terça-feira, 18 de novembro de 2014

Luiz Carlos Azedo - Risco de metástase

• Para melar a apuração do escândalo, difunde-se que muita gente recebeu doações de campanha das empresas denunciadas por formação de cartel, que gastaram R$ 180 milhões com financiamento eleitoral

Correio Braziliense

Por mais que se tente minimizar a repercussão da Operação Lava-Jato na Petrobras e no Palácio do Planalto, como fez ontem o vice-presidente da República, Michel Temer, ao dizer que o governo esta “tranquilíssimo”, o que se teme mesmo nos bastidores dos partidos envolvidos no escândalo — PT, PMDB e PP, principalmente — é o risco de uma metástase. Ou seja, que novas delações premiadas e documentos apreendidos estendam as investigações a outras empresas estatais, como Eletrobras e Correios, e aos fundos de pensão.

A Polícia Federal investiga se o esquema operado pelo doleiro Alberto Youssef alcança também negócios no setor elétrico. Na mesa de João Procópio de Almeida Prado, acusado de ser o braço-direito do doleiro Alberto Youssef, foi apreendida uma planilha identificada como “Demonstrativo de Resultado — Obra Jirau”. Refere-se à contabilidade da Camargo Corrêa na obra da hidrelétrica construída no Rio Madeira, em Rondônia, com financiamento de R$ 7,2 bilhões do BNDES.

A empreiteira foi uma das sócias do consórcio que arrematou a concessão até 2012, quando vendeu sua participação. Segundo o Ministério Público Federal, Prado era o elo do esquema de Youssef com a Camargo Corrêa. Ele é concunhado de João Ricardo Auler, presidente do conselho de administração da Construções e Comércio Camargo Corrêa, um dos presos na Lava-Jato. A planilha pode ser o indicativo de um modus operandi.

“Você sabe que a competência da Polícia Federal é de um lado, a do Ministério Público de outro lado, a do Congresso Nacional de outro lado, fazendo CPI. De modo que o governo está tranquilíssimo”, contemporiza o vice presidente Michel Temer, que nega qualquer relação do PMDB com o lobista Fernando Soares, o “Fernando Baiano”, que teve a prisão decretada e se encontra foragido. Soares é apontado como o “operador” do partido no recolhimento de propina oriunda de desvios de recursos da Petrobras.

Temer garante que “todas as palavras da presidenta da República, e de todos os órgãos do governo, são no sentido de incentivar as apurações”. Não é bem isso que acontece. A CPMI da Petrobras está paralisada. Na semana passada, não conseguiu convocar o ex-diretor da empresa Renato Duque, que foi preso na sexta-feira, porque o PMDB, o PT e o PP não deixaram. Às vésperas das prisões, o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, abriu inquérito administrativo para investigar supostas ligações entre os delegados que estão à frente das investigações e o adversário de Dilma Rousseff no segundo turno, o tucano Aécio Neves.

Mais delações
Os advogados das empreiteiras já anunciam que têm argumentos robustos para anular o inquérito no Supremo Tribunal Federal (STF), embora tenham perdido todos os pedidos de habeas corpus no Tribunal Regional Federal do Rio Grande (TRF-RS) e no Superior Tribunal de Justiça (STJ). O lobista Fernando Baiano foi orientado a não se entregar à Justiça, embora seu advogado diga que ele havia se oferecido para colaborar com as investigações por meio da delação premiada.

O bordão dos governistas é criticar a partidarização da Operação Lava-Jato. Nas redes sociais, os militantes petistas desancam a oposição, acusando-a de golpismo, por querer aprofundar as investigações visando um impeachment da presidente Dilma, o que não é o caso. Ao tratar do assunto, a presidente da República faz o discurso de que “nunca antes nesse país” o governo investigou tanto, mas não toma nenhuma medida para mudar a diretoria da Petrobras, cuja presidente, Maria das Graças Foster, tentou abafar o escândalo para proteger o antecessor, José Sérgio Gabrielli. Ontem, a cúpula da empresa resolveu criar uma diretoria anticorrupção e denunciar o ex-presidente da empresa e mais 14 pessoas. Por que não fez isso antes?

Para melar a apuração do escândalo, difunde-se que muita gente recebeu doações de campanha das empresas denunciadas por formação de cartel, que gastaram R$ 180 milhões com financiamento eleitoral nas campanhas de oito governadores e 12 senadores eleitos. PMDB, PT, PP, PDT, PCdoB, DEM e PSB teriam recebido doações no montante de R$ 35 milhões. Fala-se também em mais de 200 parlamentares eleitos. Enquanto o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, não oferecer a denúncia dos políticos envolvidos, as especulações prosperarão.

Alguns dos empresários mais poderosos do país e executivos de empreiteiras responsáveis por obras bilionárias passaram o fim de semana na carceragem da Superintendência da Polícia Federal (PF) em Curitiba. Do grupo de 23 presos, 17 deverão ser liberados ainda hoje, quando termina o prazo de cinco dias de prisão temporária, a não ser que a PF peça a prorrogação para alguns.

O primeiro acordo de delação premiada com empresas envolvidas no esquema foi fechado pelo Ministério Público Federal (MPF) com a Setal. O grupo tem contrato de mais de R$ 4 bilhões com a Petrobras. Os executivos Augusto de Mendonça Neto e Julio Camargo afirmaram ter entregue R$ 30 milhões para a Diretoria de Serviços da Petrobras, comandada por Renato Duque, indicado pelo PT e suspeito de receber propina. Duque, que esteve no cargo entre 2003 e 2012, também está preso. O risco de metástase existe por causa das novas delações premiadas.

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