As frustrantes taxas do PIB – de 2,7%, em 2011, e em torno de 1,5% este ano, como projeta a maioria dos analistas – e o reconhecimento, enfim, dos pífios resultados de sucessivos pacotes para reaquecimento da economia por meio de mais medidas de estímulos ao consenso e de benefícios a segmentos empresariais, de caráter pontual e seletivas, impuseram à presidente Dilma Rousseff a guinada que ela está dando em seu governo. Ao partir para o enfrentamento dos gargalos da infraestrutura com a troca da estigmatização das “privatizações tucanas e neoliberais” pela retomada, em grande escala, de concessões à iniciativa privada, nacional e estrangeira. Como se recorda, tais concessões foram agressivamente demonizadas nos dois mandatos de Lula (após a metade do primeiro com a substituição de Antonio Palocci por Dilma no comando político-administrativo do governo), constituindo também uma das tônicas da campanha presidencial dela em 2010. E no campo da política social, para apontar de início só mais uma das dimensões dessa guinada da presidente, ela se contrapõe firmemente ao movimento sindical, em especial à CUT, na recusa de mais aumento real dos vencimentos de várias categorias do funcionalismo, em nome da contenção dos gastos públicos e, mais do que isso, apoiando-se na Advocacia Geral da União para determinar o desconto dos dias parados dos grevistas, assim pondo em pauta a necessidade de regulamentação das greves dos serviços públicos, que o PT tem impedido.
Nesse campo, os dirigentes da CUT se sentem surpreendidos e traídos pela presidente, que, como candidata, não apenas lhes prometera o atendimento de todas as demandas salariais mas, além disso, e com a garantia de suas ações na Casa Civil, inspirava-lhes segurança de continuidade das políticas populistas de Lula. Ademais de assegurar-lhes a expectativa de aprofundamento das opções estatizantes do antecessor. A sequência do movimento grevista de muitas categorias do funcionalismo federal, com reiteradas rejeições de propostas oficiais, vai tendo consequências crescentes sobre serviços importantes para a população e para diversas atividades produtivas, agravando as deficiências de gestão do governo. E devendo reforçar as tendências de setores do PT que passam a defender uma volta de Lula em 2014.
A rigor, a guinada da presidente (ou o “choque de capitalismo de Dilma”, do título da reportagem de capa da Veja desta semana), antes de contrariar a CUT conflita com a trajetória da própria Dilma ao longo dos mandatos de Lula; na sua campanha presidencial; nos discursos, avaliações e propostas do seu governo até há pouco. Até que, como assinala a reportagem, “finalmente caiu a ficha” ..., “com a constatação lógica que só o governo não enxergava: esgotou-se o modelo de concessão de crédito subsidiado pelos impostos dos brasileiros que trabalham e secundado por intervenções estatais para segurar o preço dos combustíveis e
controlar artificialmente a inflação”. Com o fim da bonança propiciada sobretudo pelas volumosas e bem pagas exportações de commodities, combinado com a persistência da crise do Euro, inviabilizou-se a manutenção das receitas populistas do lulopetismo. Que só poderiam ser continuadas com progressivo desmonte da estabilidade macroeconômica herdada dos governos FHC. Cabendo lembrar que a preparação do Brasil para enfrentar bem o fim dessa bonança era o objetivo de proposta de Palocci e de Delfim Netto, em 2005, para que os gastos federais de custeio crescessem sempre abaixo da taxa do PIB, ao invés de bem acima como ocorreu desde então. Proposta qualificada como “rudimentar” pela nova chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff, e em seguida descartada. O papel dela a partir de então é resumido assim em artigo de Celso Ming, no Estadão de anteontem: “A aceleração das despesas com a folha de pagamentos no governo Lula aconteceu, em grande parcela, quando a ministra-chefe da Casa Civil era Dilma Rousseff”.
Mas, malgrado tal trajetória da presidente Dilma, a guinada realista que tenta agora é objeto de aplausos e de aposta da Veja de que dará certo. Aposta que é igualmente de todos que desejam o desenvolvimento econômico e social do país e de nosso pluralismo democrático.
Jarbas de Holanda é jornalista
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