• Enfraquecimento de Dilma pode estar superestimado
- Valor Econômico
"Estou muito otimista com outubro. Não sei se é realismo ou é um desejo louco dentro do meu peito", comenta um empresário do setor elétrico ao ser indagado sobre as suas expectativas em relação à eleição presidencial. Quem se sente atingido pelo governo da presidente Dilma Rousseff começa a ler as pesquisas de opinião de uma forma em que prognóstico se mistura com torcida.
Nesta maneira de ver o mundo, confunde-se o que é possível com o que é provável, tendência torna-se destino e já há quem ouse mencionar um cenário em que Dilma não estaria no segundo turno. De concreto, fica evidente apenas o rechaço do atual governo dentro do setor empresarial, dentro e fora do Brasil. Este turbilhão de emoções tem ajudado a compreender o comportamento autista do mercado a cada pesquisa que mostra o declínio da aprovação popular da administração da presidente Dilma Rousseff e algum movimento na curva de intenção de voto dos adversários Aécio Neves (PSDB) e Eduardo Campos (PSB).
Na última semana, em relatórios especializados, consultores internacionais começaram a alertar em relação à possibilidade de estar acontecendo um "overshooting" na interpretação das pesquisas, em que se estaria superestimando o enfraquecimento de Dilma. Coincidência ou não, foi sóbria a reação do mercado à última sondagem Datafolha que sinalizou segundo turno entre Dilma e Aécio, no dia 9: o Ibovespa fechou em baixa de 0,6%.
No transcorrer de uma campanha, governantes que buscam um novo mandato e são afrontados pelo desejo de mudança não estão desarmados. Sempre podem dizer aos votantes que os adversários colocam em risco o que se tem, como o PT de Dilma fez em seu comercial de TV na terça-feira. Nos Estados Unidos, em 1964, um comercial da campanha pela reeleição de Lyndon Johnson insinuou que um presidente republicano poderia fomentar o apocalipse nuclear. A tradição histórica também reforça a cautela com que se deve avaliar a perspectiva de mudança quando existe a reeleição no horizonte.
Na América Latina, apenas dois presidentes perderam uma recondução nos últimos 25 anos: Daniel Ortega na Nicarágua em 1990 e Hipólito Mejía na República Dominicana em 2004. Nos Estados Unidos, em cem anos, houve cinco derrotas de um candidato a um segundo mandato. No mesmo período, 13 reeleições.
No Brasil a pesquisa Datafolha mostra o tamanho do desafio a ser vencido por Aécio e Campos. Os dois reúnem 31% das intenções de voto, mas apenas 15% dos pesquisados afirmam acreditar na vitória de um ou outro. A crença na reeleição é compartilhada por 37%, mesmo percentual dos que escolhem Dilma como candidata. A convicção na vitória de Dilma só é perturbada pela sombra avassaladora do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva: 23% dos pesquisados acham que o ex-presidente irá substituir Dilma na chapa e vencer as eleições.
Resta saber a que tipo de perigo o país estará exposto caso os agentes financeiros internacionais passem a apostar de forma consistente em um novo mandato petista. À medida que esta convicção crescer, a pressão que vem de fora tende a subir.
Para especialistas em risco soberano, como o economista uruguaio Arturo Porzecanski, "o mercado está sinalizando que não dará um voto de confiança a ela". Radicado nos Estados Unidos, Porzecanski hoje é professor da American University, mas por 28 anos foi o responsável em diversas instituições financeiras por investimentos em mercados emergentes.
"Quando a bolsa sobe porque a presidente cai, está sendo emitido um sinal de que a troca de governo irá interromper um processo", comentou Porzecanski em entrevista por telefone. O pensamento do economista, como o de muitos formadores de opinião em relação ao Brasil no exterior, não tem muitos matizes: o país está na mesma vereda intervencionista de Venezuela, Bolívia, Equador e Argentina.
"Isto começou com as políticas de distribuição de renda, ainda com Lula, e resultou no aumento do protecionismo à indústria, do protagonismo dos bancos federais, no controle de preços de energia e na concessão de subsídios, já com Dilma", disse o uruguaio.
A avaliação mais favorável do Brasil em relação ao universo bolivariano, segundo Porzecanski, deve-se às reservas monetárias altas e a uma inflação ainda "relativamente baixa, quando comparada a de outros intervencionistas". São dois fatores que teriam sobrevivência duvidosa a longo prazo, mantido o rumo das coisas, na visão do professor.
"A pergunta que se faz, caso se raciocine com a eleição dela, é se Dilma antecipará o ajuste em relação aos demais países do grupo ao qual o Brasil se juntou. Na Argentina e na Venezuela, os governos aguardaram as situações extremas para começarem a atuar. Essa sinalização precisaria ser dada ainda este ano", disse. Em outras palavras, o que se cobra é outra "Carta ao Povo Brasileiro", o compromisso de enquadramento assumido por Lula em junho de 2002, época em que o mercado começou a perceber que o petista iria mesmo substituir Fernando Henrique Cardoso.
Porzecanski não antecipa respostas, mas a história é repleta de líderes que trocaram até de religião para assumirem o poder, desde Henrique IV na França, protestante que em 1593 se converteu ao catolicismo e teria dito que "Paris vale uma missa". O problema é que Dilma, ao contrário dos precedentes históricos, inclusive o de Lula, já está no comando. Na perspectiva privilegiada de Lula em 2002, era possível administrar expectativas tanto fora quanto dentro do país e acenar com políticas que não representavam perdas para nenhum segmento. Para quem está no poder, guinadas radicais podem ter gosto de rendição. Seria uma renúncia ao controle da agenda do governo, com efeito direto no curso da campanha.
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