação majoritária
em ambos os países e no resto da Europa.
Sobre Marine Le Pen, comenta para "El País" Nonna Mayer, diretora
de pesquisa do Centro de Estudos Europeu de Ciências Políticas e especializada
no voto da extrema direita: "Le Pen também tem um forte discurso social.
Quer um Estado forte, o regresso dos serviços públicos [afetados pelos ajuste
orçamentário] e da aposentadoria aos 60 anos [Sarkozy elevou-a para 62 anos].
Tem um discurso de esquerda em questões sociais".
Vale para a França, vale para a Grécia, como escreve Emmanouela Seradakis
para "The Greek Reporter": "Aurora Dourada está mais à esquerda
do que a social-democracia no respaldo a generosos Estados de bem-estar, altos
salários, aposentadorias. E, na medida em que a crise na eurozona se arrasta e
as coisas ficam piores e piores para as pessoas comuns, a extrema direita
obterá maiores e maiores porcentagens".
Vale também para boa parte da Europa, completa Emmanouela, para nada
simpatizante do neofascismo: "Uma coisa é clara: a situação, com diversos
extremistas, racistas, neonazis ou simplesmente profundos conservadores na
Hungria, Suécia, Finlândia, Grécia, França etc., deveria fazer Bruxelas [a
capital da Europa unificada] pensar".
É bom mesmo, antes que o ovo da serpente rompa a casca, até porque o
"etc." da frase acima deveria abarcar também Holanda, Dinamarca e
Itália, pelo menos.
FONTE: FOLHA DE S. PAULO
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